Doenças de Transmissão Hídrica (DTHA), como o próprio nome sugere, são aquelas em que a água é o principal veículo de transmissão. De acordo com o Ministério da Saúde (MS), existem mais de 250 tipos de DTHA no mundo, entre as mais comuns no Brasil estão a hepatite infecciosa (Hepatite A e E), cólera, leptospirose, amebíase e doenças gastrintestinais.
Além das vidas perdidas e todos os prejuízos materiais, as chuvas que atingiram fortemente Alagoas desde a segunda metade do mês de maio, causando enchentes e alagamentos em várias cidades, trouxeram mais essa preocupação: a contaminação por essas doenças.
Ainda segundo o MS, é considerado surto de DTHA quando duas ou mais pessoas apresentam doença ou sintomas semelhantes após ingerirem alimentos e/ou água de um mesmo local. No casos de doenças mais graves, como a cólera, com a confirmação de apenas um caso já é considerado surto.
Esse tipo de doença é considerado um problema na saúde pública e está relacionado a outros fatores como o abastecimento de água tratada, saneamento básico, descarte inadequado de lixo e dejetos, alta densidade populacional e problemas na infraestrutura.
Aumento de casos em AL
De acordo com dados da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau/AL), o número de casos de Doença Diarreica Aguda (DDA) registrados em Alagoas em 2021, durante a Semana Epidemiológica (SE) 01 e SE 26, foram 31.142. Já em 2022, este número saltou para 41.688 casos no mesmo período.
Dos registros de DDA neste ano, somente no período das chuvas, entre a SE 18 e SE 26, foram confirmados 17.040 casos, o que representa 40,88% do total.
Já a Leptospirose, doença considerada mais grave pelos infectologistas, teve um aumento de 56,25% dos casos, com 32 em 2021 e 50 em 2022, dos quais 29 foram registrados no período das chuvas.
A secretaria informa que formula um plano de contingência para este período de chuvas e enchentes, que está em fase de conclusão da parte da assistência à saúde.
Leptospirose
O infectologista Fernando Maia explica que a principal doença transmitida através da água no contexto atual das chuvas que atingem o estado é a leptospirose, que se contrai por contato direto com a água da enchente, da inundação e também com a lama úmida que fica após a após a inundação, após a enchente.
A leptospirose é transmitida através do contato prolongado com a água contaminada, pois a doença é capaz de atravessar a barreira da pele, especialmente se ela apresentar lesões, destaca a médica infectologista Mardjane Lemos.
“Não é uma transmissão que ocorre no contato raro, mas caso a pessoa fique durante vários minutos ou horas em contato com a água que contém leptospirose eliminada pela urina de animais, não só de roedores, mas de de cachorros, de animais maiores, animais silvestres, pode haver infecção”, exemplifica a especialista.
Doenças gastrintestinais também são comuns nesse período, como a salmonela, a diarreia bacteriana, que pode ser transmitida pelo consumo da água, alimentos ou fezes contaminadas por uma bactéria da família Shigella, e a diarreia viral, causada por vírus, como o rotavírus.
Sintomas
Em mais de 90% dos pacientes infectados pela leptospirose os sintomas mais comuns são febre, dor no corpo e dor na cabeça, que se apresentam de forma leve.
No entanto, Fernando Maia alerta que algumas pessoas podem ter a forma grave da doença que, além dos sintomas citados, pode ter icterícia, que é quando a pele e os olhos ficam amarelos e insuficiência renal. Outra complicação da doença, que pode levar a pessoa à morte, é o sangramento pulmonar ou sangramento digestivo.
A médica infectologista reforça que é importante chamar atenção para as pessoas que tiveram contato prolongado com água das enchentes, para que procurem atendimento médico ao primeiro sinal de febre. No caso das doenças gastrintestinais, é preciso atenção para sintomas como vômito, diarreias, e dor abdominal.

Além disso, Mardjane lembra que, como muitas pessoas perdem suas casas e precisam ficar abrigadas em escolas ou outros locais cedidos pelas prefeituras, há o risco de aumento da transmissão de doenças respiratórias, por isso é preciso estar atento aos sintomas gripais, como tosse, congestão, coriza e febre.
Prevenção
O médico especialista ressalta que a melhor forma de prevenção em relação à leptospirose é não entrar em contato com água ou lama contaminadas, mas em algumas situações, como a das enchentes, não é possível evitá-lo.
“Nesses casos, assim que for possível sair da água ou do contato com a lama, lavar a pele com água limpa e sabão, não consumir água que esteja contaminada com a água da enchente e qualquer marisco ou peixe ou fruto do mar deve ser muito bem cozido antes de ser consumido”, explica.
A infectologista Mardjane Lemos aconselha o uso de alguns equipamentos de proteção para a prevenção da leptospirose, como uso de botas, de calças e camisas impermeáveis e de luvas. Outra alternativa para a população é utilizar sacolas plásticas, desde que não possuam nenhum furo ou rasgo que comprometam sua integridade.
“O ideal proteger as pernas, que têm mais risco de contato com a água, porém no cenário que nós vimos, de pessoas entrarem na água até a cintura, é muito difícil haver uma forma de proteção, então o que pode ser feito de fato é procurar assistência médica o mais rápido possível”, conta Mardjane.
Em relação às doenças gastrointestinais, que são transmitidas oralmente, é preciso reforçar o cuidado com os alimentos e usar hipoclorito, principalmente na limpeza das casas atingidas pelas enchentes.
“As secretarias de saúde devem orientar a população a usar hipoclorito para se proteger e para limpar suas casas e, dessa forma, eliminar a leptospirose que pode estar nos resíduos deixados pela água”, recomenda.
Tratamento
O tratamento da leptospirose deve ser feito o mais rápido possível, com o uso de antibióticos: “É muito importante que qualquer pessoa que teve contato com a água da enchente ou que pisou na lama e apresentar febre, dor no corpo e dor de cabeça, nos próximos vinte e oito dias após o contato, procure o médico e informe que teve contato com a água da enchente para que se possa pensar em leptospirose e iniciar o tratamento”, aconselha o infectologista.
Nos casos das doenças gastrointestinais, a grande maioria é tratada com hidratação, mas alguns casos também precisam do uso de antibióticos.
A Sesau recomenda que a população que estiver infectada com DTH procure o Hospital Escola Dr. Helvio Auto para atendimento, principalmente para os casos suspeitos de leptospirose.
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