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Acidente
10/12/2025 11:00:00

Avanço revolucionário no combate à leucemia: uma esperança que parecia ficção científica há poucos anos

Terapia genética inovadora realiza feitos antes considerados impossíveis, salvando vidas com precisão no tratamento de cânceres sanguíneos agressivos

Avanço revolucionário no combate à leucemia: uma esperança que parecia ficção científica há poucos anos

Uma inovação terapêutica que, até recentemente, parecia saída de um enredo de ficção científica, tem demonstrado a capacidade de reverter formas severas e aparentemente irreversíveis de câncer de sangue em pacientes selecionados, segundo especialistas.

O procedimento consiste na edição preciso do DNA dos leucócitos, transformando-os em um 'medicamento vivo' que atua no combate ao tumor. A primeira pessoa a receber essa intervenção, cujo caso foi divulgado em 2022, permanece livre da doença e atualmente planeja seguir carreira na pesquisa oncológica.

Até o momento, oito crianças e dois adultos com leucemia linfoblástica aguda de células T já passaram pelo tratamento, com 64% deles atingindo remissão — ou seja, ausência de sinais de câncer após o procedimento, embora isso não indique que ele não possa retornar.

As células T desempenham o papel de defesa do organismo, buscando e destruindo ameaças, mas nesta forma de leucemia, proliferam de maneira descontrolada.

Para os participantes do estudo, tratamentos tradicionais como quimioterapia e transplante de medula óssea não tiveram efeito. Além do medicamento experimental, restava apenas oferecer cuidados paliativos nos casos mais graves.

Um processo em cinco etapas mostrando como o tratamento funciona. 1. Uma célula circular vermelha com estruturas em Y na superfície representa as células T cancerosas. 2. Um espiral de DNA com uma letra “C” destacada. 3. Uma célula circular azul com o DNA no interior, representando a edição das células T doadas. 4. Modificação adicional da célula T. 5. A célula T azul atacando a célula T vermelha cancerosa

“Eu achava que minha vida tinha acabado, que eu não ia ter a chance de crescer e fazer tudo o que qualquer criança merece”, relata Alyssa Tapley, de 16 anos, de Leicester, no Reino Unido.

Ela foi pioneira mundial a receber essa terapia no Great Ormond Street Hospital, em Londres, e hoje desfruta de uma rotina normal.

Hoje, o câncer de Alyssa não pode ser detectado, e ela realiza exames de rotina anuais. Ela conclui os exames finais do ensino médio, participa do programa de desenvolvimento juvenil Duke of Edinburgh, já planeja aulas de direção e tem planos para seu futuro.

“Tenho interesse em fazer estágio em ciências biomédicas e, quem sabe, atuar futuramente na pesquisa de câncer no sangue”, revela Alyssa.

O procedimento inovador realizado há cerca de três anos envolveu a remoção do sistema imunológico antigo de Alyssa, seguido por sua reconstrução. Durante quatro meses no hospital, ela evitou contato com o irmão para minimizar riscos de infecção.

Atualmente, seu câncer encontra-se sob controle, e ela apenas precisa passar por exames anuais. Com planos de se especializar em ciências biomédicas, ela aspira a contribuir para o avanço no tratamento de cânceres hematológicos.

O método utiliza uma tecnologia conhecida como 'edição de bases', que modifica segmentos específicos do código genético — os blocos de construção do DNA, representados pelas letras adenina (A), citosina (C), guanina (G) e timina (T). Essa técnica permite alterar exatamente uma base, reescrevendo o manual de instruções do corpo.

O objetivo é aproveitar a potencialidade natural das células T saudáveis — programadas para identificar e eliminar ameaças — e direcioná-las contra a leucemia linfoblástica de células T.

Desafios complexos foram enfrentados, como modificar as células T para que elas reconheçam as células doentes sem que o tratamento se destrua. Para isso, as células T de um doador foram inicialmente modificadas.

Na primeira fase, o mecanismo de ataque foi desligado, evitando que as células T destruíssem o próprio corpo. Depois, removeram o marcador químico CD7, presente em todas as células T, para impedir a autodestruição, além de criar uma 'camuflagem' que as tornasse invisíveis ao quimioterápico.

Na etapa final, as células T receberam instruções para atacar qualquer célula marcada com CD7, destruindo tanto as cancerosas quanto as saudáveis, mas sem se atacar umas às outras. A aplicação é feita por infusão, e caso o câncer não seja detectado após quatro semanas, o paciente recebe um transplante de medula óssea para reconstituir seu sistema imunológico.

Segundo o professor Waseem Qasim, da UCL e do Great Ormond Street, essa abordagem, que há poucos anos parecia ficção, exige desmontar quase totalmente o sistema imunológico, sendo um procedimento intenso, porém extremamente eficaz quando bem-sucedido.

Os resultados publicados na revista 'New England Journal of Medicine' envolvem os primeiros 11 pacientes tratados em Londres e no King's College Hospital. Nove deles alcançaram remissão profunda, passando por transplantes de medula e permanecendo livres da doença entre três meses e três anos.

Apesar do sucesso, o procedimento ainda apresenta riscos, como infecções durante a fase de imunossupressão. Em dois casos, as células cancerosas conseguiram esconder o marcador CD7, levando à recidiva do tumor.

Robert Chiesa, do departamento de transplantes do Great Ormond Street, expressa otimismo: “Para uma leucemia tão agressiva, esses resultados são bastante promissores e oferecem esperança a pacientes que, de outra forma, perderiam a luta.”

A hematologista Deborah Yallop, do King's College, destaca que a resposta ao tratamento foi impressionante, sobretudo na eliminação de leucemias antes consideradas incuráveis. Tania Dexter, especialista na ONG Anthony Nolan, reforça a expectativa de que esses avanços possam ampliar o acesso a tratamentos similares e salvar mais vidas no futuro.