Em coletiva à imprensa na tarde
desta terça-feira, 26, na sede do Grupo Espírita Santa Bárbara (Guesb), no
Conjunto Village Campestre, os advogados Newton Pereira Gonçalves Neto e
Valquíria Carvalho, que assumiram o caso de intolerância religiosa à Yalorixá
Mãe Neide Oyá D´Oxum, falaram a respeito do caso e do processo que estão
movendo contra a assessora de imprensa Juliana Despírito, que deverá ser
intimada para depor no Rio de Janeiro, Estado onde mora, por meio de carta
precatória.
O processo contra a assessora,
que é evangélica, foi por conta de um comentário de intolerância religiosa e
incitamento ao ódio escrito por ela, em uma foto postada pelo ator Henri
Castelli, filho espiritual da mãe de santo, no sítio da Mãe Neide em União dos
Palmares, onde a filha do ator com a assessora aparece no colo da Yalorixá
vestida de baiana.
A postagem gerou 47 páginas de
postagens e comentários maldosos, tendo repercutido negativamente até em site
de Portugal, segundo a advogada da Mãe Neide. Ela observou que já foi feito um
Boletim de Ocorrência e que o Ministério Público já está sendo acionado contra
Juliana Despírito.
“A Mãe Neide foi submetida ao
crivo popular sem consulta; tenho aqui a cópia de um site que foi dos piores,
tem aqui a foto dizendo que ‘satanás e seus cavalos’ e eu queria que o dono do
site dissesse para mim a quem ele se refere. Isso é uma execração pública de
uma pessoa que só faz o bem no Estado de Alagoas, altamente respeitada, que
recebeu uma homenagem na Assembleia Legislativa nesta terça-feira e receberá
outra na Câmara de Vereadores na sexta; estamos tomando as providências, mas é
imprudente adiantar algum detalhe do processo agora”, destaca.
Segundo a advogada, a
intolerância religiosa já é um tipo de injúria “e estamos estudando outros
tipos de tipificações. Não é uma causa qualquer, é a Mãe Neide. O foco
principal é preservá-la, porque chocou demais. Segundo Valquíria Carvalho, essa
é uma das piores fases da vida de Mãe Neide”, destaca.
“A repercussão foi amplamente
negativa; fiz uma pesquisa e passei alguns dias pesquisando várias menções
desonrosas, depreciações, pessoas que fizeram um roteiro de disseminação do
ódio através da internet. Quando nós lemos ficamos chocados e achamos por bem
não mostrar tudo a ela, porque aqui é uma pequena parte do que a gente pegou”,
disse a advogada, mostrando o calhamaço de papel impresso.
A advogada confirma ainda que os
comentários nas postagens nas redes sociais, blogs e sites são belicosos, um
perfil de guerra. “A intolerância religiosa é uma doença medieval, eu pensava
que já tinha sido erradicada há muito tempo. Temos um problema sério que é a
intolerância humana, que é o outro não aceitar o que você é”, reforça.
Valquíria Carvalho destaca que a
Mãe Neide professa a religião dela, “não é uma seita, é uma das religiões mais
antigas, como é que tem alguém que não respeita isso, são compartilhamentos de
ideologias fracassadas como a disseminação de ódio. Isso não pode ser
permitido, estamos num país laico, cada um professa sua fé e tem direito a
exercer e expressar a religião que quiser”.
Segundo a advogada, o Ministério
Público, o Poder Judiciário é quem vai fazer com que o caso seja resolvido.
“Essa questão será resolvida, a gente vai fazer o que for possível por ela,
para que não se abale mais, pois o trabalho dela tem repercussão positiva.
Ninguém aqui faz sacrifício de gente, ninguém cultua demônio, como está em
algumas postagens, eu sou muito temente a Deus par ame aproximar de uma pessoa
que cultue o demônio, observou a advogada.
O advogado Newton Pereira
ressaltou os trabalhos sociais da Mãe Neide e disse que o caso está se tornando
muito grave e que tudo tem sido muito penoso para a líder religiosa “A
liberdade de expressão vai até onde não se vai ferir outra pessoa. O MP vai se
pronunciar contra essa afronta à religião, envolvimento da criança, vai ter
desdobramentos”, explica.
