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Saúde
09/12/2025 12:00:00

Como seus hormônios podem controlar sua mente

Como seus hormônios podem controlar sua mente

Todos gostamos de acreditar que conseguimos dominar nossas emoções e sentimentos, mas essa percepção nem sempre corresponde à realidade. Há décadas, a ciência sabe que mensageiros químicos chamados neurotransmissores exercem forte influência no cérebro. E, à medida que o conhecimento avança, pesquisadores descobrem que os hormônios também têm poder para alterar nossa mente de maneiras inesperadas. Agora, especialistas tentam usar essas descobertas para desenvolver novos tratamentos para transtornos como depressão e ansiedade.

Os hormônios são substâncias químicas produzidas por glândulas, órgãos e tecidos. Eles entram na corrente sanguínea e circulam pelo corpo até se ligarem a receptores específicos, desencadeando ações determinadas. A insulina, por exemplo, orienta o fígado e as células musculares a absorver o excesso de glicose e armazená-lo como glicogênio.

O corpo humano possui mais de 50 hormônios identificados, responsáveis por coordenar centenas de processos, como crescimento, desenvolvimento, função sexual, reprodução, ritmos de sono e vigília e, principalmente, o equilíbrio do bem-estar mental.

Segundo a professora de psicologia Nafissa Ismail, da Universidade de Ottawa, os hormônios interagem com os neurotransmissores produzidos em áreas específicas do cérebro e influenciam fenômenos como morte celular e neurogênese, processo em que novos neurônios são formados. Essas alterações podem impactar o humor e até interferir no ciclo natural do sono.

A incidência de transtornos mentais, como depressão, ansiedade e estresse pós-traumático, costuma aumentar durante períodos de transições hormonais, sobretudo entre mulheres. Na infância, meninos e meninas apresentam índices semelhantes de depressão, mas, na adolescência, as garotas passam a ter o dobro de chances de desenvolver o distúrbio — diferença que persiste pela vida adulta. As oscilações hormonais são apontadas como possível explicação.

Os hormônios sexuais, por exemplo, têm influência marcante sobre o humor feminino. Antes da menstruação, os níveis de estrogênio e progesterona diminuem, coincidindo com irritabilidade, cansaço, tristeza e ansiedade em algumas mulheres. Em casos mais severos, pode surgir o transtorno disfórico pré-menstrual, caracterizado por intensas mudanças de humor, ansiedade, depressão e até pensamentos suicidas nas semanas anteriores ao ciclo. Para quem enfrenta esse quadro, o impacto na vida cotidiana pode ser profundo.

Por outro lado, níveis elevados de estrogênio antes da ovulação costumam estar associados a sensações de bem-estar. Já a alopregnanolona, derivada da progesterona, é reconhecida por efeitos calmantes, capaz de provocar relaxamento quando administrada artificialmente.

Além do ciclo menstrual, fases como gravidez, perimenopausa e menopausa também podem provocar grandes alterações emocionais. Até 13% das mulheres desenvolvem depressão após o parto, o que pode ser explicado pela queda abrupta de estrogênio e progesterona. Na perimenopausa, os hormônios ovarianos também variam intensamente. A sensibilidade a essas flutuações varia de pessoa para pessoa, e algumas atravessam esse período sem sintomas significativos.

Embora menos discutidos, os homens também sofrem alterações hormonais com o tempo. A testosterona diminui gradualmente com o envelhecimento e, apesar de a queda ser mais suave que nas mulheres, pode causar mudanças de humor em alguns indivíduos.

Uma das formas pelas quais os hormônios sexuais influenciam o humor é estimulando os neurotransmissores serotonina e dopamina. Baixos níveis de serotonina estão há muito tempo associados à depressão. Pesquisas indicam que certos tipos de estrogênio aumentam a sensibilidade dos receptores de serotonina e ampliam o número de receptores de dopamina no cérebro. O estrogênio também protege neurônios e pode estimular o crescimento de novas células no hipocampo, região crucial para memória e emoções. Por isso, mulheres na menopausa, quando esse hormônio diminui, podem enfrentar nevoeiro mental e lapsos de memória.

