jornalismoecia //
Um pouco de história
Você sabe por quê se
comemora o Dia
do Jornalista em
7 de abril?
A versão mais consistente para a escolha desta data como Dia do Jornalista remonta
ao período do Império: a data é comemorada em 7 de abril em homenagem a João Batista Líbero Badaró,
médico e jornalista que morreu assassinado por inimigos políticos, em São
Paulo, em 22 de novembro de 1830; essa morte gerou um movimento popular que
levou à abdicação de D. Pedro I, no dia 7 de abril de 1831. Por causa disso, a
data foi escolhida para marcar a fundação da Associação Brasileira de Imprensa
(ABI), por Gustavo de
Lacerda, em 1908. E a própria ABI foi quem a instituiu como Dia do Jornalista nas
comemorações de um século da abdicação de D. Pedro I, em 1931. Agora, a própria
ABI, que está fazendo 99 anos em 2007, dá início oficialmente, a partir deste
dia 7 de abril, às comemorações de seu centenário de fundação.
Isto não parece um nariz-de-cera. É. E dos bem
grandes e pretensiosos, tanto que tem até letra de música/lyrics e título em três
linhas, metade em francês (très
chic, n’est pas?). Tudo para falar do futuro do jornalista, ou do
jornalismo – não ficou muito bem definido, pois nossas fontes, executivos de
grandes redações, bons jornalistas que são, não se ativeram à pauta sugerida e
derivaram ora para um, ora para outro, ou falaram dos dois. Não importa.
Importa é que o teor do que escreveram sobre o futuro do jornalis(mo)ta, sem
que combinações prévias houvesse, tem um eixo comum: ele não será obra do
destino, o que Deus quiser, whatever
will be, will be,
mas com certeza reforça o adágio popular francês de que quanto mais muda, mais
fica do mesmo jeito. Pois o conceito que perpassa quase todos os depoimentos,
qualquer que seja o enfoque de cada um, é que as competências básicas do bom
jornalista não mudaram, nem mudarão, com a diversificação das mídias e o
advento das novas tecnologias – antes, as reforçaram.
A maioria dos onze executivos que J&Cia
ouviu sobre o tema enfatizou a qualificação dos profissionais como essencial ao
futuro do jornalismo. Rodolfo
Fernandes, de O Globo, resumiu: “Ainda não inventaram a fórmula de fazer um veículo de
comunicação qualificado sem jornalistas qualificados. (...) O nome desse jogo é: profissional
preparado e veículo com credibilidade – hoje ou no futuro”. Já Augusto Nunes, da CBM,
afirmou que “nada substitui
o talento humano, esse sim decisivo e imprescindível para a perenidade do
jornalismo, em qualquer tempo, independentemente de meios e tecnologias”;
e Bruno Thys,
do Infoglobo, muito apropriadamente simplificou: “Se o jogador não for bom, a bola não ajuda”.
O papel do jornalista como intérprete dos fatos
para audiências cada vez mais exigentes também mereceu destaque. Paulo Nogueira, da
Editora Globo, por exemplo, fez referência à “missão
essencial de um jornalista – ontem, hoje, sempre. Sob quaisquer circunstâncias,
em qualquer mídia – tradicional, nova, novíssima. Ajudar o público a entender o
mundo”. Abordagem semelhante usou Marcelo Rech, da RBS: “Para nós ficará reservado o papel
mais fundamental: fazer as conexões da realidade e traduzi-las em linguagem
atraente e compreensível, imprimindo cada vez mais estilo pessoal, seja em
textos ou fotos e ilustrações”. O mesmo enfoque teve Otávio Frias Filho, da
Folha de S.Paulo, mas para comparar os papéis dos veículos: “É plausível esperar que os sites se especializem na informação breve e
imediata (além de material de pesquisa e comunicação interativa), enquanto os
jornais impressos se dediquem a oferecer uma síntese analítica que organize o
excesso de informação divulgada a cada 24 horas”. Idêntica direção
seguiu Ricardo Gandour,
de O Estado de S. Paulo, ao afirmar que “a
nova mídia se consolida naquilo que tem de peculiar e vai sedimentando suas
características mais fortes – interatividade, instantaneidade, possibilidades
audiovisuais. E o leitor ou internauta começa a perceber, de novo, o valor do
conteúdo editado. E sobressai a análise, a construção de contexto, de nexo – e
aí tanto faz, se no papel ou na web”. Já Amauri
Melo, da Brasil Digital, limitou-se a criticar a excessiva
valorização da tecnologia e a afirmar que, “para
o futuro, devemos evitar que o jornalismo vire marketing, essa praga que não
tem compromisso com o País”.
