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mauricio
gonçalves
O tempo fechou. Em 18 de junho de 2010, o céu desabou sobre as
cabeceiras dos rios Mundaú e Paraíba. Caiu também sobre milhares de cabeças que
ficaram sem chão. Foi a cheia. Quase um dilúvio. Arrastou vidas, tetos e
sonhos. O mundo não se acabou, mas mudou bastante para as vítimas do flagelo.
As cidades atingidas pelo pior desastre “natural” da história de Alagoas hoje
vivem um novo drama, com nome e sobrenome: chama-se Programa da Reconstrução.
O vocábulo inventado pelo marketing do governo de hoje soa estranho, parece
mais uma ironia diante da Babilônia em que se transformaram os conjuntos
populares, da reconstrução após a enchente. Sem emprego, renda, lazer,
educação, saúde, esporte, água, saneamento ou qualquer presença do Estado, os
“contemplados” vivem uma enxurrada diária de problemas, sob a ameaça dos raios
e trovões da violência, ilhados pelo transbordamento da criminalidade.
As forças policiais constatam que os conjuntos construídos ajudaram a expandir
o raio de atuação do tráfico de drogas. As fronteiras do crime e o público
consumidor aumentaram. Quando o então presidente Lula desceu de helicóptero
sobre os escombros de União dos Palmares, anunciou que a pátria deveria
financiar a criação de outras cidades, afastadas dos rios, para não sofrerem
com novas cheias. A ideia era boa, mas sua execução (em parceria com o governo
de Alagoas e as prefeituras) até hoje é desastrosa. O consórcio entre tucanos e
petistas mostrou o que o Brasil tem de pior na administração pública.
Depois da enchente, um mar de casas construídas domina a paisagem de municípios
como Rio Largo, Atalaia, Murici, Branquinha, União dos Palmares, Santana do
Mundaú e tantos outros. Poderia ser a visão do paraíso, um símbolo de redução
no deficit habitacional, de justiça social, uma moradia digna para os
desabrigados. Mas basta entrar um pouco nestes novos aglomerados urbanos para
perceber que a promessa de uma vida melhor ficou apenas no discurso e na
propaganda.