Após um incidente de incêndio que obrigou uma evacuação rápida na conferência do clima da ONU em Belém, a COP30 entrou em uma fase de negociações acaloradas e incertas.
A reunião, inicialmente marcada para encerrar nesta sexta-feira (21/11), se estende além do prazo previsto, com sinais de desgaste e descontentamento entre os participantes. A área afetada pelo fogo foi isolada, mas isso não impediu a movimentação intensa nos corredores, onde os delegados continuam suas discussões.
Já é possível notar a desmontagem gradual dos estandes, enquanto uma transmissão acidental revelou negociadores visivelmente tensos e até um início de discussão acalorada em uma das sessões fechadas.
Entre as discordâncias, representantes da Índia consideraram inaceitável que a presidência brasileira tentasse inserir no documento final um cronograma para a eliminação dos combustíveis fósseis. No início do dia, uma coletiva de imprensa contou com a presença da coalizão liderada pela ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Irene Vélez Torres, que criticou a fragilidade do debate e apresentou uma proposta para acabar com a era do petróleo e seus derivados.
Ela enfatizou: "Não estamos solicitando um documento vazio. Precisamos de um roteiro que realmente nos conduza adiante". Durante toda a jornada, especialistas e ativistas da sociedade civil manifestaram descontentamento com o rascunho divulgado na manhã, embora evitassem um tom derrotista. Carolina Pasquali, diretora do Greenpeace Brasil, afirmou: "A solução não é desistir ou abandonar tudo. Ainda temos tempo para trabalhar por um texto melhor".
As críticas ao documento aumentaram após a divulgação de um segundo rascunho do texto final, considerado insuficiente por diversos países, incluindo a Espanha, cujo representante, Sara Aagesen, descreveu o momento como "complexo" e pediu esforços adicionais para fortalecer as propostas.
As principais lacunas apontadas incluem a ausência de uma proposta concreta para a eliminação da queima de combustíveis fósseis, a falta de um plano de financiamento para ajudar na adaptação de países vulneráveis e a ausência de estratégias para reduzir o desmatamento global. Carolina Pasquali resumiu a situação com a frase: "Não há mais um roteiro claro".
O debate ganhou força após uma provocação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que na abertura da COP sugeriu uma rota para abandonar o petróleo. A iniciativa, apoiada por Colômbia, que liderou uma coalizão de 80 nações, contou com o respaldo de ministros da Alemanha, Dinamarca, Austrália, Tuvalu e Ilhas Marshall.
Em resposta, a Holanda também defendeu a definição de um cronograma para uma transição energética justa, com uma conferência prevista para abril de 2026 na Colômbia.
Entretanto, especialistas destacam que iniciativas voluntárias, embora relevantes, não substituem as decisões por consenso obrigatórias segundo o Acordo de Paris. Este compromisso exige que os países adotem ações para limitar o aumento global de temperatura a 1,5°C acima do período pré-industrial, com a previsão de que 2025 poderá ser um dos anos mais quentes já registrados, com uma elevação de 1,42°C. Na esfera científica, Thelma Krug, coordenadora do comitê técnico nomeado para a COP30, expressou frustração com os avanços limitados nas negociações.
Ela liderou uma equipe de pesquisadores que, antes do evento, apresentou um documento de quatro páginas alertando para a alta probabilidade de o planeta ultrapassar os 1,5°C, caso a queima de combustíveis fósseis não seja interrompida até 2040, e não mais 2045, como se pensava anteriormente.
O climatologista brasileiro Carlos Nobre lamentou o fato de o termo "combustíveis fósseis" nem sequer ter sido mencionado no último rascunho, reforçando a urgência de ações concretas.
No final do dia, alguns delegados deixaram a zona azul para jantar e retomaram as negociações, enquanto o ministro alemão do Meio Ambiente, Carsten Schneider, afirmou à DW que ainda há muito trabalho a ser feito. Muitos participantes precisarão buscar novas acomodações, pois os dois hotéis flutuantes utilizados como alojamento estão previstos para deixar o local na manhã de sábado.
Manifestantes, incluindo jovens, indígenas, quilombolas e povos tradicionais, fizeram tentativas de se aproximar das áreas de negociação, com discursos marcantes durante a Plenária do Povo.
Entre as palavras de ativistas como Roaa Ahmed Dafaallah, do Sudão, destacou-se a denúncia das perdas causadas pelas mudanças climáticas, além de relatos de violência e injustiça social, enquanto carregavam cartazes pedindo justiça climática e o fim do uso de combustíveis fósseis.