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Acidente
28/10/2025 08:00:00

Crise de deserções em tropas ucranianas ameaça a estabilidade do conflito de 2024

Milhares de militares abandonam suas posições, refletindo problemas internos e impacto na resistência contra a Rússia

Crise de deserções em tropas ucranianas ameaça a estabilidade do conflito de 2024

Mais de 100 mil membros das forças armadas ucranianas foram processados por deserção desde o início da invasão russa em fevereiro de 2022, conforme informações fornecidas pelo Ministério Público do país.

Segundo o procurador-geral, essa fuga em massa está prejudicando severamente a estrutura militar, deixando as unidades desmanteladas e comprometendo as estratégias de combate em um momento decisivo da guerra com a Rússia.

Relatos de soldados, advogados e funcionários do governo indicam que dezenas de milhares de militares, exaustos e desmotivados, abandonaram suas posições na linha de frente, desaparecendo no anonimato.

Algumas unidades inteiras deixaram seus postos, possibilitando brechas na defesa e acelerando perdas territoriais, de acordo com comandantes e testemunhas militares.

Alguns desertores justificam sua saída por motivos pessoais, como necessidade de procedimentos médicos, e nunca retornam, atormentados por traumas, desesperança ou fadiga emocional. Outros desafiam diretamente as ordens superiores ou entram em conflito com seus comandantes, muitas vezes durante tiroteios intensos.

Oleksandr Kovalenko, analista militar de Kiev, destaca a gravidade da situação, afirmando que, após três anos de conflito, as dificuldades só tendem a aumentar.

Apesar de Moscou também lidar com deserções, a quantidade de ucranianos que desistem após exporem suas dificuldades revela problemas alarmantes na gestão das forças armadas e na mobilização, especialmente com a proposta dos EUA de ampliar o recrutamento para jovens a partir de 18 anos.

Em entrevistas concedidas à AP, dois soldados desertores, três advogados e uma série de oficiais militares relataram sob condição de anonimato, com medo de represálias, a crise interna. Um comandante do 72º Batalhão afirmou: “Já estamos no limite do nosso efetivo”, ressaltando que a deserção foi um fator determinante na perda de Vuhledar em outubro último.

Desde o início da guerra, quase metade dos soldados recrutados optaram por abandonar o serviço, sobretudo após uma campanha de mobilização controversa que, segundo especialistas, falhou em atrair e manter o pessoal.

Os números assustam, considerando que, antes da mobilização, cerca de 300 mil militares ucranianos estavam envolvidos no conflito. Um legislador estima que o total de desertores possa alcançar até 200 mil, uma cifra que reflete a crise de moral e saúde mental nas tropas.

Militares que desistem frequentemente não retornam, devido às marcas psicológicas e emocionais deixadas pelo combate. Muitos sentem culpa, raiva e frustração, dificultando o processo de reintegração ou até mesmo a permanência na força.

Serhii Hnezdilov, soldado que falou publicamente antes de ser acusado por desertar, comentou que a exaustão generalizada faz com que muitos combatentes percam a esperança de uma saída viável, mesmo após longos anos de serviço.

Ele também relatou pesadelos com colegas mortos e a sensação de vulnerabilidade diante do fogo inimigo, além de dificuldades para receber ajuda médica e a decisão de abandonar o serviço após anos de combate, por não acreditar mais em soluções ou promessas de desmobilização.

A deserção tem efeitos devastadores nas operações militares, pois unidades inteiras deixam suas posições, comprometendo a defesa e facilitando avanços do inimigo.

Oficiais afirmam que a falta de liderança e a má gestão contribuíram para perdas significativas, incluindo a queda de Vuhledar, uma cidade que resistiu por dois anos, mas que caiu em semanas devido à desorganização.

Os reforços enviados pela Ucrânia ao perceberem a fragilidade da linha de defesa também foram obrigados a recuar, muitas vezes sem aviso, deixando soldados vulneráveis ao ataque russo. Segundo relatos, alguns militares foram mortos ao fugir, pois não tinham cobertura adequada.

Apesar de o comando militar não condenar oficialmente a deserção, reconhece a dificuldade de lidar com o problema, especialmente devido ao cansaço mental dos combatentes. Procuradores e oficiais militares evitam abrir processos contra desertores, preferindo persuadi-los a retornar, com alguns voltando apenas para desertar novamente.

O governo ucraniano afirma oferecer suporte psicológico aos soldados, mas não fornece detalhes sobre o impacto das deserções na estratégia militar, nem responde às perguntas por e-mail.

Advogados especializados dizem que os processos judiciais contra desertores costumam ser complexos, pois há uma forte componente psicológica envolvida. Muitos soldados alegam que não conseguem lidar com a situação, sem receber o apoio necessário, o que complica as ações legais.

Existe um risco de criar um precedente perigoso ao absolver soldados por motivos psicológicos, uma vez que isso pode justificar futuras saídas, especialmente numa infantaria amplamente afetada por problemas de saúde mental.

Vários militares que consideram desertar buscam aconselhamento, sobretudo aqueles enviados a combates próximos a Vuhledar. Eles argumentam que, mesmo se não conquistarem território, a permanência na linha de frente não traria benefícios, pois a maioria não retornaria ao fim do conflito.