Outro ponto comum aos depoimentos é que, sem
dúvida, o jornalista do futuro – e já do presente – terá que ser muito mais
versátil, polivalente, aquele que o adepto do futebol diz que “cobra o
escanteio e corre na área pra cabecear”. O “pauteiro-repórter-redator-editor-diagramador,
o profissional-síntese”, como o classificou Fernando Mitre, da TV
Bandeirantes. Ou, como disse de outro modo Carlos Marques, da Editora Três, “o Jornalismo, na Era da convergência,
da notícia em tempo real e de produtos sendo formatados de maneira
personalizada para cada leitor ou espectador, está a exigir dos profissionais
um conhecimento mais apurado das ferramentas disponíveis e criatividade para
colocá-las em prática”.
Os veículos, a Academia e a formação
profissional do jornalista
Aonde quer que se vá, já nos acostumamos a ouvir queixas quanto à baixa
qualidade da educação formal no Brasil e que ela é um dos grandes inibidores ao
desenvolvimento do País. Agora mesmo acabamos de ser informados sobre um grande
pacote de medidas governamentais que, mais uma vez, pretende resolver,
igualmente de vez, o problema da baixa qualidade do ensino brasileiro. Num
cenário como esse, como não poderia deixar de ser, o Jornalismo não é exceção.
Uma das queixas mais comuns diz respeito à proliferação de faculdades por todo
o território nacional sem a adequada contrapartida tanto de infraestrutura
(laboratórios de jornalismo, rádio e tevê, por exemplo) quanto de um corpo
docente apto a preparar os futuros profissionais para um mercado em constante
mutação, que enfrenta a concorrência efetiva da figura do repórter-cidadão, dos
milhões de blogs
que hoje disseminam informação por todos os poros da humanidade, das centenas e
milhares de sites
e portais alojados na web,
das rádios e tevês digitais, da telefonia móvel e do que mais está por vir.
Face a esse quadro, pedimos a representantes da
Academia e de veículos de comunicação reflexões sobre como encontrar caminhos
comuns para aproximar uma de outros, o quê fazer para que essas instituições
recuperem o poder de reflexão, de pensar a atividade, de sair do mecanicismo,
de formar gerações mais críticas, criativas, ousadas.
De uma forma geral, representantes dos veículos de
comunicação, naturais e principais destinos dos jovens jornalistas que todos os
anos são, literalmente, despejados no mercado (estima-se algo em torno de 5
mil), não fazem críticas contundentes às instituições de ensino. Alguns até as
elogiam. Muitos inclusive preferem afirmar que seus programas internos de
treinamento visam atender a necessidades específicas do trabalho de cada um e
não a preencher lacunas da formação profissional de jornalistas. Ana Estela de Sousa Pinto,
da Folha de S. Paulo, enfatiza que a grande deficiência na formação
profissional, hoje, é não se encontrarem pessoas interessadas em desenvolver as
características básicas do jornalista e que as faculdades não estimulam os
alunos a tê-las; ela as especifica: “Ter
conhecimento para interpretar os fatos que cobre e capacidade para contá-los de
forma correta – e, se possível, com graça; ser curioso, investir na sua própria
formação, ler muito para ampliar o seu espectro cultural e ser esperto o
suficiente para perceber quando o querem enganar”. Embora considere
que a atual geração tem uma formação “um pouco melhor” do que a de vinte anos
atrás, Nívia Carvalho,
de O Globo, diz que os jovens de hoje escrevem bem, mas seus textos são
pasteurizados, têm um conhecimento diversificado, mas sem profundidade,
desconhecem o que foi feito no jornalismo nos últimos anos e não têm o hábito
de ler jornal: “A grande
vantagem deles é o domínio de ferramentas; é a primeira geração que entra nas
redações sem precisar aprender o básico”. Francisco Ornellas, do
Estadão, garante haver motivos mais do que suficientes para continuar
acreditando no jornalismo e usa como justificativa para essa opinião os 510
novos jornalistas que os cursos internos do jornal ajudaram a formar entre 1990
e 2006: “A maioria absoluta
deles – 96% – atua hoje em grandes redações do País. São os jovens que
fazem a imprensa hoje e habitam as redações. Não há como negar-lhes
competência, eficiência, empenho, ética”. Para Ricardo Stefanelli, de
Zero Hora, a universidade não tem que preparar o estudante para a prática: “Ela deve instigá-lo a questionar,
deixar a sua mente aberta para o debate e, claro, dar-lhe os fundamentos
teóricos. E isso, a meu ver, as faculdades de jornalismo do Rio Grande do Sul
têm feito muito bem. As novas gerações me parecem cada vez mais bem preparadas
e mais precoces. Nós é que vamos ensinar a prática a esses estudantes”.