A perda de neurônios no hipocampo também afeta o eixo hipotálamo-pituitária-adrenal, responsável por regular a resposta ao estresse. Em situações de ansiedade, o hipotálamo ativa a produção do hormônio ACTH, que estimula as glândulas adrenais a liberar cortisol. Esse hormônio prepara o corpo para emergências, liberando glicose no sangue. Em curto prazo, essa reação é útil, mas, quando mantida continuamente em situações de estresse crônico, torna-se prejudicial.

Nessas condições, o hipocampo perde a capacidade de enviar sinais que interrompem a produção de cortisol, fazendo com que o cérebro permaneça inundado pelo hormônio por longos períodos. Com o tempo, isso causa inflamação, destruição de neurônios e prejuízos em regiões como amígdala e córtex pré-frontal, afetando memória, humor e concentração.

Como seus hormônios podem controlar sua mente

A amígdala é a região do cérebro responsável por regular as emoções e, segundo a pesquisadora Nafissa Ismail, a perda de volume nessa área está ligada ao aumento da irritabilidade, maior sensibilidade emocional e dificuldade de controlar sentimentos negativos. Da mesma forma, a atrofia do córtex pré-frontal costuma prejudicar a concentração e a capacidade de tomar decisões adequadas, enquanto alterações no hipocampo afetam diretamente a memória e a habilidade de recordar informações.

O cortisol está associado ao estresse, mas a oxitocina, conhecida popularmente como o “hormônio do amor”, produz efeito oposto. Ela é relacionada a sensações de conforto, afeto e gentileza. Liberada durante o parto, a amamentação e o orgasmo, também parece favorecer a criação de vínculos entre pessoas e até entre humanos e animais. Para Ismail, a oxitocina fortalece a sensação de segurança e apoio, o que ajuda a reduzir os níveis de cortisol em momentos de estresse.

Pesquisas apontam que o uso de spray nasal de oxitocina pode tornar indivíduos mais cooperativos, empáticos e generosos, além de facilitar a confiança em desconhecidos. Ainda assim, especialistas divergem quanto à real capacidade dessa substância de atravessar a barreira hematoencefálica, o que deixa algumas conclusões em aberto.

Entre outros hormônios envolvidos no equilíbrio emocional, destacam-se os produzidos pela tireoide, especialmente T3 e T4. Eles controlam funções como batimentos cardíacos e temperatura corporal. Quando seus níveis estão elevados, é comum o surgimento de ansiedade; quando estão baixos, a depressão se torna mais frequente. A boa notícia é que, na maioria dos casos, a estabilização desses hormônios elimina os sintomas emocionais associados. Por isso, a análise do perfil hormonal costuma ser uma das primeiras medidas quando pacientes relatam mudanças significativas de humor.

Embora ainda não se saiba exatamente por que os hormônios da tireoide afetam o estado emocional, uma das hipóteses é que a T3 eleve os níveis de serotonina e dopamina ou aumente a sensibilidade dos receptores desses neurotransmissores. Os efeitos também podem estar relacionados ao fato de existirem receptores desses hormônios em áreas cerebrais diretamente envolvidas na regulação do humor.

O avanço das pesquisas abre caminho para novos tratamentos. Já existe, por exemplo, a brexanolona, medicamento que imita a alopregnanolona e apresenta alta eficácia no tratamento da depressão pós-parto. Além disso, há indícios de que suplementar testosterona pode ajudar pessoas com níveis baixos desse hormônio a responder melhor a determinados antidepressivos.

Terapias com estrogênio, como a reposição hormonal, também mostram bons resultados para algumas mulheres em fases como perimenopausa e menopausa, embora não funcionem para todas. Métodos contraceptivos hormonais podem aliviar significativamente os sintomas do transtorno disfórico pré-menstrual, mas, em alguns casos, também podem agravá-los.

Essas diferenças individuais tornam mais difícil encontrar soluções universais, já que ainda não se compreende completamente por que determinadas pessoas são mais sensíveis às flutuações hormonais que outras.

Para Ismail, compreender como os hormônios interagem com o cérebro é essencial para desenvolver terapias mais eficazes. Ela lembra que os antidepressivos atuais, focados na regulação da serotonina, não funcionam igualmente bem para todos e podem ter eficácia reduzida entre adolescentes. Segundo a pesquisadora, é necessário aprofundar o entendimento sobre o funcionamento do cérebro nessa fase da vida para desenvolver abordagens mais eficientes e personalizadas.