Ao contrário de nações como China e Coreia do Norte, o Uruguai optou por remover o Natal de seu calendário oficial há mais de 100 anos, adotando o Dia da Família como a principal data comemorativa.
Desde 1919, a legislação uruguaia não reconhece o Natal, nem o Dia de Reis, a Semana Santa ou o Dia dedicado à Virgem Maria, embora essas celebrações continuem sendo realizadas com entusiasmo no país.
No entanto, elas receberam nomes diferentes no calendário oficial: o Natal é agora denominado Dia da Família, o Dia de Reis passou a ser o Dia das Crianças, a Semana Santa é conhecida como Semana do Turismo, e o Dia da Virgem é chamado de Dia das Praias. Esta mudança faz parte de uma política de secularização que ocorreu ao longo do final do século XIX e início do século XX, buscando uma separação definitiva entre o Estado e a Igreja Católica.
O processo começou em 1861, com a transferência da administração dos cemitérios do controle religioso para o Estado, e continuou com medidas como o casamento civil obrigatório antes do religioso, a legalização do divórcio em 1907, e a retirada de crucifixos de hospitais públicos em 1906.
O movimento de secularização intensificou-se durante as décadas seguintes, culminando na Lei de 1909 que aboliu o ensino religioso nas escolas públicas. Liderado por defensores da educação laica, como José Pedro Varela, o país passou a promover uma sociedade mais laica, destacando a liberdade de culto e a separação entre Igreja e Estado.
Entre as ações que reforçaram essa tendência estão a redução do poder simbólico da Igreja e a implementação de leis que promoveram a independência institucional, como a aprovação da Constituição de 1917.
O impacto dessa transformação é considerado um dos mais avançados na América Latina, tornando o Uruguai um dos países mais seculares da região. Apesar da ausência do Natal na legislação oficial, a comemoração popular permanece forte. Nas ruas, há decorações típicas, árvores de Natal e iluminação, embora, geralmente, sem a presença de presépios religiosos em espaços públicos.
Essa celebração é mais voltada ao convívio familiar e às tradições que envolvem amigos, incluindo a participação em festas e o consumo de doces como o panetone. Segundo um estudo de 2014 do Pew Research Center, o Uruguai lidera as estatísticas de ausência de filiação religiosa na América Latina, com 37% da população sem nenhuma religião específica, sendo 24% ateus, 10% agnósticos e 3% sem religião.
A pesquisa também revela que o país possui uma proporção significativa de católicos (42%), protestantes (15%) e pessoas que se identificam com outras crenças (6%). Assim, mesmo sem o reconhecimento oficial, o Natal continua sendo uma data de celebração, marcada por tradições familiares e pelo espírito natalino, que, de alguma forma, perdura há mais de um século na cultura uruguaia.
A substituição do feriado religioso pelo Dia da Família, com o passar do tempo, parece refletir uma essência mais moderna e menos vinculada ao simbolismo religioso, representando uma mudança de perspectiva que talvez nem os próprios responsáveis pela decisão poderiam prever na época.