“Eu pensei várias vezes em
não tocar o caso pra frente, porque achei que eles iam se resolver a briga
deles por lá. Não achei que uma simples homenagem no Dia das Mães fosse causar
tanto barulho. Achei que tudo ia se acalmar, até porque somos uma família, o
povo do terreiro é uma família; achava que isso ia passar”, Mãe Neide.
Segundo ela, o comentário da
assessora foi ouriçando as pessoas: “E quando eu me vi estava num redemoinho de
47 páginas na internet, de comentários e postagens maldosos, capa de revista,
capa de jornal no Rio de Janeiro, site me Portugal e eu comecei a ficar com
medo”, ressalta.
A Yalorixá explica que no dia da
postagem, os filhos disseram que o ator Henri Castelli tinha feito uma
homenagem para ela no Dia das Mães: “E eu achei lindo; à noite eu só vi eles
cochichando, tomavam meu telefone, não queriam que eu visse as coisas que
tinham sido colocadas, mas sou muito curiosa, cutuquei e vi os comentários”,
destaca.
A líder espiritual denuncia que
as postagens na internet lhe chamavam de “cavalo do satanás e coisas horríveis,
eu me senti na obrigação de fazer alguma coisa: eu fiz parte da Constituição da
Igualdade Racial, sou militante nesse Estado há mais de 25 anos, é uma vida de
dedicação à inclusão social, à igualdade de direitos e de repente, por conta de
um comentário maldoso, preconceituoso, eu estava em todos os jornais”, destaca.
Mãe Neide pontua ainda que vive
num Estado em que o governo vai à praça e pede perdão “por conta de uma
intolerância religiosa, como foi o Quebra de 1912, e eu sofrendo esse tipo de
ameaça. Não tenho nada contra a moça, mas quero que seja explicado o motivo do
comentário. A foto foi tirada em minha casa, em União dos Palmares, eu tenho um
bufê afro, que mantém a escola com o trabalho que a gente faz, não preciso de
mídia para me mostrar”, ressalta.
A líder espiritual diz ainda que
já se sente contemplada com o reconhecimento do seu povo: “Meu povo negro
já me homenageou e reconhece meu trabalho; eu sou feliz por tudo o que já me
deu; eu não sou artista, não preciso estar em mídia mostrando minha cara, basta
meu trabalho”, destacou.
Mãe Neide diz ainda que se sentiu
humilhada e violada em seus direitos, porque sempre respeitou a religião de
cada um: “Sempre procurei pregar o bem e ajudar as pessoas, tanto que a minha
escola do Projeto Inaê, que faz um trabalho de inclusão social, está sendo
coordenado agora pela minha filha e respeitamos a fé de cada um, a religião de
cada um”, pontua.
Ela explicou ainda que tem
proximidade com a família do ator e que acompanhou o processo do nascimento
dela, que considera sua neta. “Falo com Henri todos os dias: quando vai dormir,
quando acorda, não só ele, como muitos filhos pelo Brasil a fora. E emocionado
e chorando ele me pediu desculpas e disse: ‘mãe, eu só queria homenagear a
senhora, mas a senhora tem o direito de tomar qualquer atitude que queira
tomar, eu estou do seu lado, a senhora está no seu direito”.
“A ligação que temos com
cada um é muito forte, é muito presente. Quando as pessoas passam para a
religião de matriz africana, nós acolhemos os filhos como filhos de verdade.
Não tenho nada contra essa moça, mas tenho preocupação para que outras pessoas
não sofram o que estou sofrendo agora, você vai dormir numa vida calma, de mãe
e dona de casa, militante, chefe de terreiro, que é uma responsabilidade muito
grande e eu não preciso falar da minha vida”, reforça.
Segundo Mãe Neide, o povo negro e
o Estado já fala sobre ela. “Essa moça não ofendeu a mulher Yalorixá, foi
o Estado, a minha religião, a minha fé. O comentário preconceituoso dela, fez
com que canais evangélicos fizessem pré-julgamentos, mas não vou baixar a
cabeça porque estão julgando a minha fé. Não posso me calar. Não é fácil a
minha situação. Imaginem como eu me senti, receber uma homenagem no dia das
mães, no Dia 13 de maio, dia nacional contra a intolerância religiosa, foram
dez dias com matérias e matérias com palavras horríveis me julgando.