À medida que a inteligência artificial (IA) avança, observa-se um aumento na busca por essas plataformas como apoio emocional, chegando até a substituir o contato direto com psicólogos. Contudo, esse uso não deve ser confundido com uma terapia clínica verdadeira.
De acordo com o psicólogo Filipe Colombini, não há comprovações científicas que demonstrem que a IA possa conduzir sessões de psicoterapia. Ele explica que a tecnologia não foi desenvolvida com essa finalidade. “Existe a preocupação de que usuários confundam respostas automatizadas com atendimento clínico, o que pode levar a diagnósticos incorretos ou atrasar a procura por um profissional qualificado”, adverte.
Pesquisa recente indica que ferramentas digitais podem proporcionar algum alívio momentâneo, mas não substituem a escuta especializada de um terapeuta. Além disso, respostas simplificadas ou até mesmo imprecisas podem agravar quadros já existentes. Colombini reforça que a IA não deve ser confundida com um método de tratamento. “No máximo, ela pode oferecer aconselhamento. A psicoterapia, por sua vez, envolve um plano estruturado, acompanhamento semanal, revisões de temas delicados e a construção de uma relação humana essencial, algo que uma máquina não consegue replicar”, esclarece.
O profissional também vê a tecnologia como uma aliada, e não uma ameaça. “Não considero a IA uma concorrente, mas uma ferramenta que pode colaborar conosco. Assim como o Google revolucionou o acesso à informação, a IA pode ser empregada de forma estratégica na organização de dados, processos de avaliação ou no suporte ao terapeuta. A questão é entendê-la antes de julgá-la”, afirma.
Outro aspecto que merece atenção é a questão da privacidade dos pacientes. “Dados pessoais e confidenciais podem ser expostos ou acessados por terceiros sem autorização, caso a plataforma sofra invasões ou apresente vulnerabilidades de segurança. Embora as empresas garantam o anonimato ou a exclusão de diálogos, existe a possibilidade de armazenamento temporário para melhorias do sistema, o que pode gerar riscos”, pondera.
O Conselho Federal de Psicologia (CFP) também já se pronunciou oficialmente sobre o uso da IA na prática psicológica. O órgão afirmou que a intenção não é rejeitar os avanços tecnológicos, mas assegurar que sua aplicação esteja alinhada aos princípios éticos da Psicologia. Sempre com responsabilidade, supervisão de profissionais habilitados e respeito às normas. Ressaltam que tarefas mais complexas, como diagnósticos e intervenções, devem ser realizadas apenas com a participação de psicólogos, e que a escuta humana, a singularidade do indivíduo e o sigilo profissional não podem ser substituídos por algoritmos.
Segundo Colombini, o maior desafio está nos limites do uso da tecnologia. “A IA deve ser uma ferramenta informativa e suplementar, nunca substituindo a relação terapêutica. Ainda carecemos de evidências científicas robustas que confirmem sua eficácia em saúde mental. Enquanto isso, a interação humana, a sensibilidade e a conexão entre terapeuta e paciente permanecem essenciais na psicoterapia”, conclui o especialista.
Filipe Colombini é psicólogo, com especialização em orientação parental e atendimento a crianças, jovens e adultos.
Possui formação em Clínica Analítico-Comportamental e é mestre em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Atua como professor no Curso de Acompanhamento Terapêutico do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (GREA-IPq-HCFMUSP).
Além de coordenador e instrutor de programas de aprimoramento em Acompanhamento Terapêutico, possui qualificações em Psicoterapia Baseada em Evidências, Terapia Infantil, Desenvolvimento Atípico e Abuso de Substâncias.