A penicilina benzatina,
muito conhecida pelo nome comercial Benzetacil, um antibiótico usado para
tratar sífilis e outras infecções, está em falta no Brasil tanto no setor
público quanto no privado. A crise de abastecimento, que segundo o Ministério
da Saúde é provocada por escassez de matéria-prima, tem preocupado os médicos.
A Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) já
manifestou sua preocupação em ofício enviado para o Ministério da Saúde
recentemente. “O fornecimento da penicilina benzatina está intermitente e isso
é um problema muito sério”, diz o médico Luís Fernando Aranha Camargo, da SBI.
Ele diz que a falha no fornecimento atinge os
setores público e privado. “Sendo a penicilina um tratamento extremamente
simples contra a sífilis – de uma a quatro injeções já resolvem – a falta é um
grande problema.”
Segundo o médico sanitarista Artur Kalichman, do
Programa Estadual DST/Aids do Estado de São Paulo, a dificuldade de
disponibilidade da penicilina não é aguda no momento, mas pode piorar. “Existe
pouca oferta de penicilina e isso tem que aumentar. Ela é importante no
tratamento da sífilis. Tem drogas que podem ser usadas em substituição, mas a
primeira opção é a penicilina”, afirma Kalichman.
Caso não seja tratada, a sífilis pode comprometer o
sistema nervoso central e o sistema cardiovascular. A sífilis congênita,
transmitida da mãe para o bebê, pode causar mal-formação do feto.
Falta de matéria-prima
Em nota, o Ministério da Saúde afirma que vem monitorando e acompanhando a
produção nacional do medicamento ao lado dos laboratórios produtores, que
alegam dificuldades na produção devido à “escassez mundial no suprimento de
matéria-prima”.
Atualmente, segundo a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa), existem no Brasil quatro empresas com registro
válido para produzir a penicilina benzatina, também conhecida como
benzilpenicilina benzatina ou penicilina G benzatina. A Eurofarma, que produz o
remédio com nome comercial Benzetacil, a Fundação para o Remédio Popular
(Furp), o Laboratório Teuto Brasileiro S/A e a Novafarma Indústria Farmacêutica
LTDA.
Segundo a Eurofarma, detentora da principal marca
do produto no Brasil, há cerca de dois anos, a empresa “se deparou com a
escassez de matéria-prima para a produção da penicilina benzatina no mercado
mundial”.
O laboratório esclarece que, no Brasil, existe uma
dependência de fornecedores de insumo internacionais, já que o país não é um
polo de química fina. O antigo fornecedor da matéria-prima para a Eurofarma
fechou sua fábrica e o laboratório buscou um novo fornecedor, já homologado
pela Anvisa. A empresa não informou o nome do fornecedor de matéria-prima.
Segundo a Anvisa, essa informação “é confidencial da empresa detentora do
registro do medicamento”.
“Com importação a partir de plantas na Áustria e
China, o fornecimento de matéria-prima para a produção de Benzetacil passa
neste momento por um processo de regularização de fornecimento, ainda com
impacto no abastecimento”, afirmou a Eurofarma, em nota. A empresa ressaltou
que a substituição de fornecedores no setor farmacêutico não é um processo
simples, já que deve seguir critérios sanitários rigorosos.
Já o laboratório Teuto, que produz a penicilina
benzatina de nome comercial Bepeben, afirmou, em nota, que a produção e
distribuição da droga para o segmento hospitalar está "dentro da
normalidade".
Segundo o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos
no Estado de São Paulo (Sindusfarma), que representa boa parte das indústrias
farmacêuticas do Brasil, o desabastecimento de penicilina é um problema mundial
e a interrupção do fornecimento dos insumos para a produção foi repentina, o
que originou o problema.
Ministério espera normalização este mês
O Ministério da Saúde afirmou, em nota, que espera que a situação se normalize
ainda este mês. “Foram realizadas reuniões, entre janeiro e abril deste ano,
com o Ministério da Saúde, para buscar uma solução ao problema. As empresas se
comprometeram a adotar todas as providências para normalizar o fornecimento do
medicamento ainda neste mês de junho”, afirmou a pasta, em nota.
Problema de longa data
Além de ser a primeira linha de tratamento contra sífilis, o remédio, é ainda
usado para tratar outras infecções, como a febre reumática aguda, doença
bacteriana que afeta coração, cérebro e articulações.
Em um documento da Organização Mundial da Saúde
(OMS) de 2005 sobre o controle de infecções como a febre reumática aguda, o
problema do abastecimento de penicilina benzatina já foi citado.
"Nos últimos tempos, tem havido problemas
tanto em relação à disponibilidade quanto em relação à qualidade da penicilina
benzatina ao redor do mundo. Em muitos países, essa medicação é escassa, e
frequentemente está indisponível por períodos prolongados. Ainda mais
preocupante, a qualidade da medicação é altamente variável."
Uma carta publicada em 2013 pela Federação Mundial
do Coração na revista "Nature Reviews Cardiology" também chama a
atenção para o problema.
“A penicilina benzatina está na lista de
medicamentos essenciais da Organização Mundial da Saúde, mas o fornecimento
global dessa droga tem sido inconsistente. O processo de fabricação da forma em
pó da penicilina benzatina, dose efetiva, e o parâmetro de qualidade são, em
grande parte, mal documentados, e a droga é produzida por um número
desconhecido de fabricantes genéricos."