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tom
chatfield
Quase todas as ruas em
quase todas as grandes cidades do mundo estão lotadas de pessoas usando seus
celulares, alheias à presença dos outros. É um comportamento que não existia
poucas décadas atrás.
Acabamos nos acostumando ao fato de que
compartilhar o mesmo espaço físico não significa mais compartilhar da mesma
experiência. Onde quer que estejamos, levamos conosco opções muito mais
interessantes do que o lugar e o momento que vivemos: amigos, familiares,
notícias, imagens, modismos, trabalho e lazer cabem na palma da mão.
Mas como questiona o fotógrafo
Josh Pulman, autor do ensaio Somewhere Else(em
algum outro lugar, em tradução livre), cujas fotos são exibidas com esta
reportagem: "Se duas pessoas estão andando juntas, cada uma prestando
atenção a seu telefone, elas estão realmente juntas?"
Faz parte do ser humano ter uma profunda vontade de
se conectar. Mas será que esse dom pode nos prejudicar em algum momento? É
possível ficar "conectado em excesso"? E o que isso significa para
nosso futuro?
Desde sua invenção, o
telefone tem sido um motor de agitação social e um foco de ansiedade
tecnológica. Imagine a cena através dos olhos do século 19, quando as primeiras
estruturas de telefonia começaram a ser instaladas: quilômetros e quilômetros
de fios pendurados nas laterais das ruas, perfurando todas as casas. As paredes
estavam sendo violadas: o santo lar, ligado a uma nova espécie de interação
humana.
"Em breve não
seremos mais do que gelatinas transparentes", lamentou um jornalista britânico
em 1897, temendo a perda da privacidade.
Mas, enquanto os
primeiros medos em relação ao telefone podem ter sido exagerados, eles também
foram um tanto proféticos. Se no fim do século 19 e durante o século 20 nossa
vontade foi de plugar todos os locais de trabalho e lazer em redes, o século 21
emerge com o desejo de uma interconexão de nossas mentes nessa trama.
E estamos começando a
sentir os efeitos disso.
Assim como seu
antepassado no século 19, o telefone celular nasceu como um símbolo de status
para as pessoas afluentes e ocupadas. Com o tempo, o luxo se tornou universal.
Passamos a entremear a disponibilidade constante no nosso conceito de espaço
público e privado, na nossa linguagem corporal e na etiqueta cotidiana.
Ficar incontactável se
tornou a exceção, algo fora deste mundo – mas também uma fonte inesgotável de
ansiedades.
E, como a história se
repete, a todo momento recebemos alertas sobre possíveis efeitos prejudiciais
da comunicação móvel.
Um desses avisos veio
com a notícia de que um homem de 31 anos foi recentemente internado para se
tratar de um "distúrbio de vício em internet", por causa de seu uso
excessivo do smartphone.
Casos como esse levantam
outras questões: com que frequência suas mãos se mexem involuntariamente com a
intenção de pegar seu celular ou de alcançar o lugar onde você normalmente o
deixa? Como você reage ao som de cada nova mensagem – ou à ausência dele?
Não são perguntas com
respostas definitivas.
Traçar o limite entre
hábito e patologia significa decidir o que queremos dizer com os termos
"normal", "saudável" e "aceitável".
E se a tecnologia excede
em algo, é justamente em mudar velhas normas rapidamente.
Passei anos tentando
avaliar nosso relacionamento com a tecnologia e ainda me vejo sendo puxado em
duas direções diferentes.
Por um lado, como disse
o filósofo Julian Baggini, "o homem pode estar mudando, mas em muitos
aspectos ele continua o mesmo". Podemos ler romances da Grécia Antiga e
compreender quando o autor fala de raiva, paixão, patriotismo e confiança, por
exemplo.
Por outro lado, as
tecnologias digitais significam que as relações com os outros e com o mundo
foram estendidas e ampliadas para um nível nunca antes experimentados.
Como argumentam
filósofos como Andy Clark e David J. Chalmers, a mente é uma colaboração entre
o cérebro na cabeça e equipamentos como o telefone nas mãos. O "eu" é
um sistema complexo que envolve as duas coisas.
É esse impacto
exponencial de tecnologia da informação que representa o maior problema para
tudo o que julgávamos ser normal, equilibrado, autoconhecido e auto-regulado.
Vivemos em uma era em
que nossas patologias são aquelas do excesso.
Será que precisamos de uma
desintoxicação? Bem, isso não necessariamente funciona, nem para a saúde física
nem para a saúde mental.
O melhor é encarar os fatos e começar
a aproveitar a intimidade de um relacionamento que só tende a ficar cada vez
mais próximo: aquele entre os cérebros de cada indivíduo e as redes de
automação que estão sendo tecidas entre eles.
Afinal, estamos despejando nossas
horas e minutos não apenas em uma tela, mas sim na mais complexa e abrangente
rede de mentes humanas que já existiu, cada uma mais capaz do que o computador
mais rápido.
Se fico fascinado, impressionado, superenvolvido,
distraído e deliciado com tanta frequência, é por que há outras pessoas lá fora
peneirando e refratando esse mundo de informações de volta para mim.
Só conseguirei mudar isso se puder
encontrar outras pessoas com quem posso formar novos hábitos e novos modelos de
funcionar.