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mariana della barba
Para marcar
o Dia Mundial da Saúde e o Dia Nacional de Protesto contra os Planos de Saúde,
celebrados nesta segunda-feira, médicos de diversas partes do país vão promover
diferentes tipos de protestos, inclusive suspendendo o atendimento de planos.
No topo da pauta das reivindicações
está o valor pago pelas operadoras de saúde por consultas e procedimentos,
considerado "incipiente" por organizações médicas e por profissionais
ouvidos pela BBC Brasil.
Apesar de algumas pequenas vitórias,
o problema vem se arrastando há anos. Tanto que o slogan usado neste protesto
pela Associação Paulista de Medicina é inspirado em uma campanha de 15 anos atrás:
"Tem plano de saúde que enfia a faca em você e tira o sangue dos
médicos."
Diante desse cenário, um número
crescente de profissionais - de pediatras a oftalmologistas - vêm criando
alternativas para driblar os valores pagos pelas operadoras de saúde e
condições impostas por elas.
Uma das estratégias mais comuns é um
médico que não atende um plano de saúde cobrar do paciente com plano não o
valor da consulta particular, mas sim a quantia paga como reembolso pelo plano.
Mas como isso funciona na prática? O
caso da publicitária Juliana Linhares é um bom exemplo. Após descobrir um
problema no joelho, conseguiu fazer seu tratamento com um ortopedista de
confiança apenas porque ele aceitava esse tipo de pagamento. Como não atendia o
plano de saúde dela, o médico cobrou o valor mínimo de sua consulta particular
(R$ 300) e deu dois recibos, no valor de R$ 150 cada. Juliana pagou e usou as
nota dadas pelo médico para pedir reembolso a sua operadora de saúde, que era
de R$ 120 para consultas desse tipo.
"No total, recebi R$ 240 do
plano. Arquei com a diferença de R$ 60. O ideal, claro, seria não gastar nada,
visto que já pago a mensalidade do plano. Mas não encontrei um médico de
confiança entre os conveniados. Então, essa foi uma boa alternativa",
disse Juliana.
Planos lideram ranking de reclamações
Pelo segundo ano consecutivo, o setor
de planos de saúde lidera o ranking de queixas
recebidas pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), de
acordo com balanço divulgado no mês passado.
Os planos de saúde estão no topo da
lista, com 26,6% das demandas feitas à entidade em 2013, com acréscimo de 6,26
pontos percentuais em relação a 2012. Em seguida, vêm serviços financeiros
(16,73%), produtos (13,05%) e telecomunicações (12,53%).
Sobre planos de saúde, as queixas
mais recorrentes são negativa de cobertura, reajustes abusivos. O setor de
saúde privada abrange cerca de 50 milhões de brasileiros.
Pelo prisma do médico, a proposta
também é interessante, já que ele evitar perder pacientes, ganha mais do que
receberia do plano e é pago na hora - ao invés de esperar até dois meses para
receber os honorários pagos pelo plano.
Mais fôlego
Essa prática alternativa de cobrança
vêm ganhando força, tanto que ela é incentivada inclusive pelo Conselho Federal
de Medicina (CFM), que analisa uma proposta de retirar as consultas dos
contratos entre médicos e operadoras.
Pelo projeto, as consultas não
integrariam os planos contratados pelos pacientes. Ele cobraria apenas exames,
internações e outros procedimentos similares. Já as consultas seriam pagas
diretamente pelo paciente ao médico, que realizaria o mesmo procedimento que o
ortopedista no caso citado acima.
Ele daria um recibo pela consulta,
com o qual o paciente poderia solicitar o reembolso do valor com a operadora de
seu plano de saúde.
"Nossa proposta vem ganhando
força porque a classe médica está muito impaciente e desmotivada", disse à
BBC Brasil o médico Aloísio Tibiriçá, vice-presidente do CFM.
"É claro que não é o cenário
ideal, já que acaba sendo cômodo para os planos de saúde. Mas é uma alternativa
para se evitar um desgaste progressivo na relação entre profissionais da saúde
e operadores."
Demora para pagar
Segundo Tibiriçá, no momento, os
pacientes vêm se deparando com médicos desmotivados, que estão progressivamente
abandonando os planos de saúde - além de operadoras incapazes de disponibilizar
uma oferta razoável de profissionais para evitar uma demanda crescente - alta
de 4,6% no ano passado.
"Estamos nas mãos dos planos.
Eles demoram até mais de dois meses para pagar, por vezes não pagam determinada
consulta ou exame e não há um extrato claro para se descobrir o motivo",
diz Tibiriçá.
"Para piorar, a ANS (Agência
Nacional de Saúde Complementar, órgão do governo que regulamenta o setor) é complacente
com as operadoras de saúde, não ouve nossas propostas e também não faz a ponte
entre a classe médica e os planos."
A ANS disse à BBC Brasil que as
críticas são infundadas, já que há vários canais de diálogo com os médicos,
como a recente criação de um comitê para incentivar boas práticas entre
operadoras e médicos, para estreitar o diálogo entre as partes.
Segundo a agência, também não é
verdadeira a afirmação de que não há diálogo, já que há "reuniões em
grande periodicidade para se debater temas pertinentes."
A insatisfação dos médicos em relação
aos planos parece permear todas as especialidades e com profissionais em
diversos momentos de suas carreiras.