Dos 23 anos de Erilton de
Araújo Godoi, cinco foram passados na cadeia. Tudo por causa do crack, droga
que o acompanhou durante uma década. “A gente se torna doente. Se torna até
escravo. Aí, não quer saber de mais nada”, diz o jovem. Há três meses, ele está
abstinente. Por vontade própria, pediu para ser abrigado em uma comunidade
terapêutica. “Foi só quando cheguei bem ao fundo do poço. Eu já estava dormindo
na rua. Vi um amigo meu ser morto ao meu lado.” A força de vontade e a certeza
de que vai conseguir deixar o vício para trás são grandes, mas ele sabe que o
desafio também não é pequeno. Esta não é a primeira vez que Erilton tenta ficar
longe do crack.
Segundo o Instituto Nacional de Abuso de Drogas dos
Estados Unidos, a taxa de relapso de dependentes químicos varia, no geral, de
40% a 60%. Por causa da natureza aditiva da cocaína, da qual a pedra é um
subproduto, as estatísticas internacionais indicam que a reincidência, nesses
casos, é maior. No Brasil, onde existem 370 mil usuários de cocaína fumada, de
acordo com a Fundação Oswaldo Cruz, um grupo de pesquisadores investigou o
índice de recaída entre um grupo sobre o qual ainda há poucos dados: os
adolescentes. Em um estudo publicado na revista Journal of Addictive Diseases,
eles reportam que, um mês depois da alta, 65,9% dos pacientes voltaram a
consumir o crack. Passados três meses desde o fim do tratamento, o percentual
era ainda maior: 86,4%.
O estudo foi conduzido com 89 jovens de 12 a 17 anos de ambos os sexos,
internos nas alas de adolescentes de dois hospitais psiquiátricos públicos de
Porto Alegre. Essas instituições não cuidam apenas de usuários de drogas, e a
abordagem de tratamento baseou-se na Terapia Motivacional de Prevenção de
Relapso. No início da pesquisa, eles foram entrevistados pelo principal autor
do artigo, o psiquiatra da infância e adolescência Ronaldo Lopes Rosa, membro
colaborador do Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas (CPAD). A partir de um
questionário de 27 perguntas, foi possível identificar, entre outras coisas, o
nível de adição dos jovens. Os pacientes foram acompanhados pelos pesquisadores
um e três meses depois da alta.
A psiquiatra Helena Moura, especialista em dependência química e coautora do
artigo, explica que o estudo procurou entender os motivos por trás dos altos
índices de relapso, que foram iguais, independentemente da classe social dos
jovens. Para ela, um deles é o curto prazo de tratamento. “Em média, foram 20
dias de internação. É muito pouco”, observa. Outro fator bastante associado à
recaída, como esperavam os pesquisadores, teve a ver com o grau de dependência.
Quanto mais tempo de adição, maior o risco de o adolescente reincidir. Segundo
a médica, isso evidencia a necessidade de se pensar estratégias de prevenção do
relapso específicas para essa população.
Cérebro remodelando