O trabalho infantil atingia 1,8 milhão de crianças e adolescentes no Brasil em 2016. Segundo dados divulgados nesta quarta-feira (29) pelo IBGE, havia, no ano passado, 30 mil crianças entre 5 e 9 anos de idade trabalhando e outras 160 mil entre 10 a 13 anos. Nesse grupo de 5 a 13 anos, 74% não receberam nenhum tipo de renda monetária decorrente do trabalho, sinal de que o dinheiro pode não ter sido a principal causa do ingresso precoce no mundo das obrigações.
As
conclusões, que estão na Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios Contínua), desenham um cenário mais grave no Norte, a região com
maior proporção de trabalho infantil a ser erradicado. Lá, o nível de ocupação
das crianças entre 5 e 13 anos de idade chega a 1,5%.
No
Sudeste a taxa de ocupação desta faixa etária fica em torno 0,3%. A maior parte
são meninos (65,3%), pretos ou pardos (64,1%) e chegam a trabalhar em média
25,3 horas por semana. Segundo a legislação brasileira, a idade mínima para a
entrada no mercado e trabalho é de 16 anos. Antes disso, com 14 ou 15 anos é
permitido o trabalho apenas na condição de aprendiz.
Com
16 ou 17, o adolescente pode trabalhar desde que esteja registrado e não seja
exposto a abusos físicos, psicológicos e sexuais. A lei também não permite que
a pessoa com menos de 18 anos exerça atividades usando equipamentos perigosos
ou em meio insalubre. Em 2016 havia 40,1 milhões de crianças e adolescentes
entre 5 e 17 anos no país. Ou seja, 4,5% realizavam algum tipo de trabalho no
período.
Os
dados do IBGE confirmam uma preocupação de especialistas em relação à evasão
escolar provocada pela entrada prematura no mercado de trabalho. Enquanto a
taxa de escolarização das crianças ocupadas entre 5 e 13 anos atinge 98,4%
-pouco abaixo da taxa registrada entre as crianças não ocupadas-, no grupo dos
ocupados com 16 e 17 anos de idade, essa taxa de escolarização cai para 74,9%.
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AGRICULTURA
Entre
os pequenos até 13 anos, o principal ramo é a agricultura, atividade que,
segundo especialistas, abrange a realização de trabalhos com a supervisão dos
pais, na transmissão de técnicas e tradições. O IBGE alerta, no entanto, que a
situação de trabalho leve usado como parte do processo de educação e
socialização das crianças não pode ser confundida com os casos em que as
crianças são obrigadas a trabalhar regularmente, em jornadas contínuas, em
troca de remuneração ou mesmo para ajudar suas famílias, com prejuízo para o
desenvolvimento educacional.
O
fato de a criança trabalhar em casa ou com a família, portanto, não
descaracteriza o trabalho infantil. Alguns exemplos dessas atividades são o
trabalho na lavoura familiar, serviços domésticos e cuidados com irmãos mais
novos, consumindo o tempo para estudar e brincar. Os maiores, de 14 a 17 anos,
aparecem com mais frequência em atividades de comércio e reparação.
"Nenhuma
criança pode trabalhar com menos de 14 anos de idade. Com 14 e 15, só pode
mediante o processo de aprendizado. Com 16 e 17, desde que não tenha condições
como trabalho noturno, uso de químicos, objetos cortantes etc.
Independentemente de ser algo cultural, precisa ser abolido", diz Cimar
Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE.
Dentre
os jovens de 14 ou 15 anos ocupados 89,5% não tinham carteira de trabalho
assinada, ou seja, estavam irregulares. Entre os de 16 e 17 anos, 70,8% estavam
sem registro, conforme os dados do levantamento.
A
pesquisa não tem histórico para comparações porque esta é a primeira vez que a
Pnad Contínua divulga o módulo de trabalho infantil, depois que o IBGE promoveu
mudanças na forma de captação das informações. Mas especialistas estimam que a
divulgação desta quarta-feira deve refletir um agravamento do problema.
"Tivemos
nos últimos anos uma redução dos orçamentos em áreas estratégicas para a
erradicação do trabalho infantil, como saúde, educação e cultura. Aumento do
desemprego e da desigualdade também se refletem no trabalho infantil",
afirma Elisiane Santos, procuradora do trabalho e coordenadora do Fórum
Paulista de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil.
Segundo
ela, historicamente, o trabalho infantil que ocorre no âmbito de cadeias
produtivas para o fornecimento de grandes empresas está entre os mais difíceis
de serem combatidos porque ficam escondidos em "oficinas de fundo de
quintal".
Santos
ressalta a urgência da luta contra o trabalho de crianças com comércio
ambulante nas ruas, uma atividade que, segundo suas previsões, deve ter
aumentado durante a crise econômica. Formas de abuso como prostituição
infantil, exploração mais difícil de ser captada na pesquisa, também são
lembradas pela procuradora como urgências no combate.
Mudanças
radicais trazidas pela reforma trabalhista ou a lei de terceirização, segundo a
procuradora, podem aprofundar a exploração de crianças. "Pode-se afirmar
que a precarização do trabalho adulto faz com que as crianças e adolescentes
que estão nessas famílias fiquem mais vulneráveis ao trabalho infantil e a uma
inserção precoce e de forma desqualificada no trabalho", afirma Santos.
Com informações da Folhapress.