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Violência
13/02/2025 18:00:00

Clima de impunidade persiste 20 anos após morte de Dorothy Stang

Clima de impunidade persiste 20 anos após morte de Dorothy Stang

Há duas décadas, a missionária Dorothy Stang, de 73 anos, foi assassinada com seis tiros em Anapu, no Pará, enquanto defendia a floresta e os direitos de trabalhadores rurais contra grileiros e fazendeiros. O crime, ocorrido em 2005, simboliza a violência e a impunidade que ainda assombram a região. Testemunhas relatam que, diante de seus algozes, ela ergueu uma Bíblia e recitou um versículo sobre justiça antes de ser executada.

Vinte anos depois, nenhum dos mandantes do crime cumpre pena integralmente, e dezenas de assassinatos relacionados a conflitos fundiários permanecem sem solução. Junto à cruz onde Dorothy foi enterrada, há nomes de outras 19 vítimas da violência agrária na região — nenhum caso resultou em punição. "A situação continua a mesma, se não pior", afirma a irmã Jane Dwyer, que segue seu legado na luta por justiça social e ambiental.

**Trajetória de resistência**
Norte-americana natural de Ohio, Dorothy ingressou na vida religiosa aos 16 anos e chegou ao Brasil em 1966. Atuou no Maranhão e, posteriormente, no Pará, onde enfrentou a expansão predatória de madeireiros e grileiros durante a ditadura militar. Integrante da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ela denunciou desmatamento, exploração de trabalhadores e a grilagem de terras, tornando-se alvo de ameaças.

Seu assassinato ocorreu em 2005, durante o primeiro governo Lula, período marcado por avanços democráticos, mas também pela persistência da violência no campo. Os pistoleiros Rayfran das Neves Sales e Clodoaldo Batista, além dos fazendeiros Vitalmiro Bastos de Moura (Bida) e Regivaldo Pereira Galvão (Taradão), foram condenados, mas hoje estão em liberdade ou com penas atenuadas. Amair Feijoli da Cunha (Tato), intermediário do crime, foi preso novamente em 2023 por ocupação ilegal de terras.

**Anapu: terra sem lei**
A região de Anapu, cortada pela Transamazônica, é palco histórico de conflitos. Projetos de colonização da ditadura beneficiaram fazendeiros e madeireiros, perpetuando grilagem e violência. Com apenas 28 mil habitantes em uma área quase sete vezes maior que São Paulo, a localidade é chamada de "faroeste brasileiro" devido à impunidade e às disputas por terras.

Atualmente, três assentamentos — Pilão Poente, Virola-Jatobá e Esperança (onde Dorothy foi morta) — são epicentros de tensões. Ativistas denunciam um "consórcio da morte", supostamente formado por políticos e empresários do agronegócio, acusados de comandar execuções e ocultar corpos em um "cemitério clandestino".

**Ciclo de violência e omissão**
O Brasil lidera o ranking global de assassinatos de ambientalistas, com 342 mortes entre 2012 e 2021. Em 2023, conflitos fundiários atingiram o maior número desde 1985, com indígenas representando a maioria das vítimas. Para o MST, a reforma agrária avança em ritmo "ridículo", com apenas 1,5 mil famílias assentadas anualmente.

Jane Dwyer critica a falta de vontade política: "Quem manda no Brasil é o Congresso, e o Congresso é o agronegócio". Enquanto isso, comunidades seguem ameaçadas, e a justiça tarda — como no caso de Paulo Paulino Guajajara, indígena morto em 2019 no Maranhão, cujos assassinos jamais foram condenados.

Duas décadas após a morte de Dorothy, seu sonho de justiça e igualdade permanece distante. Seu legado, porém, ecoa como um alerta: a proteção da Amazônia e de seus defensores ainda é uma batalha aberta.

 



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