Pelas estimativas da IFI, a dívida pública bruta chegará a 100,3% do PIB em 2022 e o governo não vai registrar superavit primário até 2030, considerando o cenário base. “As contas públicas vão continuar negativas por um bom tempo, até porque o PIB ainda não vai recuperar toda a perda dessa recessão tão cedo e isso empurra o deficit primário para cima e a dívida, também”, explica Pellegrini.
Mas, o que tem evitado um quadro ainda pior do que o atual da dívida pública é a Selic no menor patamar da história, pois 50,8% da dívida bruta está indexada à taxa básica. “O lado positivo desse cenário são os juros baixos, pois isto evita que o crescimento da dívida pública seja mais acelerado, reduzindo o risco de insolvência”, destaca Raquel Sá, economista da XP Investimentos. “O Brasil tem uma janela de oportunidade de até dois anos para evitar uma piora no quadro fiscal. Se isso ocorrer, os riscos vão aumentar e a Selic volta a subir”, alerta.
Álvaro Frasson, economista do BTG Pactual, lembra que o aumento da desconfiança no governo não é de hoje e está associado à perda do grau de investimento do país, em 2015, e tem feito estrangeiros fugirem da dívida brasileira. “O fim do investment grade fez a participação de não residentes, que chegou ao pico de 22% dos títulos da dívida pública no mercado doméstico despencar mais da metade”, destaca. Segundo dados do Tesouro, em junho, a fatia de estrangeiros na dívida interna era de 9,09%.
Aumento de riscos
O Banco Central voltou a chamar a atenção do mercado para o aumento dos riscos fiscais na última ata do Comitê de Política Monetária (Copom) e condicionou um novo corte na taxa básica da economia (Selic) à sinalização de manutenção do regime fiscal, ou seja, do teto de gastos, que está sob ameaça em 2021. Sem essa âncora fiscal no ano que vem, as chances de a dívida pública explodir aumentam, segundo analistas.
O cabo de guerra pelos recursos do Orçamento do ano que vem , que precisa ser enviado ao Congresso até o fim do mês, está armado. E, para piorar, a crise no Ministério da Economia escancarou o conflito entre o controle fiscal e a vontade do presidente Jair Bolsonaro gastar mais para pavimentar sua reeleição.
A economista Selene Peres Nunes, uma das autoras da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), faz um alerta para os riscos do aumento de despesas no ano que vem com uma dívida pública tão elevada. Ela reconhece que, neste ano, as ações contra a pandemia são justificáveis, mas é preciso tomar cuidado em 2021. “Não dá para fazer um Orçamento imaginando programas transitórios como permanentes. Não existe capacidade fiscal para isso”, afirma. De acordo com ela, o governo deveria aproveitar os juros baixos para fazer um ajuste fiscal pós-pandemia. “Não dá para imaginar que a política monetária vai sustentar qualquer nível de desequilíbrio fiscal. Isso não existe”, avalia.
“Não podemos desconsiderar que o país está quebrado e a dívida aumentou muito. Há muita renúncia fiscal e subsídios que precisam ser revistos. O governo precisa fazer uma boa proposta de ajuste fiscal, com privatizações para ajudar a aumentar a arrecadação. Não podemos ser irresponsáveis e achar que o governo absorva qualquer nível de gasto sem que isso tenha um efeito macroeconômico que poderá travar o crescimento”, avisa a subsecretária do Tesouro do estado de Goiás.
Alternativas arriscadas
Quando o governo não consegue fazer ajuste fiscal, há duas alternativas arriscadas para conter o aumento da dívida: vender reservas ou emitir moeda. Emissão é algo que o governo já vem fazendo desde a chegada do novo coronavírus ao país, destaca o diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Josué Pellegrini. Ele lembra que, de março a junho, devido ao aumento da demanda por dinheiro em espécie, principalmente, em função do auxílio emergencial de R$ 600, o BC já injetou na economia R$ 120,4 bilhões. Logo, ofertas excessivas daqui para frente podem ter um efeito inflacionário.
A segunda opção, para Pellegrini, não é aconselhável em um momento de crise fiscal em plena recessão. Ele diz que a medida poderá ser inócua e o país corre o risco de ficar sem reservas. “Vender as reservas cambiais para financiar o rombo fiscal em um momento em que o governo não consegue estender o prazo da dívida não é aconselhável. Além de pressionar o câmbio, o governo perde uma importante ferramenta para operar no mercado quando há especulação sobre a moeda. Vender reserva para cobrir um deficit crônico, só acaba com o estoque rapidamente e não tem efeito prático’, afirma. Até dia 13, a soma de reservas era de US$ 356,5 bilhões.(RH)
Correio Braziliense