Bbc Brasil //
Um cirurgião italiano que
diz ser capaz de realizar um inédito transplante de cabeça afirma que já
poderia fazer a operação no ano que vem.
Em
entrevista ao programa Newsbeat, da BBC, Sergio Canavero afirma ter voluntários
para o procedimento, que consiste em usar o corpo de um doador para ter a
cabeça afixada a ele.
Canavero
está confiante de que a medicina tem recursos para fazer da técnica uma
realidade.
"Não
estamos a uma década ou a anos (do transplante). Eu espero ter tudo pronto para
começar a trabalhar no final de 2017. Mas é claro que a realização depende da
disponibilidade de um doador. O último transplante facial demorou diversos meses
para ser feito por falta de um doador adequado. Mas a tecnologia estará
disponível".
Apesar
do imenso risco envolvendo a cirurgia, o médico italiano diz ter muitas pessoas
se oferecendo como cobaias - dispostas a, na prática, trocar seu corpo por um
mais saudável.
Ele
diz que, por conta da tecnologia disponível, países como Reino Unido, Alemanha
e França seriam os mais indicados para realizar o transplante de cabeça.
Mas, pelo
menos por enquanto, Valery Spiridonov, um russo de 31 anos, é o primeiro da
fila: em estado terminal, ele quer que sua cabeça seja transplantada a um corpo
que não esteja debilitado como o seu.
Valery sofre
da Doença de Werdnig-Hoffman, uma condição degenerativa muscular que o força a
usar cadeira de rodas. Em entrevista ao programa de TV britânico Good Morning
Britain, o russo disse que quer recuperar sua independência, melhorar suas
condições de vida, ajudar a ciência e "ser capaz de cuidar de mim
mesmo".
"Minha
vida hoje é muito difícil. Dependo muito das pessoas, e se houver uma forma de
mudar isso, acredito que ela deveria ser testada e usada", disse.
No entanto,
ele disse que sua namorada não quer que ele faça a cirurgia. "Ela me
aceita como sou e diz que não preciso mudar".
Em uma
entrevista coletiva no início do ano, Valery foi incisivo ao responder
perguntas mais críticas sobre a operação e os dilemas éticos envolvidos.
"Gostaria de saber se alguém aqui se colocaria meu lugar, precisando de
ajuda para tudo e vivendo uma vida sem sexo".
Canavero diz
que o transplante requereria a mão de obra de 150 médicos e enfermeiros,
duraria 36 horas e custaria o equivalente a R$ 42 milhões. O primeiro passo
seria congelar o corpo do paciente para preservar as células do cérebro.
O passo
seguinte seria drenar o cérebro de Valery e substituir o sangue com uma solução
cirúrgica.
A partir daí,
o pescoço do paciente e do doador seriam cortados para que as artérias e veias
importantes fossem envoltas com tubos feitos de uma combinação de silicone e
plástico - esses tubos seriam comprimidos para impedir o fluxo de sangue e
depois afrouxados para facilitar a circulação quando a cabeça fosse
reconectada.
Uma parte ainda mais delicada é o
corte da medula espinhal, algo que seria feito com um bisturi especial, feito
de diamantes, por causa de sua força. A cabeça, então, é movida para o novo
corpo e as medulas, conectadas com um tipo especial de cola.
Os desafios
seriam enormes, a começar pelo perigo da rejeição do corpo pela cabeça, das
dificuldades em reabilitar o paciente após a cirurgia e, sobretudo, da
incerteza sobre como será possível integrar a parte da espinha que começa na
cabeça e prossegue pelas costas do corpo humano.
Canavero conta
que primeiro testará o procedimento em doadores que tenham tido morte cerebral.
"Vamos
simplesmente cortar a medula espinhal e, durante seis a 12 horas, monitorar a
recuperação e a condição neuro-fisiológica", diz o italiano.
Ele deposita
suas esperanças também na substância usada para reconectar a medula espinhal -
um polímero inorgânico chamado polietilenoglicol.
"Agora
temos uma substância que faz o milagre de renovar uma medula espinhal cortada.
Os resultados que temos são espetaculares. Fizemos um teste com um cachorro e
ele se recuperou em duas semanas. Ele conseguia correr".
A maioria dos
especialistas médicos classifica a proposta de Canavero como "ficção
científica" e acha que um transplante de cabeça é impossível - além de
potencialmente trazer dilemas éticos e submeter pacientes a procedimentos que
podem ser muito dolorosos.
Em reportagem de abril, o jornal britânico The Independent citou Arthur Caplan, fundador do
Centro de Bioética da Escola de Medicina da Universidade de Nova York, dizendo
que Canavero era um "charlatão" que visava a "autopromoção"
oferecendo "falsas esperanças" aos pacientes.
Há
quem também duvide de que a aprovação de órgãos regulatórios, o financiamento e
a capacidade técnica para o transplante estejam disponíveis no fim de 2017,
como prevê Canavero.
Em uma
conferência de cirurgia cerebral em Annapolis, EUA, em julho, a palestra de
Canavero foi uma das mais esperadas e comentadas.
Muitos
colegas viram o procedimento com ceticismo; outros destacaram, porém, que
diversas descobertas científicas já foram classificadas de "loucura"
antes de serem concretizadas - além de terem permitido outros avanços
científicos em paralelo a sua concretização.
Canavero,
por sua vez, diz já ter testes em macacos para usar como base e que o
procedimento tem "90% de chances de sucesso".
"Isso
quer dizer que o paciente acorda sem danos e já começa a andar dentro de um mês
ou depois de fisioterapia", explica.
"Estamos
dando esperanças às pessoas que têm sido decepcionadas pela medicina
ocidental".