Agência Brasil
Um levantamento realizado pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), vinculado ao NIC.br, destaca o crescimento acelerado do emprego de ferramentas de inteligência artificial (IA) por alunos e professores no ensino médio.
O estudo, intitulado “Inteligência Artificial na Educação: usos, oportunidades e riscos no cenário brasileiro”, investiga o cenário atual em escolas públicas e particulares nas capitais de São Paulo e Pernambuco, revelando um uso quase descontrolado dessa tecnologia emergente.
Dados de uma pesquisa anterior, divulgada em setembro pelo mesmo centro, já indicavam a ampla incorporação da IA no cotidiano escolar brasileiro, com 70% dos estudantes do ensino médio, totalizando cerca de 5,2 milhões, e 58% dos docentes utilizando ferramentas de IA generativa em atividades acadêmicas.
A coordenadora do estudo, Graziela Castello, explicou à Agência Brasil que o uso da IA é bastante diversificado, incluindo desde buscas rápidas de palavras ou esclarecimento de dores físicas, até a elaboração de receitas, lembretes, anotações, resumos, realização de tarefas completas e até suporte emocional. "Os estudantes relatam ainda que utilizam a tecnologia como uma espécie de terapeuta ou conselheiro, demonstrando um uso muito amplo e multifacetado", afirmou ela.
A pesquisa, que envolveu trabalho de campo entre junho e agosto de 2025, foi divulgada nesta terça-feira (25), durante o seminário INOVA IA 2025, no Rio de Janeiro.
Além dos estudantes, os docentes também fazem uso intensivo da IA generativa para preparação de aulas e suporte às atividades pedagógicas. Graziela ressaltou que tanto alunos quanto professores atuam de forma bastante autônoma nesse uso, sem mediação, orientação ou regras estabelecidas pelas instituições de ensino.
“Ambos querem informações, desejam aprender a usar de modo ético e seguro, sem riscos. Contudo, esse uso intenso ainda ocorre de maneira desestruturada, com pouca orientação formal”, observou ela.
Para mitigar esses riscos, o estudo sugere a necessidade de acelerar a elaboração de regulamentos, protocolos e políticas que possam oferecer uma orientação básica e segura, além de ações de capacitação para professores e estudantes.
Segundo Graziela, o caminho envolve investir na formação adequada de todos os envolvidos e estabelecer regras claras para o uso responsável da tecnologia, de modo que todos saibam o que fazer e o que evitar ao navegar nesse universo ainda novo.
Ela também pontuou que, ao contrário do que ocorreu com a internet, que entrou na rotina das pessoas de forma rápida e quase sem avisos, a IA chegou de forma abrupta, sendo adotada de imediato por alunos e professores, que reconhecem tanto seu potencial quanto os riscos. "Eles utilizam a IA bastante, mas também demonstram preocupação com as possíveis consequências desse uso".
O estudo revela que, apesar do entusiasmo, os estudantes temem perder a capacidade de aprender de forma autônoma, de desenvolver criatividade ou de manter a identidade própria.
"Temem que o uso excessivo torne tudo homogeneizado, fazendo com que percam nuances e individualidades", explicou Graziela. Os jovens demonstram entusiasmo pela tecnologia, mas também consciência dos perigos e buscam orientações claras e precisas.
Para os gestores públicos, essas informações reforçam a importância de criar políticas que orientem esse uso, minimizando os riscos. A pesquisa destaca ainda o impacto das desigualdades de acesso à infraestrutura digital, que já se manifestam antes mesmo da introdução da IA.
Alunos de escolas particulares, por exemplo, geralmente dispõem de computadores em casa, o que potencializa o uso da tecnologia, enquanto os estudantes de escolas públicas, muitas vezes limitados ao uso de celulares, enfrentam maiores dificuldades de operação.
Graziela reforça que as desigualdades na infraestrutura digital tendem a se ampliar se não forem tomadas providências específicas. Assim, a adoção responsável da IA deve vir acompanhada de ações de letramento digital, que envolvam ensinar estudantes e professores sobre o funcionamento das ferramentas, quem detém os dados e quais são os limites do uso.
Desafios adicionais incluem garantir que os dados utilizados pelas ferramentas de IA sejam relevantes ao contexto brasileiro. Perguntas como "Estamos usando dados adequados ao nosso país?", "As tecnologias disponíveis refletem nossos problemas internos?" são essenciais para assegurar a fidelidade e a utilidade dessas soluções no Brasil.
Graziela comparou a velocidade da entrada da IA na rotina escolar com uma situação de ‘trocar a roda do carro em movimento’, indicando a necessidade de ações rápidas e eficazes para acompanhar essa evolução. Entre as prioridades estão o desenvolvimento de uma postura crítica por parte dos estudantes, que possam aprender a verificar a veracidade das informações recebidas, e a capacidade de identificar erros factuais ou conteúdos preconceituosos nas respostas geradas pelas ferramentas.
A coordenadora finalizou destacando que o enfrentamento desses desafios é crucial para evitar a reprodução de vieses, além de garantir que a tecnologia seja usada de forma ética, segura e enriquecedora para toda a comunidade escolar, promovendo uma formação mais consciente e preparada para os desafios do século XXI.