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Mas muita gente não sabe como esses pinheiros, abetos,
espruces e outras árvores coníferas são seres incríveis.
Na natureza, elas sobrevivem a drásticas mudanças de
temperatura, crescem como arranha-céus e criam ecossistemas que abrigam
criaturas fascinantes.
Aqui estão alguns dos segredos das árvores de Natal e
suas obstinadas vidas.
Por favor, não tente repetir esta experiência em casa:
mergulhe um ramo de espruce siberiano (Picea obovata) ou de
pinheiro-silvestre (Pinus sylvestris) em um tonel de nitrogênio líquido,
a uma temperatura de -196ºC. Se você tiver pré-resfriado a planta a mais ou
menos -20ºC, vai ver que ela sobreviverá.
Essa incrível tolerância ao frio é bastante útil para as
coníferas que vivem nas florestas boreais da Sibéria, onde, no inverno, os
termômetros chegam a marcar -60ºC. O mecanismo que possibilita isso só é
conhecido parcialmente, segundo Richard Strimbeck, fisiologista botânico da
Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia.
A explicação mais provável é de que o tecido da árvore se
transforme em vidro. Nesse sentido, o termo "vidro" significa um
sólido sem uma estrutura cristalina – assim como uma vidraça, mas feito de
moléculas de açúcares, proteínas e água, em vez de sílica.
"Quando as moléculas estão nesse estado 'vítreo',
elas não podem se movimentar, o que quer dizer que elas não podem reagir",
explica Strimbeck. Ou seja, quando essas árvores são previamente congeladas,
sua atividade metabólica cai para zero e suas células não são danificadas pelo
frio extremo. Quando o inverno se aproxima, as árvores também retiram água de
suas células e a transportam para um tecido mais interno, para que os cristais
de gelo não façam a parede das células estourar.
Esse processo de preparação para o frio é chamado de
"endurecimento", e a árvore parece determinar quando deve começar a
se preparar seguindo as mudanças nas luzes e nas temperaturas durante as
estações do ano. "Mas o mecanismo preciso ainda é um mistério", diz
Strimbeck.
Do outro lado do mundo, em uma latitude bem
diferente da Sibéria, as árvores de Natal servem de abrigo para tarântulas. Nas
montanhas do Apalache, localizadas no leste do Tennessee e da Carolina do
Norte, nos Estados Unidos, os pinheirais que ficam a mais de 1.645 metros de
altitude abrigam uma das menores espécies de tarântulas do mundo, a Microhexura
montivaga.
Com apenas 25 milímetros de comprimento, essas
aranhas amarronzadas estão em risco de extinção e são difíceis de encontrar.
Elas vivem em poucos cumes e, mesmo ali, em comunidades minúsculas. Segundo o
Serviço de Pesca e Vida Silvestre dos Estados Unidos, em uma montanha da
Carolina do Norte, há apenas uma colônia em um rochedo e outra em uma pedra
próxima.
Os abetos da espécie Abies fraseri e os
espruces-vermelhos (Picea rubens) oferecem o abrigo necessário para
manter o habitat dessas minúsculas tarântulas fresco e úmido. Muito sol faria
os animais secarem, muita água acabaria com suas teias, tecidas nos pequenos
espaços entre as pedras e o tapete de musgo que cobre o solo.
Muitas das árvores de Natal que enfeitam nossas casas têm
no máximo uns 10 anos de idade. Mas, com tempo e condições adequadas, essas
plantas podem se tornar verdadeiros arranha-céus.
O maior abeto de Douglas (Pseudotsuga menziesii)
do mundo tem 99,7 metros de altura e habita uma floresta no condado de Coos, no
Oregon. Trata-se também da conífera não-sequoia mais alta do mundo. Já a
sequoia, que também é uma planta perene, é a maior árvore conhecida. E a mais
alta delas, batizada de "Hyperion" e plantada no Parque Estadual e
Nacional das Sequoias, na Califórnia, chega a 115,55 metros.
Segundo um estudo publicado na revista científica Nature,
em 2004, nenhuma árvore deve ultrapassar essa marca, já que, a partir dos 122
metros, os efeitos da gravidade dificultam o transporte de água até a copa da
árvore.
"Subir ao topo de uma árvore é como visitar um novo
bioma", afirma o americano Brian French, escalador de árvores profissional
e co-fundador da ONG Ascending the Giants, dedicada a medir e preservar algumas
das maiores e mais antigas árvores do mundo.
French e seu sócio, Will Koomjian, sobem frequentemente
ao topo das maiores coníferas da Costa Oeste americana, inclusive na sequoia
considerada como a maior do mundo.
Segundo eles, a vida nessas árvores é estratificada. Em
algumas das espécimes mais altas, os galhos só surgem a partir de 30 a 60
metros do chão, fazendo com que eles precisem de ganchos para instalar cordas
de alpinismo. Na base da árvore, o solo é úmido e esponjoso, mas na copa o
vento praticamente constante deixa tudo seco e frio.
O que não quer dizer sem vida: os troncos e os galhos de
plantas perenes gigantes servem de abrigo para aves como a coruja-pintada, uma
espécie ameaçada, e para mamíferos como esquilos-voadores e Arborimus
longicaudus (um roedor nativo dos Estados Unidos), que podem passar
gerações em uma árvore sem nunca tocar o chão.
O líquen que só cresce em árvores antigas serve de
alimento para esses roedores no inverno. Em 2008, os exploradores encontraram
até duas salamandras morando no buraco de um tronco de abeto de Douglas, a 76
metros do solo.
Árvores menores e mais jovens não substituem esses
habitats. "As plantas mais antigas e altas levaram centenas de anos para
formar esses ambientes", diz French.
As árvores de Natal são espécies que se adaptam
bem e são capazes de crescer bem fora de seu habitat natural. O abeto Abies
fraseri, nativo dos mais altos picos dos Apalaches, nos Estados Unidos, se
tornou uma das espécies mais populares no Natal. Ele agora é cultivado por
silvicultores do outro lado do país e recentemente foi introduzido na
Grã-Bretanha.
No entanto, cientistas se preocupam sobre o que
as mudanças climáticas poderão provocar nas plantas perenes nativas. "Se
as temperaturas de inverno não forem baixas o suficiente, algumas espécies
podem não receber a mensagem correta para 'despertar' na primavera", diz Strimbeck.
As temperaturas também podem influenciar no
crescimento dessas plantas, segundo estudiosos da Appalachian State University,
na Carolina do Norte, liderados por Howard Neufeld. Muito calor também pode
prejudicar esse tipo de árvore porque elas não são feitas para altas
temperaturas. Segundo Neufeld, a fotossíntese se desacelera a partir de -2,8ºC,
enquanto a perda de água pela respiração fica mais rápida.
A pesquisa dessa equipe é importante também para
a compreensão da fisiologia dessas amadas árvores, e para salvar o Natal, ao
ajudar silvicultores a se prepararem para futuras oscilações climáticas.