De acordo com um estudo do Instituto Internacional de Pesquisa da Paz de Estocolmo (Sipri), o setor de produção de armas atingiu patamares inéditos de receita em 2024. O montante obtido com vendas e serviços militares das cem maiores companhias do segmento atingiu a cifra de 679 bilhões de dólares, marcando uma alta de 5,9% em relação ao ano anterior, já descontada a inflação.
As tensões internacionais crescentes em 2023, culminando no conflito na Ucrânia, já haviam impulsionado a procura por armamentos, tendência que se intensificou ainda mais em 2024, conforme aponta o relatório.
Nan Tian, especialista do Sipri e um dos autores do levantamento, comenta que o cenário de guerra na Ucrânia claramente favorece as operações comerciais das fabricantes de armas. "Nos dois últimos anos, essas empresas ampliaram consideravelmente suas receitas", afirma.
As cinco maiores fabricantes globais, de acordo com os dados do estudo, incluem a Lockheed Martin (conhecida pelos caças F-35), a RTX (antiga Raytheon Technologies, especializada em motores de avião e drones), a Northrop Grumman (que produz mísseis de longo alcance), a britânica BAE Systems e a General Dynamics (que fabrica submarinos nucleares e mísseis).
Com exceção da BAE Systems, sediada na Inglaterra, todas as demais possuem sua base nos Estados Unidos. Este é o primeiro ano desde 2017 em que uma companhia que não tenha sede nos EUA aparece entre as cinco maiores do setor.
Na classificação, a Airbus, braço militar do conglomerado europeu, ocupa a 13ª posição entre as cem maiores empresas de receita, enquanto a Rheinmetall, da Alemanha, figura na 20ª colocação.
Em 2024, quatro empresas alemãs integraram essa lista, além da Rheinmetall. São elas a Thyssenkrupp, a Hensoldt e a Diehl. Juntas, alcançaram receitas de aproximadamente 14,9 bilhões de dólares. A Rheinmetall, especificamente, registrou aumento de 47% na receita relacionada a tanques, veículos blindados e munições.
Entre as cem maiores companhias, 39 estão sediadas nos EUA, que dominam de longe em número. As corporações americanas respondem por quase metade do faturamento mundial no ramo de armas.
Contudo, o crescimento anual dessas empresas americanas foi de 3,8%, um avanço relativamente modesto comparado às 26 companhias europeias (excluindo as russas), que tiveram um aumento conjunto de 13% na receita.
As firmas alemãs, em particular, destacaram-se com um crescimento expressivo de 36%, sobretudo devido ao conflito na Ucrânia. A demanda por equipamentos militares por parte da Bundeswehr (Forças Armadas alemãs) aumentou substancialmente, explica Nan Tian. Empresas como Rheinmetall e Diehl produziram tanques, veículos de transporte de tropas blindados e munições para substituir os materiais enviados como ajuda militar à Ucrânia, além de abastecer seus próprios estoques.
Na Rússia, a receita também cresceu de forma acentuada, o que não causa surpresa, pois as sanções internacionais não impediram o aumento da demanda interna. O país adaptou sua economia para uma postura de guerra, segundo o especialista do Sipri. "A guerra transformou completamente a economia russa nos últimos três anos", afirma Nan Tian.
Ele cita um exemplo: a produção de projéteis de artilharia de 152 mm cresceu 420% de 2022 a 2024, passando de 250 mil para 1,3 milhão de unidades, conforme dados do relatório.
No entanto, as sanções prejudicaram componentes importados, especialmente eletrônicos para aeronaves, dificultando o funcionamento de algumas indústrias militares russas. Apesar disso, Nan Tian afirma que a expectativa de colapso econômico devido às sanções não se confirmou. "A Rússia demonstrou grande resistência diante das sanções e problemas econômicos, e a situação está pior do que estaria se não tivesse invadido a Ucrânia, pois neste cenário não haveria sanções."
Ele também observa que a transformação na estrutura econômica russa foi tão profunda que, se a guerra na Ucrânia terminasse, o país teria dificuldades para retornar a um modelo de economia civil.
Por outro lado, as empresas asiáticas enfrentaram uma redução de receitas em 2024, destaque para a China, que apresentou uma diminuição de 10% em relação a 2023. Segundo Nan Tian, essa queda decorre de inúmeras denúncias de corrupção contra companhias chinesas de armamento, levando ao cancelamento ou adiamento de grandes pedidos.
Já na região do Oriente Médio, as receitas cresceram 14%, representando um recorde de listadas no relatório do Sipri. Entre as nove empresas da região, três situam-se em Israel, onde há alta demanda por drones e sistemas de defesa aérea. A forte procura por esses produtos impulsionou o aumento regional na receita de armamentos.