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flávia vilela
A
transexual Lara Lincon relatou ter sofrido preconceito na delegacia, quando foi
fazer uma denúncia de transfobia. "Cheguei lá e, ao ver minha identidade,
o inspetor me chamou de camarada”. Ela contou que o policial civil ameaçou
prendê-la por desacato à autoridade por ela insistir que ele a chamasse pelo
nome social. "Ele ficou o tempo todo debochando do meu caso, insinuando
que a culpa era minha, disse que não entendia o que estava fazendo ali, que não
havia nada na lei que pudesse me proteger".
O delegado
titular da Divisão de Homicídios da Baixada Fluminense, Fábio Cardoso, região
com maior número de casos de assassinatos e agressões contra homossexuais,
admitiu o preconceito dentro das delegacias. “Chegando na polícia, há 14 anos,
verifiquei que as pessoas não entendem que vocês estão simplesmente querendo
ser respeitados. Sei que é uma missão árdua mudar a cabeça de um monte de
gente, mas a gente tenta”, argumentou ele, que defendeu a parceria de
movimentos sociais e órgãos específicos com a Polícia Civil nas investigações de
crimes.
Os dois
depoimentos foram feitos durante audiência pública hoje (15) na Assembleia
Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) para discutir a falta de
produção de dados de crimes de transfobia no estado do Rio, o despreparo e
preconceito de servidores públicos e a indiferença do Poder Público e da
sociedade para com travestis, transexuais e transgêneros.
A audiência foi
promovida pelos presidentes das comissões pelo Cumprimento das Leis, deputado
Carlos Minc (PT); de Direitos Humanos, deputado Marcelo Freixo (PSOL), e de
Segurança Pública, deputada Martha Rocha (PSD).
Deputados e
sociedade civil discutiram a regulamentação do atendimento de transexuais
mulheres e travestis nas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher
(Deams) como forma de solucionar emergencialmente o problema. Nascimento
adiantou que há três meses o governo estuda a viabilização desse tipo de
atendimento.
A defensora
pública do Núcleo de Defesa dos Direitos Homoafetivos e Diversidade Sexual,
Lívia Casseres, várias facetas de discriminação contra essa população ainda são
ignoradas. “A homofobia abarca uma série de discriminações distintas que exige
enfrentamento específico de natureza de crime. As agressões criminosas são
apenas uma face do problema. Existem problemas no sistema de saúde, de
educação, de Justiça”, disse. Ela defendeu a criação de uma rede de proteção
para esse grupo.
Lívia também
citou casos de problemas de empregabilidade devido ao preconceito. “Recebi
mulheres e homens trans que me relataram que passaram em processos seletivos,
tinham mérito, técnica reconhecida, mas na hora de apresentar os documentos,
não são contratados”, disse.
A transexual
Bruna Marx Benevides afirmou que mais de 90% das travestis vivem hoje da
prostituição por falta de oportunidades de trabalho. “A única coisa que nos
resta é o corpo e nós usamos esse corpo para termos o que comer. Não é uma
opção, é sobrevivência”.
Os três
deputados que promoveram a audiência vão apresentar um projeto de lei na semana
que vem que inclui os itens orientação sexual, identidade de gênero e nome
social nos boletins de ocorrência. “Isso representa um grande avanços de
qualificar os dados dos institutos de segurança pública, que vimos que é um
problema”, disse o deputado Marcelo Freixo.