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Saúde
16/12/2018 08:05:00

De quanto sal seu organismo realmente precisa?


De quanto sal seu organismo realmente precisa?
Ilustração

No ano passado, um vídeo do chef turco Nusret Gökçe temperando sedutoramente um bife com uma pitada de sal gerou milhões de visualizações na internet e rendeu a ele o apelido de "salt bae" (namorado do sal, em tradução literal). Mas não foi apenas o gesto peculiar dele que chamou a atenção.

Somos obcecados por sal – apesar das advertências, consumimos em excesso e colocamos a saúde em risco nesse processo. Mas um contra-argumento está ganhando força, lançando dúvidas sobre décadas de pesquisas e levantando questionamentos ainda sem resposta sobre nosso tempero favorito.

O sódio, principal elemento encontrado no sal, é essencial para que o organismo mantenha o equilíbrio hídrico, o transporte de oxigênio e de nutrientes, e a condução dos impulsos nervosos.

Mas a maioria das populações tem consumido historicamente mais sal do que é recomendado, e as autoridades de saúde do mundo todo têm trabalhado para nos convencer a mudar esse hábito.

Em geral, a recomendação é de que os adultos não comam mais de 6g de sal por dia. No Reino Unido, o consumo chega perto de 8g; nos EUA, de 8,5g.

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Mas apenas um quarto da ingestão diária de sódio vem do sal que usamos para temperar a comida – o restante está escondido em outros alimentos, incluindo pão, molhos, sopas e alguns cereais.

O SAL 'OCULTO' NOS ALIMENTOS

Para aumentar a confusão, os fabricantes costumam se referir ao teor de sódio em vez da quantidade de sal, o que pode nos fazer pensar que estamos consumindo menos sal do que de fato estamos.

O sal é composto por íons de cloreto e sódio. Em 2,5g de sal, há cerca de 1g de sódio.

"As pessoas em geral não têm consciência disso e acham que sódio e sal são a mesma coisa. Ninguém te explica isso", afirma a nutricionista May Simpkin.

Pesquisas mostraram que o excesso de sal provoca pressão alta, que pode levar a derrames e doenças cardíacas, e especialistas concordam que as evidências contra o condimento são convincentes.

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O organismo retém mais líquido quando comemos sal, aumentando a pressão sanguínea. O consumo excessivo de sal durante um longo período de tempo pode causar tensão nas artérias e levar à pressão alta prolongada (hipertensão), responsável por 62% dos casos de derrames e 49% das doenças coronarianas, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Uma meta-análise de 13 estudos publicados ao longo de 35 anos identificou o aumento do risco de doenças cardiovasculares (17%) e de acidente vascular cerebral (23%) associado ao consumo de 5g extras de sal por dia.

Como você pode imaginar, cortar a ingestão de sal pode ter o efeito inverso.

Em uma análise de oito anos sobre pressão arterial de pacientes, os pesquisadores descobriram que uma redução de 1,4g por dia no consumo teria contribuído provavelmente para diminuir a pressão arterial – que colaborou por sua vez para um declínio de 42% nos derrames fatais e de 40% nas mortes relacionadas a problemas do coração.

Mas, como é comum em estudos observacionais como este, os pesquisadores também concluíram que era difícil isolar completamente os efeitos do consumo reduzido de sal de outros hábitos alimentares e estilo de vida. Aqueles que são mais conscientes a respeito da ingestão de sal costumam ter uma alimentação mais saudável em geral, praticar mais exercícios físicos, não fumar e beber menos.

Estudos randomizados de longo prazo comparando pessoas que comem muito ou pouco sal podem estabelecer uma relação de causa e efeito. Mas existem poucas pesquisas deste tipo por causa de implicações éticas e de financiamento.

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"Testes randomizados mostrando o efeito do sal sobre o corpo são quase impossíveis de realizar", diz Francesco Cappuccio, professor de medicina cardiovascular e epidemiologia da Universidade de Warwick, na Inglaterra, e autor do estudo de oito anos.

"Mas também não há testes randomizados para obesidade ou fumo, que sabemos que podem te matar."

Enquanto isso, os indícios com base em observação são abundantes.

Depois que o governo japonês lançou uma campanha para convencer as pessoas a reduzirem a ingestão de sal no fim dos anos 1960, o consumo diminuiu de 13,5g para 12g por dia. No mesmo período, foram registradas quedas na pressão arterial e uma redução de 80% nas mortes por acidente vascular cerebral.

Na Finlândia, o consumo diário de sal caiu de 12g no fim da década de 1970 para 9g em 2002, e houve uma redução de 75-80% nas mortes por derrame e doenças cardíacas no mesmo período.

DIFERENTES FATORES

Mas um fator complicador adicional é que os efeitos do consumo de sal na pressão arterial e na saúde do coração diferem de um indivíduo para outro.

