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Alagoas
11/05/2015 14:44:57

Petuba quer que Estado banque horror da vaquejada em Alagoas

Petuba quer que Estado banque horror da vaquejada em Alagoas
Boi é derrubado por vaqueiro

cadaminuto //

davi soares

 

Há apenas quatro anos, Alagoas evoluiu sua legislação para coibir a prática da cultura circense de utilizar animais em espetáculos. A base legal era que aquela cultura de exibir bichos domados com violência e mantidos em condições de maus tratos não servia mais à sociedade consciente da relação respeitosa que deve ter com a fauna, seja selvagem ou domesticada. Mas eis que o governo de Renan Filho (PMDB), por meio da secretária estadual de Esportes, Claúdia Petuba, decide incentivar a prática da violência contra os animais, elevando o espetáculo cruel à condição de política pública de esporte.

 

A equivocada decisão da também presidente estadual do PCdoB foi anunciada na noite de quinta-feira (7) juntamente com a iniciativa de incentivar a cultura da capoeira. Outro erro foi o de colocar em pé de igualdade a cultura da capoeira e a vaquejada. Sendo a primeira, nascida da resistência dos negros contra a escravidão no Quilombo dos Palmares, com aspecto cultural e esportivo carente de incentivo e de reconhecimento, depois de séculos resistindo ao racismo.

 

Quanto a incentivar a vaquejada como esporte de interesse público, o primeiro questionamento que se faz é como? Como medir o retorno social do investimento feito? Haverá algum "centro de treinamento" de vaqueiros, ou o dinheiro público vai parar nos bolsos dos já estribados proprietários de cavalos, cujos animais com boa genética em início de carreira chegam a ser vendidos a partir de R$ 50 mil? Cavalos quarto de milha campeões de vaquejada, podem custar entre R$ 100 mil e R$ 200 mil.

 

Entidades protetoras dos animais devem resistir à iniciativa do Estado de fortalecer o braço que violenta animais nas arcaicas arenas medievais. Na opinião da protetora de animais Naíne Teles, do Projeto Acolher, é contraditório investir recursos públicos nas vaquejadas, enquanto o alagoanos carecem de atenção às políticas de atendimento à saúde animal e de controle de zoonoses. 

 

"Se isso acontecer, será um gasto mal investido. O que não falta é bicho precisando de ajuda, de medicamento e de atendimento médico-veterinário. É meio contraditório, pois vão investir dinheiro em um esporte que só maltrata o animal. Embora muitos dizem que não sofre, a gente sabe que em vaquejada o animal sobre. No lugar do governo fazer algo em prol dos animais, ele está fazendo contra. Nada dá certo, por exemplo, quando se fala em hospital público veterinário ou propor leis que ajudem os animais. Mas, para legalizar algo que não é bom, eles fazem", opinou Naíne Teles.

 

Inconstitucional

Para aqueles que querem encontrar neste texto algum ranço de preconceito, vou poupar detalhes sobre as fraturas, rabos arrancados (assista aqui) e estresse vividos pelos animais de vaquejada, principalmente os bovinos jogados ao chão de forma violenta com o auxílio de animais de outras espécies, uma delas a espécie humana. Por isso, entro logo na questão jurídica sobre o tema, dando voz ao que diz a Procuradoria Geral da República (PGR), na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4983, que tramita há quase dois anos no Supremo Tribunal Federal (STF), na tentativa de confirmar a inconstitucionalidade de uma lei que regulamenta a atividade como uma prática esportiva e cultural, no Ceará.

 

Para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a prática da vaquejada é inconstitucional, “ainda que realizada em contexto cultural”. E o artigo da Constituição Federal desrespeitado pela vaquejada é o 225, com o seguinte texto:

 

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

 

§ 1o. Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: [...]

VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.”

 

Diz Janot, na manifestação da PGR nos autos do processo: “[...] É ressabido que as vaquejadas traduzem situação notória de maus tratos a animais. A prática é inconstitucional, ainda que realizada em contexto cultural. [...] A violência contra os bovinos e equinos envolvidos nas disputas de vaquejada é inerente à prática. O fato de a lei reduzir tal violência não torna a conduta aceitável, em face do plexo constitucional. [...]O fato de a atividade resultar em algum ganho para a economia regional tampouco basta a convalidá-la, em face da necessidade de respeito ao ambiente que permeia toda a atividade econômica (art. 170, VI, da Constituição)”.

 

A PGR também lembra que o STF, quando analisava caso similar que tentava legalizar a “farra do boi”, em Santa Catarina, a Corte Suprema decidiu que a “obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício de direitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da norma do inciso VII do artigo 225 da Constituição Federal, no que veda prática que acabe por submeter os animais à crueldade”.

 

A ADI 4983 contra a lei cearense ainda tramita no STF, sob relatoria do ministro Marco Aurélio. Enquanto não é concluída a tentativa de invalidar a lei estadual cearense, a capital, Fortaleza, sancionou há um ano uma lei municipal que proíbe a realização e divulgação de vaquejadas, rodeios e qualquer outro evento que exponha animais a maus-tratos na capital cearense.

A secretária Cláudia Petuba não quis opinar sobre a reação da militância de protetores dos animais, nem sobre o viés mais cruel da cultura da vaquejada, a violência contra animais. "Quando eu tomar conhecimento do posicionamento delas [entidades de proteção aos animais] e elas entrarem em contato ou quando a matéria já tiver sido publicada, a gente pode vir a comentar esse tipo de posicionamento", respondeu a secretária, ao negar claramente que não queria antecipar sua opinião sobre os maus tratos.


Como seria dito na cultura da vaquejada, “zero boi” para o incentivo do Estado a uma prática claramente inconstitucional, "fora da faixa".

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