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Atualidade
25/05/2025 16:00:00

Censo revela dados inéditos sobre autismo e deficiência no Brasil

Censo revela dados inéditos sobre autismo e deficiência no Brasil

Pela primeira vez, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) incluiu uma pergunta específica sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) no Censo, revelando que aproximadamente 2,4 milhões de brasileiros possuem diagnóstico do transtorno, o que corresponde a 1,2% da população nacional. A coleta foi feita a partir da resposta direta dos moradores à pergunta sobre diagnóstico clínico por profissionais da saúde.

Autismo tem maior incidência entre meninos e crianças

A pesquisa indicou que o TEA é mais comum entre os homens, afetando 1,5% da população masculina, enquanto entre as mulheres a taxa é de 0,9%. O grupo etário com maior prevalência está entre meninos de 5 a 9 anos, com 3,8% diagnosticados, cerca de 264 mil crianças. Entre as meninas da mesma idade, o índice é de 1,3%, totalizando 86 mil casos. Especialistas atribuem esse número elevado à ampliação e popularização dos diagnósticos nos últimos anos.

Os números brasileiros se aproximam dos dados dos Estados Unidos, onde 3,2% das crianças de até oito anos têm diagnóstico de TEA, conforme o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC). Nos EUA, o diagnóstico é três vezes mais frequente entre meninos do que meninas.

Participação escolar e taxa de matrícula

O estudo também analisou a presença de estudantes autistas nas escolas. Aproximadamente 2% dos alunos do ensino fundamental regular, faixa etária entre 6 e 14 anos, foram identificados com o transtorno. No total, são 508 mil crianças e adolescentes com TEA no ensino fundamental, representando 66,8% dos estudantes autistas no Brasil. No ensino médio, há 93,6 mil adolescentes com autismo matriculados, o que representa 1,2% do total de alunos.

Além disso, o levantamento mostrou que a taxa de escolarização entre pessoas com diagnóstico de autismo é de 36,9%, superior à taxa da população sem TEA, que é de 24,3%. A razão está na maior concentração de autistas em idades escolares, especialmente entre 6 e 14 anos.

Distribuição geográfica e racial

A prevalência do autismo é relativamente uniforme em todo o país, com índices semelhantes ao da média nacional em quase todas as regiões. Apenas o Centro-Oeste apresentou um número ligeiramente menor, com 1,1%. Os estados mais populosos — São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro — concentram os maiores números absolutos de pessoas com diagnóstico de TEA.

No recorte racial, o diagnóstico é mais comum entre pessoas brancas (1,3%), o que representa cerca de 1,1 milhão de indivíduos. Apesar de pardos e pretos apresentarem um índice de 1,1%, há mais pessoas pardas com TEA (1 milhão) do que pretas (222 mil), refletindo a distribuição populacional do país.

Inclusão do autismo no Censo foi determinada por lei

A inserção da pergunta sobre TEA no Censo foi determinada por uma legislação aprovada em 2019, que obriga a inclusão de temas relacionados ao espectro autista nos levantamentos demográficos. Segundo analistas do IBGE, a adaptação do questionário seguiu padrões internacionais e exigiu o desenvolvimento de estratégias adequadas para captar esse tipo de informação.

O Transtorno do Espectro Autista é caracterizado por alterações neurológicas que afetam a comunicação, os comportamentos e a interação social. O espectro é amplo e abrange desde pessoas com necessidades severas até indivíduos com autonomia funcional, incluindo casos como o da antiga classificação de síndrome de Asperger.

Brasil tem 14,4 milhões de pessoas com deficiência

O Censo de 2022 também traçou um novo retrato da população brasileira com deficiência. Segundo os dados, 7,3% da população, ou 14,4 milhões de pessoas, possuem alguma limitação permanente para enxergar, ouvir, se locomover, realizar movimentos finos ou têm restrições cognitivas.

As mulheres representam a maioria entre esse grupo: 8,3 milhões, contra 6,1 milhões de homens. Proporcionalmente, 8,1% da população feminina tem alguma deficiência, em comparação com 6,4% da população masculina. O índice cresce com a idade: entre pessoas com 70 anos ou mais, 27,5% relatam limitações. Entre 60 e 69 anos, o índice é de 14,4%; entre 15 e 59 anos, 5,4%; e entre crianças de 2 a 14 anos, 2,2%.

Recorte por região e etnia

A maior concentração de pessoas com deficiência está no Nordeste, com 8,6% da população. Em seguida aparecem as regiões Norte (7,1%), Sudeste (6,8%), Sul (6,6%) e Centro-Oeste (6,5%). No recorte étnico, 44,8% se declararam pardos, 42,1% brancos, 12,2% pretos, 0,5% indígenas e 0,4% amarelos.

Mesmo com a maior parte da população indígena localizada na Amazônia Legal, é no Nordeste que se concentra a maioria dos indígenas com deficiência: 42,4%.

Deficiência e desigualdade social

Segundo o IBGE, ainda não é possível cruzar diretamente os dados de deficiência com os de renda, mas outras pesquisas já apontaram forte relação entre deficiência e pobreza. A exclusão social e o acesso precário a serviços como saúde, educação e saneamento básico são fatores que ampliam a vulnerabilidade e a incidência de limitações.

Um exemplo é a taxa de analfabetismo: entre pessoas com deficiência com 15 anos ou mais, o índice chega a 21,3%, quatro vezes maior do que entre pessoas sem deficiência (5,2%).

Principais tipos de deficiência

As dificuldades mais comuns são para enxergar (7,9 milhões), andar ou subir degraus (5,1 milhões), pegar objetos pequenos ou abrir tampas (2,7 milhões), limitações mentais (2,6 milhões) e para ouvir (2,5 milhões). Como as respostas permitiam mais de uma opção, os números somados ultrapassam o total de pessoas com deficiência.

Educação inclusiva deve superar o modelo médico

Embora os dados do Censo ajudem a nortear políticas públicas, especialistas alertam para o risco de excesso de diagnósticos, especialmente na infância. O promotor João Paulo Faustinoni, do Ministério Público de São Paulo, defende uma abordagem educacional mais centrada na convivência e na adaptação social, em vez de depender exclusivamente da rotulação médica.

Para ele, a verdadeira inclusão deve considerar as relações sociais e o ambiente escolar como fatores centrais no desenvolvimento das crianças diagnosticadas com TEA ou outras condições.