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Estudos mostram que a sensibilidade ao sal varia de pessoa para pessoa, dependendo de diversos fatores – como etnia, idade, índice de massa corporal, saúde e histórico familiar de hipertensão. Algumas pesquisas indicam que indivíduos com mais sensibilidade ao sal correm mais risco de terem pressão alta associada à ingestão do condimento.

Alguns cientistas argumentam agora, no entanto, que uma dieta com baixo teor de sal também é um fator de risco para o desenvolvimento de pressão alta – assim como o alto consumo. Em outras palavras, existe uma curva em forma de J ou U com um limiar na parte inferior, onde os riscos começam a subir novamente.

Os pesquisadores argumentam que a ingestão de menos de 5,6g ou mais de 12,5g por dia está associada a consequências negativas para a saúde.

Um estudo diferente envolvendo mais de 170 mil pessoas encontrou resultados semelhantes: uma relação entre a baixa ingestão de sal, definida como inferior a 7,5g, e maior risco de doenças cardiovasculares e morte em pessoas com ou sem hipertensão, em comparação a um nível moderado de ingestão de até 12,5g por dia (entre 1,5 a 2,5 colheres de chá de sal). Essa ingestão moderada é o dobro da recomendação diária do Reino Unido.

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PONTO DE EQUILÍBRIO

O principal autor do estudo, Andrew Mente, epidemiologista nutricional da Universidade McMaster, em Ontário, no Canadá, concluiu que a redução da ingestão de sal – passando do alto consumo para moderado – diminui o risco de pressão alta, mas não oferece outros benefícios para a saúde. E aumentar a ingestão – passando do baixo consumo para moderado – pode ajudar também.

"A descoberta de um ponto ideal intermediário é consistente com o que você esperaria de qualquer nutriente essencial. Em níveis altos você tem toxicidade e em níveis baixos você tem deficiência", diz ele.

"O nível ideal é sempre encontrado em algum lugar no meio."

Mas nem todo mundo concorda.

Cappuccio é contundente, por sua vez, ao afirmar que a diminuição da ingestão de sal reduz a pressão arterial em todas as pessoas – não apenas em quem consome em excesso.

Segundo ele, os estudos realizados nos últimos anos que mostraram descobertas contrárias são poucos, contam com participantes que já estão doentes e confiam em dados falhos – incluindo o estudo de Mente, que coletou amostras de urina em jejum dos participantes, em vez de realizar vários exames durante um período de 24 horas (para servir de comparação e avaliar a precisão dos mesmos).

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Sara Stanner, diretora de ciências da Fundação Britânica de Nutrição, concorda que é forte o indício de que a redução do consumo de sal em pessoas hipertensas diminui a pressão arterial e o risco de doenças cardíacas. E não tem muita gente consumindo níveis tão baixos quanto 3g, quantidade que algumas pesquisas consideram perigosamente baixas.

Seria difícil chegar a esse patamar, explica Stanner, devido aos níveis de sal que encontramos nos alimentos que compramos.

"Muito do sal que consumimos está presente nos alimentos que fazem parte do nosso dia a dia", diz ela.

"É por isso que a reformulação em toda a cadeia de alimentos é a abordagem mais promissora para reduzir o consumo de sal em nível nacional, como tem sido no caso do Reino Unido."

Os especialistas também divergem sobre a hipótese de a alta ingestão de sal poder ser compensada por uma dieta saudável e exercícios. Alguns, incluindo Stanner, dizem que uma alimentação rica em potássio, encontrado em frutas, legumes, nozes e laticínios, pode ajudar a compensar os efeitos adversos do sal sobre a pressão arterial.

Para Ceu Mateus, professor de economia da saúde na Universidade de Lancaster, na Inglaterra, a prioridade deve ser tomar consciência do sal escondido nos alimentos, em vez de tentar evitá-lo completamente.

"Os problemas que temos em relação ao excesso de sal podem ser semelhantes àqueles relacionados ao baixo consumo, mas ainda precisamos fazer mais pesquisas para entender o que de fato acontece. Enquanto isso, uma pessoa saudável será capaz de regular pequenas quantidades", diz Mateus.

"Devemos ter consciência de que sal em excesso é muito ruim, mas não devemos eliminá-lo completamente da dieta."

Apesar de estudos recentes sugerirem ameaças potenciais de uma dieta pobre em sal e diferenças individuais na sensibilidade ao condimento, a conclusão mais consagrada das pesquisas existentes é que sal em excesso definitivamente aumenta a pressão arterial.

Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Future.

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‘Morri por 5 minutos’: os jovens que sofrem infartos fulminantes aos 20 e poucos anos

Males não diagnosticados provocam mortes precoces; desafio é identificar pessoas com problemas congênitos e tentar prevenir paradas cardíacas, diz médico.

Por Louis Lee Ray e William Njobvu - Do programa BBC Victoria Derbyshire
 

Lora D'Alesio se lembra do momento em que seus lábios começaram a ficar azuis e sua respiração cessou.