E Hamilton dos Santos,
da Abril, arrisca uma proposta para aproximar os futuros jornalistas
brasileiros da realidade do mercado editorial: “Basta deixar de lado as obsessões ideológicas
ultrapassadas e centrar fogo em pesquisas que resultem em boas saídas para a
produção de conteúdos em multiplataformas, digitais e analógicas”.
Pelo lado da Academia, Carlos Chaparro, da
ECA-USP, enfatiza a importância do jornalismo para os processos da construção
democrática (“Não há como
pensar em democracia sem jornalismo.”), mas ressalva que os
jornalistas terão de se capacitar – técnica, ética e intelectualmente – para
atuarem nesses processos como narradores confiáveis de uma atualidade cada vez
mais complexa: “Terão de ser
profissionais que sabem alcançar e compreender o âmago dos conflitos, capazes,
portanto, de enxergar nos fatos não apenas o que eles são, mas, principalmente,
o que significam”. E José
Marques de Melo, fundador da ECA-USP, embora faça uma veemente
defesa dos jornalistas hoje diplomados no que chama de “instituições de
qualidade” (“... possuem
competência suficiente para ocupar postos de trabalho nas redações das empresas
do ramo...”), identifica que falta uma maior interação com o
mercado e a sociedade: “O
restabelecimento do estágio ajudaria a refinar o treinamento profissional. O
controle da qualidade do ensino pela corporação jornalística, mediado pelo
governo, poderia separar o joio do trigo, colocando em quarentena as ‘fábricas
de diploma’ (escolas de baixo nível)”.
A demanda por cursos
de jornalismo em Salvador incentivou o surgimento de faculdades particulares
em curto espaço de tempo. A abertura de novos cursos tornou mais fácil o
acesso à profissão, já que antes somente era possível obter essa formação
pela Universidade Federal da Bahia, por meio da Faculdade de Comunicação
Social. De 2000 para cá, Salvador ganhou oito faculdades privadas.
Atualmente, cerca de 20 estão autorizadas pelo MEC a ensinar Jornalismo na
Bahia.
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Aos
que contam e fazem a história Ao me convidarem para
esta homenagem, não titubeei: vou falar de alguns para cumprimentar todos.
Sempre admirei jornalistas, os historiadores modernos, que nos colocam no
meio do que acontece. Em qualquer lugar do mundo. |
Os
jornalistas daqui estavam muito próximos da corte e não apenas fisicamente. José
Luís de Mendonça, entretanto, fez o primeiro jornal radicalmente
oposicionista em 1817, no Recife: o “Preciso” teve um único número, mas era
semente para germinar. A distância
da corte alimentava a ousadia. Frei Joaquim do Amor Divino, Frei Caneca,
porque filho de tanoeiro, lançou, em dezembro de 1823, o “Tifis
Pernambucano”. Seguiu criticando o governo até a eclosão da Confederação do
Equador, movimento separatista republicano do Recife. Preso em combate,
morreu fuzilado em 1825. João
Baptista Líbero Badaró, médico genovês e deputado fugido da Itália,
chegou a São Paulo em 1826 e três anos depois colocou em circulação “O
Observador Constitucional”. Será que não influenciou outro genovês 130 anos
depois? Mino Carta, apesar de não dirigir, veio criar a “4 Rodas”,
depois “Jornal da Tarde”, “Veja”, “IstoÉ”, “Jornal da República”, “Senhor”
semanal e “Carta Capital”. Badaró, vítima de um tiro, agonizou 24 horas e
deixou a frase célebre: "Morre um liberal, mas não morre a
liberdade". Mino cria seu emprego. E, polêmico, se diz honrado por 31
colegas recusarem o convite para entrevistá-lo no “Roda Viva”, em 2000. O
recorde anterior, 17 recusas, era de ACM. Às 11h
de 4 de janeiro de 1875, saiu o primeiro número de “A Província de São
Paulo”, reunindo republicanos moderados em um empreendimento que foi o maior
da imprensa brasileira até então. Júlio César Ferreira de Mesquita, o Júlio
de Mesquita, de colaborador virou dono do jornal, cujo nome mudou, em
1890, para “O Estado de S. Paulo”. O “Estadão” foi um marco, tendo em suas
páginas gente como Euclides da Cunha, cujo “Os Sertões” nasceu depois
das reportagens que fez para o jornal. Júlio colocou o nome Mesquita na
história do jornalismo, com filhos e netos, entre eles outros dois Júlios e
um Ruy. Jornalistas
não só relataram a história, como a fizeram. Uma entrevista de Carlos
