Quando assistimos aos conflitos na Síria, onde centenas
de milhares de refugiados saem mar adentro em busca de viver em outro país,
logo tendemos a buscar culpados. Da mesma maneira quando assistimos o uso de
armas químicas, que matou centenas, ou explosões no país. Mas a gente, nesta
luta para descobrir se há mocinhos e bandidos, muitas vezes nos deparamos com
um cenário ainda mais desalentador. Especialmente quando descobrimos que neste
conflito não há lado bom ou mau. Todos são maus. Leia artigo publicado no site
The Intercept em artigo de Mehdi Hasan.
QUAL É A SUA OPINIÃO sobre o conflito sírio? A resposta a essa pergunta talvez
seja a melhor maneira de descobrir a posição política de alguém atualmente.
Você é de esquerda ou libertário e fica indignado com os bombardeios
americanos, invocando a soberania da Síria e a legislação internacional? Ou
você é conservador - ou um liberal mais tradicional - e apoia uma ação militar
para derrubar o ditador sírio - ou ao menos para proteger seu povo das bombas
de barril e armas químicas de Assad?
Você é um muçulmano xiita que defende Assad contra os rebeldes salafistas
genocidas respaldados pela Arábia Saudita sunita? Ou um muçulmano sunita que
defende os rebeldes contra um regime alauíta genocida apoiado pelo Irã xiita?
Cada um dos dois lados têm uma narrativa que o favorece - o seu próprio
conjunto de "fatos alternativos". Ambos se revoltam de maneira
seletiva: na semana passada, os partidários de Assad condenaram o massacre de
mais de 120 pessoas por um homem-bomba. Na semana anterior, os inimigos do
presidente sírio repudiaram um cruel ataque com gás que matou pelo menos 74
pessoas em uma cidade em poder dos rebeldes.
Os cadáveres sírios se tornaram fantoches políticos, usados com cinismo para
sustentar esta ou aquela posição no conflito. Há mentiras por toda parte. Os
defensores de Assad - nos dois extremos do espectro político - afirmam que ele
é um bastião do secularismo contra o Estado Islâmico, mas esquecem que esse
ditador supostamente secular ajudou a enviar "jihadistas" ao Iraque
para atacar as tropas dos EUA e civis iraquianos menos de 10 anos atrás. Eles
também preferem ignorar que a grande maioria das mortes de civis na Síria foi
causada pelo regime de Assad, e não pelo EI ou pelos rebeldes.
Já os críticos de Assad - liberais e conservadores - costumam minimizar os bem
documentados crimes de guerra e outras atrocidades cometidas pelos rebeldes
apoiados pelos EUA, sem contar a predominância da Al Qaeda e outros grupos
terroristas na oposição síria. Muitos afirmam - erroneamente - que o Ocidente
"ficou parado" e "não fez nada" para apoiar essa oposição.
Porém, de acordo com o jornal "The Washington Post", a CIA
"gasta cerca de 100 mil dólares anuais por cada rebelde sírio" que
passou pelo programa de treinamento da agência. O armamento e financiamento
fornecido aos rebeldes - "seculares" e "islamistas" -
contribuiu para exacerbar este terrível conflito, tornando praticamente
impossível uma solução diplomática.
Ao renunciar ao cargo de enviado especial da ONU à Síria, em agosto de 2012,
Kofi Annan culpou ambos os lados pela escalada da violência no país. Sua
declaração desapareceu completamente da memória histórica recente sobre a
Síria. O mesmo aconteceu com o discurso de Joe Biden em Harvard, em 2014, no
qual ele descreveu como os aliados dos EUA na região "estavam tão
determinados a derrubar Assad e desencadear uma guerra indireta entre sunitas e
xiitas (.) que forneceram centenas de milhões de dólares e dezenas de milhares
de toneladas de armas para qualquer um que estivesse disposto a lutar contra
Assad". <> Conexão Jornalismo //