"Meu coração tinha parado", conta a britânica ao programa Victoria Derbyshire, da BBC. "Eu estava sem vida, fiquei morta por cinco minutos. Pelo que sei, os médicos trabalhavam sem parar para me trazer de volta à vida."

Lora havia sofrido uma parada cardíaca, algo bastante inesperado considerando que ela tinha apenas 24 anos de idade.

Só no Reino Unido, estima-se que 80 mil jovens britânicos tenham problemas cardíacos não diagnosticados, segundo a Fundação do Coração do país. Se não tratados, esses problemas podem ser fatais. No Brasil, segundo o Datasus, 596 pessoas de 20 a 29 anos morreram de infarto agudo do miocárdio em 2016.

No caso de Lora, que trabalha como enfermeira veterinária, o infarto aconteceu três anos atrás. Ela perdeu a consciência ao chegar em casa do trabalho. Ela ainda não sabia, mas tem um problema cárdiaco chamado síndrome do QT longo – um mal hereditário que afeta o ritmo do coração, fazendo com que este leve mais tempo para se recarregar a cada batida.

"Eu disse (à minha colega de casa) que me sentia zonza e, quando ela se virou para mim, eu já estava no chão. Ela achou que eu estava brincando."

Lora foi salva pela equipe de emergência e levada ao hospital, onde passou três dias em coma.

Quando acordou, chorava sem parar. "Eu estava tão confusa", lembra. "Você pensa que só as pessoas mais velhas caem mortas por conta de problemas cardíacos, mas não as jovens. Na minha idade, eu pensava, 'não, de jeito nenhum'. Imagine só, eu tinha só 24 anos."

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PREVENÇÃO

O tema ganhou destaque no Reino Unido porque uma nova pesquisa da Fundação do Coração calculou que 83 mil pessoas de 15 a 25 anos podem ser portadoras de um gene defeituoso que as deixa sob um risco alto de desenvolver males cardíacos ou morrer subitamente, ainda na juventude.

Muitas dessas pessoas nunca vão ter qualquer problema no coração, mas, como esse problema é subdiagnosticado, outras possivelmente só descobrirão serem portadoras quando sofrerem uma parada cardíaca.

Elijah Behr, médico-sênior da Universidade de Londres, diz que, embora males cardíacos hereditários sejam raros, "se somarmos todos eles, chegamos a um número significativo (de pacientes)".

"Tanto que 1.500 jovens morrem anualmente no Reino Unido desses males hereditários. E o desafio é identificar essas pessoas e tentar prevenir essas mortes."

Behr pesquisa formas de determinar as causas genéticas de paradas cardíacas, na expectativa de avançar na prevenção de mortes súbitas.

Alguns médicos defendem que jovens passem por exames obrigatórios que busquem problemas cardíacos ocultos; outros, porém, acham que antes precisamos de mais pesquisas antes de colocar ideias do tipo em prática.

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JOGANDO FUTEBOL

Em 2016, Barry e Gill Wilkinson perderam o filho Dan, de 24 anos, que morreu subitamente durante uma partida de futebol. O garoto levava uma vida saudável e ativa – chegou até mesmo a jogar na equipe juvenil de um time britânico.

"Ele tinha um problema cardíaco sério, mas não havia nada que indicasse a ele, ou a nós, de que havia algo errado", conta seu pai. "Vinte quatro horas antes (de morrer), ele havia falado conosco pelo Facetime, e estava normal."

Dan tinha uma cardiomiopatia arritmogênica do ventrículo direito (ARVC), que enfraquece a parede do coração e pode causar uma parada cardíaca. Ele perdeu a consciência enquanto jogava, e seus colegas de equipe telefonaram para Barry. Mas, quando o pai chegou ao local, Dan já estava morto.

"É algo que te deixa em choque", conta Gill, mãe de Dan.

Barry seca as lágrimas enquanto o casal lembra como queria ter podido dizer ao filho "eu te amo" uma última vez. Hoje, eles comandam uma ONG que distribui desfibriladores para serem usados em campos de futebol amador. Um deles chegou a ser usado para salvar a vida de um menino de 14 anos que teve uma parada cardíaca enquanto jogava.

'SORTE DE ESTAR VIVA'

A jovem sobrevivente Lora D'Alesio agora dedica parte de seu tempo a compartilhar sua história.

"Quero muito que os jovens tenham consciência de que isso pode acontecer com eles. Doenças cardíacas não discriminam ninguém", diz.

Ela hoje tem um marcapasso e carrega um desfibrilador, que eventualmente pode ser usado para salvar sua vida. Mas, por enquanto, ela diz tentar aproveitar cada dia.

"Aceito os convites mais aleatórios que meus amigos fazem, porque nunca se sabe quando (uma parada cardíaca) pode acontecer novamente e me matar. Quero viver a vida ao máximo. Tenho sorte de estar viva."

https://www.metrojornal.com.br/bbc-mundo 

 



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