Lacerda com o oposicionista José Américo de Almeida, em 1945, que rompeu
com o silêncio imposto pelo DIP, apressou a queda do Estado Novo. Cinco anos
depois, uma entrevista de Getúlio Vargas para Samuel Wainer recolocou
o ditador no centro da política brasileira e no poder federal. Cásper
Líbero,
nascido em 1889 em Bragança Paulista, SP, fundou aos 22 anos a Agência
Americana, a primeira agência de notícias do Brasil. Em 1918, comprou “A
Gazeta”, vespertino fundado em 1906. Revolucionário, lançou vários
suplementos e “A Gazeta Esportiva”, provavelmente o primeiro dedicado ao
assunto no País, e criou a Corrida de São Silvestre. Em 1947, quatro anos
depois dele ter morrido num desastre aéreo, em seu nome foi criada a primeira
Faculdade de Jornalismo do Brasil. Outro
é Elio Gaspari, também da “Folha” e mais um italiano que se
abrasileirou. O 30 de dezembro de 1978 era o último dia dele como editor de
Política do “Jornal do Brasil”, pois no dia seguinte ia para ficar dois anos
em Nova York como correspondente. O Congresso Nacional havia decidido que em
31 de dezembro, à meia-noite, terminaria a vigência do AI 5. Todo mundo
sabia, mas só ele não se esqueceu. No dia seguinte o “JB” foi o único a dar a
notícia, com cinco páginas. Ele guarda até hoje a lauda com a manchete
"O regime do AI-5 acaba à meia-noite de hoje" que foi levada para
ser composta na oficina do jornal. O Ricardo
Noblat, também. Pernambucano de Recife, é jornalista desde 1966. Acabou
com a imagem “chapa branca” do “Correio Braziliense” e há três anos criou “o
primeiro blog de política a partir de Brasília” (Castellinho acessa
todo dia lá em cima). Sergipano
de Aracaju, Joel Silveira começou a lida em 1935. O semanário
“Diretrizes”, lançado por Samuel Wainer e Azevedo Amaral em
1937, deu a ele a oportunidade de se transformar no nosso primeiro grande
repórter. Em 1943, passou uma semana em São Paulo, onde, com ajuda de Di
Cavalcanti, fez a ferina reportagem “Grã-finos em São Paulo”. Em 1944, pelos
Diários Associados foi à Itália junto com seis mil pracinhas combater o Eixo
em Monte Castelo. O
jovem cinéfilo Alberto Dines começou no jornalismo em 1950. Doze anos
depois, com uma carreira feita em jornais e revistas, foi para o “Jornal do
Brasil”, onde promoveu uma grande mudança. Depois de 12 anos (o nome dele tem
12 letras, Zagalo), o “JB” o demitiu. Magoado, foi para os EUA. Voltou a
convite da “Folha”, na qual fez a coluna “Jornal dos Jornais”, de crítica aos
meios de comunicação, um pioneirismo adotado via ombudsman pela
própria “Folha” anos depois. Audálio
Dantas começou
jornalista em 1950, aos 20 anos. Por volta de 1963 estava em “O Cruzeiro”,
quando descobriu Maria Carolina de Jesus, moradora de favela, que tinha um
diário. Com a matéria dele, o diário acabou publicado como “Quarto de
Despejo”, livro de sucesso no Brasil e exterior. Audálio aliou ao faro de
repórter a veia política, presidiu o Sindicato dos Jornalistas nos anos de
chumbo, com importante papel quando do assassinato do Vlado, em 1976, e
chegou a deputado federal. José
Hamilton Ribeiro veio do campo: nasceu em Santa Rosa do Viterbo,
SP. E para o campo voltou: hoje está no “Globo Rural”. Mas entre um e outro,
ganhou vários Esso, rodou o mundo, perdeu uma perna no Vietnã. É
unanimidade rara no meio. Réplicas
e tréplicas entre jornalistas são comuns. Entre pai e filha, só uma. Ricardo
Kotscho, são-paulino de Porangaba, tem carreira reconhecida. Mas acabou
contestado pela filha, que reclamou do texto do pai falando bem de São Paulo
no “No Mínimo”. Lillian Witte Fibe foi a primeira
Luluzinha a entrar para o então clube do Bolinha da economia. E ainda,
irrequieta, em julho de 2000 foi pro “Terra” fazer “um novo canal de notícias
multimídia”. Mas nunca escondeu que, atrás da coleguinha bem-sucedida, tem um
Alexandre Gambirasio. Só
uma mulher? Bom, como elas estão tomando conta das redações, o Edu Ribeiro
pode convidar uma para escrever o texto o ano que vem. * Editor
da coluna “Responsabilidade Social e Ética” no UOL e Globo Online, escreveu
“O Relógio de Urupa” (Melhoramentos/1988); “Jornalistas Brasileiros, Quem é
Quem no Jornalismo de Economia” em parceria com Eduardo Ribeiro (Mega
Brasil/2005); e “A Trajetória de Octavio Frias de Oliveira” (Mega Brasil/2006
e Publifolha/2007). |