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Alagoas
16/10/2018 19:05:00

Os impactos da polarização política na saúde mental de brasileiros


Os impactos da polarização política na saúde mental de brasileiros
Ilustração

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São Paulo – Ansiedade, medo e preocupação. São esses os sentimentos que o psiquiatra Luiz Scocca, formado pela Faculdade de Medicina e Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), mais tem ouvido em seu consultório particular, localizado na zona oeste de São Paulo. Até aí, nada de novo sob o sol, considerando que estamos falando de um escritório psiquiátrico. A motivação que tem levado muitos de seus pacientes a procurar ajuda, no entanto, não podia ser mais atual: as eleições de 2018.

A polarização política já acentuada no país ganhou combustível na corrida eleitoral do segundo turno — a ser disputado por Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL) no dia 28 de outubro —, e eleitores e candidatos usam como nunca suas redes sociais para se manifestar politicamente. O problema é que o campo de batalha virtual favorece a formação de “bolhas” e a falta de diálogo entre pessoas que pensam diferente – sobretudo entre os mais jovens.

Especialistas ouvidos por EXAME explicam como esse cenário de intolerância vem prejudicando o debate público e afetando o modo como lidamos com as relações humanas. Confira abaixo.

Violência, falta de diálogo e intolerância

Um dos mais importantes vilões do bem estar do eleitor hoje é o discurso violento, que prejudica a livre expressão entre as pessoas, na visão da psicóloga e professora da Faculdade de Ciências Humanas da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Gabriela Gramkow. O diálogo, para ela, é uma ferramenta potente contra o processo de esgotamento mental pelo qual as pessoas — cada vez mais isoladas — têm passado. “É um desamparo psíquico extremo que segrega os indivíduos em si próprios”, explica a especialista. A situação se agrava ainda mais à medida que a falta de diálogo afeta as esferas familiares, cotidianas, educacionais e de trabalho.

Entre 30 de setembro e 11 de outubro, houve ao menos 70 ataques motivados pela divergência política no Brasil, segundo levantamento da Agência Pública em parceria com a Open Knowledge Brasil. Desse número, 50 foram cometidos por eleitores do Bolsonaro; 6 contra eleitores do Bolsonaro e 15 agressões não definidas. Os registros são apenas de casos de agressões e ameaças feitas ao vivo, nos quais a integridade física de pessoas correu risco.

A intensificação do medo de novos ataques foi o que motivou, na semana passada, a criação da página no Instagram “Ele não vai nos matar”, em referência ao candidato do PSL. O intuito é denunciar locais onde agressões a LGBT’s motivadas pelas eleições aconteceram. A página conta com 104 mil seguidores.

O impacto na saúde mental

Temores e preocupações têm assolado pacientes de todos os espectros políticos, mas os mais jovens devem pagar mais caro, pelo menos no que diz respeito à saúde mental. Isso porque, primeiro, eles estão mais expostos a informações negativas compartilhadas nas redes sociais, onde o discurso de ódio e as notícias falsas correm soltos; segundo, como explica o psiquiatra Luiz Scocca, porque há um excesso de expectativa. “Toda a expectativa das pessoas mais jovens, ainda mais presentes nas redes sociais, vêm aumentando nos últimos anos. Eles selecionam o que há de melhor para postar em suas redes sociais, explicitando essa busca por perfeição e resultados excelentes”, analisa. Scocca revela que seus pacientes de 18 a 37 estão mais ansiosos com o futuro político do Brasil. “Quem não frequenta tanto as redes sociais, se mostra menos preocupado”, analisa. Ainda assim, “o medo está contagiante”.

A ansiedade tem algumas reações corporais que podem ser notadas, como o aumento dos batimentos cardíacos, tremores, transpiração exacerbada e sintomas relacionados à liberação de cortisol e adrenalina no organismo. Nas palavras de Luiz Scocca, toda essa ansiedade é um “mecanismo de defesa e alerta que se torna constante” criado pelo corpo. No Brasil, segundo pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS), 9,3% da população sofre com ansiedade. Ao todo, são 18,6 milhões de pessoas. O país também é o que tem maior taxa de depressão da América Latina. São 11,5 milhões de brasileiros que sofrem com esse problema; 5,8% da população.

Como fica o debate público?

Além de afetar a saúde mental, a falta de diálogo e a tolerância impactam também a forma como o debate público está sendo formado. É o que explica Eduardo Grin, cientista político e professor da FGV de São Paulo. Para ele, a entrada de Jair Bolsonaro na disputa eleitoral mudou as regras do jogo democrático que estava estabelecido até então. Na visão do cientista político, o presidenciável do PSL representa a entrada de um player de fora dos partidos mais tradicionais e a ideia de um líder forte e autoritário que desafia alguns valores desse jogo, como a liberdade de expressão.”Quanto mais polarizado for o contexto, maior a possibilidade de surgir partidos políticos anti-sistema”, explica.

O Brasil tem hoje dois pólos políticos muito distantes. De um lado, o candidato de extrema-direita do PSL, Jair Bolsonaro, “que ficou conhecido por usar palavras de ordem”. E, do outro Fernando Haddad, do PT, que leva o nome de um “partido presente nas últimas eleições, mas que falhou na economia”: “o impacto disso é que valores conhecidos de liberdade de expressão e de convivência coletiva em uma democracia começa, aos poucos, a ser substituído por outros valores, como o ódio, a violência e formas irracionais de expressão”, analisa Grin.

“O que temos que focar agora é como garantir o funcionamento da democracia”, enfatiza Grin. “As instituições políticas são conquistas civilizatórias e elementos organizadores na sociedade. Vai existir um esforço muito grande independente do vencedor dessa disputa”, conclui.



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