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Violência
06/11/2025 14:00:00

Levantamento revela aumento de mortes por ação policial em diversos estados brasileiros em 2024

Dados indicam que a maioria das vítimas negras representam uma parcela desproporcional nas fatalidades sob intervenção policial

Levantamento revela aumento de mortes por ação policial em diversos estados brasileiros em 2024

Agência Brasil

Segundo um estudo recente, durante o ano de 2024, a polícia matou uma média de 11 pessoas por dia em nove diferentes estados do Brasil, sendo que pelo menos oito dessas vítimas eram negras. Essas informações estão contidas no relatório 'Pele Alvo', divulgado nesta quinta-feira (6) pela Rede de Observatórios da Segurança, que analisa os números de intervenções policiais nos estados do Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo.

O levantamento aponta que, nesses nove estados, ocorreram ao todo 4.068 homicídios relacionados à ação policial no ano passado, sendo que 3.066 vítimas eram pretas ou pardas. Os pesquisadores destacam, no entanto, que em mais de 500 registros, a informação racial não foi especificada. Em 2023, o total de mortes por intervenção policial nesses locais foi de 4.025.

Além disso, a análise evidencia uma forte disparidade racial na incidência de mortes, principalmente ao medir as taxas por cada 100 mil habitantes de diferentes origens. O estudo conclui que indivíduos negros têm 4,2 vezes mais chances de serem mortos por agentes policiais do que brancos.

Na Bahia, por exemplo, a taxa de mortalidade policial entre negros atingiu 11,5 por 100 mil habitantes, enquanto entre brancos, essa taxa foi de apenas 2. No Pará, esse indicador foi de 8,1 para negros e 3,2 para brancos. Já no Rio de Janeiro, esses números foram respectivamente 5,9 e 1,3 por 100 mil.

Outra constatação importante refere-se à proporção de vítimas negras, que supera a participação dessas populações na composição geral da população. Na Bahia, onde negros ou pardos representam 79,7% da população, eles constituíram 95,7% dos mortos por intervenção, enquanto no Rio de Janeiro esse percentual foi de 86,1%, apesar de esses grupos representarem 57,8% da população.

O relatório também revela que mais da metade das vítimas tinham entre 18 e 29 anos, totalizando 2.324 jovens assassinados, e que 297 mortos tinham idades entre 12 e 17 anos, registrando um aumento de 22,1% em relação a 2023.

De acordo com Francine Ribeiro, especialista da Rede de Observatórios, os dados demonstram uma atuação policial que parece estar em 'modo guerra', sem investimento suficiente em estratégias de prevenção ou integração com outros setores, o que perpetua a violência.

Ela afirma que a lógica adotada pelos órgãos de segurança tem sido de enfrentamento letal, frequentemente justificando ações no combate ao tráfico de drogas e ao crime. A ausência de recursos destinados à prevenção impede a resolução das causas estruturais dessa violência, o que resulta na manutenção ou aumento dessas cifras.

Ela reforça ainda que, sem a implementação de políticas públicas de prevenção integradas, essa dinâmica de violência continuará a persistir, sem redução efetiva nos números de mortes.

Desde 2019, a Rede de Observatórios acompanha esses dados, constatando que, enquanto na Bahia a mortalidade policial cresceu 139,4%, no Rio de Janeiro houve uma redução de 61,2% nos episódios fatais por intervenção policial.

Segundo Francine, a diminuição observada no Rio está relacionada à ação do Supremo Tribunal Federal, que, por meio da ADPF das Favelas, impôs limites às operações policiais em comunidades vulneráveis, contribuindo para o decréscimo de mortes. Contudo, ela alerta que, com a recente onda de operações, incluindo a Contenção, 2025 pode se tornar mais violenta do que 2024.

Outro destaque é a trajetória ascendente da violência policial em São Paulo, que registrou um aumento de 93,8% em três anos. Inicialmente, o uso de câmeras corporais ajudou a reduzir as mortes, mas mudanças nos protocolos permitiram que as gravações fossem ativadas apenas mediante solicitação, o que reverteu a tendência.

O estudo confirma que a Bahia mantém a maior taxa de mortalidade entre os estados analisados, com 1.556 mortes — representando 38% do total nacional — e um padrão de mais de mil homicídios por ano desde 2021, predominantemente envolvendo homens negros.

A Organização recomenda que a adoção de câmeras corporais seja obrigatória em todas as operações policiais, incluindo as especiais, e que a classificação de raça ou cor seja obrigatória ao registrar vítimas, eliminando a categoria de 'não informado'.

Também sugerem a divulgação pública dos protocolos de atuação policial, a revisão de treinamentos, a implementação de um programa nacional de apoio à saúde mental dos agentes, além de planos estaduais e municipais com metas claras, indicadores de sucesso, prazos definidos e mecanismos de responsabilização.

Por fim, os especialistas alertam que repetir estratégias que já fracassaram ou desestimular ações bem-sucedidas é um caminho equivocado. A continuidade dessa abordagem pode manter ou aumentar o ciclo de violência, dificultando a garantia de uma segurança pública mais justa e eficaz.