O aumento contínuo da temperatura no planeta tem consequências diretas sobre o funcionamento do cérebro humano, agravando diversas condições neurológicas.
Uma evidência dessa relação foi observada na história de Jake, uma criança que, aos cinco meses, enfrentou sua primeira crise tônico-clônica, marcada por enrijecimento corporal e movimentos convulsivos rápidos.
Sua mãe, Stephanie Smith, relata que o episódio ocorreu em um dia extremamente quente, resultando em hipertermia, que eles inicialmente consideraram assustadora, mas que, na verdade, não foi um caso isolado.
Desde então, as crises de Jake tornaram-se frequentes sempre que o clima ficava quente, levando a família a intensas tentativas de resfriá-lo durante os verões úmidos, numa luta constante contra as convulsões.
Aos 18 meses, após análises genéticas, diagnosticaram Jake com a Síndrome de Dravet, uma enfermidade neurológica que combina epilepsia e afeta cerca de 15 mil crianças.
Essa condição costuma estar associada a déficits cognitivos e outras complicações, incluindo autismo, TDAH, além de dificuldades na fala, mobilidade, alimentação e sono. O calor extremo e as mudanças abruptas na temperatura podem desencadear crises convulsivas.
Aos 13 anos, Jake já enfrentou diversas convulsões provocadas por variações climáticas ao longo dos anos.
Stephanie enfatiza que ondas de calor intensificam os desafios diários de lidar com a síndrome, agravando uma condição que já é por si só devastadora.
Estudos indicam que, durante a onda de calor na Europa em 2023, aproximadamente 7% das mortes adicionais estavam relacionadas a problemas neurológicos, como afirmações de especialistas e dados de fontes confiáveis.
A Síndrome de Dravet é apenas uma entre várias doenças neurológicas que se tornam mais severas com o aumento da umidade e do calor, segundo o neurologista Sanjay Sisodiya, da University College London.
Sua pesquisa aponta que eventos climáticos extremos aumentam a incidência de condições como AVC, encefalite, esclerose múltipla, enxaqueca e outros distúrbios.
Além disso, as alterações climáticas têm efeitos visíveis no cérebro humano, como evidenciado por dados de ondas de calor em 2023 e 2022, que mostraram um incremento na mortalidade relacionada a fatores neurológicos.
Essas mudanças também influenciam o comportamento, levando a maior agressividade, irritabilidade e depressão, decorrentes do estresse térmico.
Quanto ao impacto a longo prazo, o calor eleva o risco de agravamento de doenças neurodegenerativas e prejudica a integridade da barreira hematoencefálica, facilitando a entrada de toxinas e agentes infecciosos no cérebro.
Isso é alarmante, pois aumenta a vulnerabilidade do órgão a vírus como Zika, chikungunya e dengue, que podem causar graves danos ao desenvolvimento fetal e ao sistema nervoso.
Especialistas como Tobias Suter apontam que o aumento de temperaturas prolongadas encurta o ciclo de reprodução de mosquitos vetores dessas doenças, ampliando os períodos de risco.
Além do impacto físico, ondas de calor podem alterar funções cerebrais, afetando desde a atividade elétrica até a saúde mental, incluindo risco de suicídio, ansiedade e alterações nos medicamentos neurológicos.
Cientistas ainda buscam compreender por que algumas pessoas suportam melhor o calor do que outras, considerando fatores como predisposição genética, que pode influenciar a vulnerabilidade individual às mudanças ambientais.
Essa variabilidade sugere que, com o avanço das mudanças climáticas, grupos previamente considerados menos susceptíveis podem também vir a sofrer consequências neurológicas.
Portanto, identificar quem está em maior risco e entender os mecanismos dessa vulnerabilidade são passos essenciais para o desenvolvimento de estratégias de proteção, como sistemas de alerta precoce e compensações para trabalhadores expostos a temperaturas extremas.
Como declarou o secretário-geral da ONU, António Guterres, ao confirmar que julho de 2023 foi o mês mais quente já registrado, a era do aquecimento global avançou e a crise do clima está em pleno curso, afetando também a saúde cerebral globalmente.