A designer Danieli Massi, de São Paulo, há um ano deu uma entrevista para o 6 Minutos contando que deixou uma dieta bem regrada, com arroz, feijão, salada e alguma proteína, para enfiar o pé na jaca. Com o isolamento social, passou a assar bolos e fazer outras guloseimas quase todos os dias.
E não foi só ela. No ano passado, as vendas de Nutella aumentaram 312% entre a primeira semana de março (antes da pandemia de coronavírus) e a primeira semana de abril (já durante o isolamento social), segundo a empresa Horus. No mesmo período, outros ícones da gastronomia calórica também tiveram alta nas vendas, como o leite condensado (55%) e o sorvete (56%).
Mas a farra acabou neste ano. Comparando o primeiro trimestre de 2021 com o mesmo período de 2021, os itens de indulgência (como leite condensado) apresentaram queda no consumo, segundo a Horus. Os itens que mais tiveram queda de vendas foram o sorvete e o achocolatado. Antes, 2% dos compradores levavam sorvete para casa. Esse índice caiu para 1,6%. O achocolatado, que era escolha de 5,4%, agora entra no carrinho de compras de 4,9%.
Danieli, por exemplo, deixou a onda comilona para trás assim que viu que a pandemia ia durar bem mais do que ela esperava. “Comecei a me preocupar com a minha saúde e à da minha família. Então, passamos a nos preocupar mais com a qualidade nutricional do que comemos. E, ao mesmo tempo, descobri que sou intolerante à lactose. Então passei a evitar açúcar, comer mais comida vegana, ovos orgânicos e estamos até plantando alface e almeirão na varanda.”
Assim como a designer, muita gente resolveu mudar de hábitos quando viu que não cabia mais no jeans pré-pandemia. E nessa virada, subiram as vendas de produtos diet, light ou sem açúcar.
Os alimentos de ingestão controlada de açúcar, por exemplo, tiveram alta nas importações de 40% no primeiro trimestre de 2021, na comparação com os mesmos meses de 2020, segundo da Abiad (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres). No mesmo período, a importação de adoçantes (a maior parte da indústria importa adoçantes e ingredientes edulcorantes) subiu 35,9%.
“Os produtos diet e de ingestão controlada de açúcar, por serem muitas vezes mais caros, sofrem muito com a retração da economia. Então, quando terminou o pagamento do auxílio emergencial, tivemos uma queda”, conta Gislene Cardozo, diretora executiva da Abiad.
Mesmo assim, segundo ela, este ano houve uma reversão dos números e várias categorias passaram a ter alta nas vendas. “Existe realmente uma tendência de as pessoas quererem voltar à forma anterior à pandemia, até por questões de saúde. E trocar o açúcar pelo adoçante é uma opção segura”, diz ela.
Nos consultórios, essa mudança de atitude também pode ser percebida. “Este ano, vi um crescimento de cerca de 90% nas consultas de pacientes querendo emagrecer”, diz Gabriella Azzari Schettini, especialista em endocrinologia e metabologia.
Até nas docerias a coisa mudou. “Eu tinha só um doce sem açúcar, que era vendido aos pedaços, aqui no balcão. Mas a procura aumentou tanto que agora temos pelos menos cinco novas opções sem açúcar e veganas, para entrega e até para festa”, conta Regina Lúcia Cirino, dona da Fioca, confeitaria no bairro de Santa Cecília, em São Paulo.
As academias também refletiram essa mudança. “Tive 50% de aumento nas matrículas nas últimas semanas”, diz Gabriela Olive, dona de uma franquia da rede Pure Pilates. “As pessoas vêm pelo amor ou pela dor: estão vendo que existe uma necessidade do corpo de se mexer. Não dá para ficar parado. Começa a doer tudo”, afirma ela.
Os vacinados, segundo ela, foram os primeiros a querer voltar para o pilates, logo após o início da imunização. Gabriela notou que os alunos mais velhos, que já haviam recebido a vacina, começaram a voltar com força nesses primeiros meses do ano.
A fabricação de bebidas não alcoólicas, dietéticas ou de baixa calorias teve crescimento de 17,3% em março na comparação com março de 2020, segundo a associação do setor. Nessa onda, a Coca-Cola resolveu lançar uma nova receita da Coca-Cola Sem Açúcar. A ideia é aproximar cada vez mais a bebida ao sabor do refrigerante original.
Mas para emagrecer não adianta apenas trocar o refrigerante com açúcar pelo diet, segundo a endocrinologista Gabriella Schettini. “Os alimentos industrializados – e os refrigerantes são um deles – aumentam a inflamação corporal. Nosso corpo produz substâncias que, na pessoa obesa, se tornam inflamatórias. E os industrializados pioram essa inflamação”, explica a médica.
Ela diz que é louvável tirar o açúcar da dieta. Mas o importante é mudar de estilo de vida: cozinhar mais, comer mais natural, se mexer mais. “Muitas vezes, o alimento diet é até mais calórico que o normal. Para deixá-lo palatável, muitas vezes se acrescentam outros ingredientes que são tão maléficos quanto.”