Dois prisioneiros de guerra norte-coreanos capturados por forças ucranianas detalharam as difíceis condições enfrentadas pelas tropas enviadas à Rússia. Um relato exclusivo da imprensa sul-coreana oferece um vislumbre das adversidades enfrentadas pelos combatentes em Kursk, desde o frio extremo até a falta de comunicação e apoio adequado no campo de batalha. As informações são do Chosun Ilbo, um dos principais jornais de Seul.
Ri (26 anos) e Baek (21), ambos atiradores de elite, descreveram um cenário de isolamento e vigilância intensa por parte de agentes de segurança norte-coreanos. As tropas eram mantidas sob controle rígido e expostas a uma propaganda constante, incluindo rumores de que forças sul-coreanas estavam operando drones contra eles. “Nos disseram que todos os operadores de drones militares ucranianos eram, na verdade, soldados sul-coreanos”, relatou Ri.
As dificuldades começaram antes mesmo de chegarem à linha de frente. Em seu treinamento inicial em Vladivostok, os soldados enfrentaram um ambiente hostil, semelhante ao rigoroso inverno da cidade norte-coreana de Samjiyon, onde Ri e sua unidade já haviam sido designados para trabalhos forçados em 2019. “As condições eram brutais — frio congelante, neve na altura da cintura e nenhum abrigo adequado. Tínhamos que construir nossos próprios quartéis enquanto lascávamos o solo congelado com picaretas”, descreveu Ri. “Estava tão frio que a urina congelava no momento em que atingia o solo.”
Ao chegarem em Kursk, os norte-coreanos se depararam com um novo desafio: a adaptação ao combate moderno. Com pouca experiência em guerra de drones, tornaram-se alvos fáceis para os operadores ucranianos, que utilizavam ataques aéreos precisos.
Segundo Ri, as primeiras unidades enviadas sofreram perdas significativas. “A primeira onda de tropas foi dizimada por drones e fogo de artilharia. Confiávamos no apoio da artilharia russa, mas eles atiravam atrás das linhas inimigas em vez de nos cobrir adequadamente. Isso levou a baixas desnecessárias.”
Além do perigo constante, os suprimentos eram escassos. O controle rigoroso da distribuição de munição, roupas e alimentos dificultava ainda mais a vida dos soldados. “Tudo era gerenciado pelos superiores, e a comunicação com as tropas russas era quase inexistente”, explicou Ri. Quando necessário, a interação entre os soldados das duas nações era feita através de aplicativos de tradução, uma novidade para os norte-coreanos. “Foi a primeira vez que usei tal tecnologia. Nunca interagi com estrangeiros antes.”
A alimentação também era um desafio, especialmente para Ri, que sofreu ferimentos na mandíbula e no braço em combate. Após ser atingido por um ataque de drone, foi deixado inconsciente e capturado por forças ucranianas. “Meu ferimento na mandíbula não sarou completamente, então não posso comer alimentos duros. Eu como principalmente mingau”, contou.
Desejo de deserção
Ri compartilhou suas reflexões sobre o futuro enquanto se recupera dos ferimentos. Ele expressou seu desejo de buscar asilo na Coreia do Sul, após ter sido forçado a entrar no exército devido a dificuldades econômicas, que frustraram seus sonhos de cursar uma universidade e seguir os passos de seus parentes cientistas.
“Tomei uma decisão de 80%”, disse Ri. “Quero pedir asilo… e ir para a Coreia do Sul. Eles me aceitarão?” Sua expectativa por um novo começo, no entanto, é sombria, pois ele também está preocupado com as consequências que sua decisão pode ter para sua família em Pyongyang. “Se o governo descobrir que fui feito prisioneiro, meus pais não poderão ficar em Pyongyang”, revelou.
Com a Coreia do Sul anunciando na quarta-feira que aceitaria Ri, o jovem se vê em um dilema. Sob a constituição sul-coreana, os soldados norte-coreanos são reconhecidos como cidadãos, mas ele continua angustiado pela saudade de seus pais. “Sinto uma falta insuportável dos meus pais… Quero corresponder às expectativas deles e fazer algo de mim… Ainda sou jovem”, desabafou.