Uma pesquisa recente, envolvendo uma amostra de mais de 2,3 milhões de jovens de escolas públicas e privadas de todo o Brasil, aponta que menos de 40% dos estudantes do 6º ao 9º ano demonstram respeito e apreço pelos seus docentes. Apesar de uma maioria se sentir acolhida na escola, o reconhecimento aos professores ainda é considerado insatisfatório.
O levantamento foi conduzido em 21 mil instituições de ensino durante a Semana da Escuta das Adolescências, uma iniciativa que promove o diálogo entre estudantes, gestores educacionais, sociedade civil, instituições acadêmicas e organismos internacionais. O objetivo é fundamentar a elaboração de uma política nacional voltada especificamente para essa etapa do ensino fundamental, que abrange alunos do 6º ao 9º ano, uma fase de transição da infância para a adolescência.
A parceria que realizou a pesquisa envolve o Ministério da Educação (MEC), o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), a União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e o Itaú Social. Durante o lançamento do relatório em Brasília, a secretária de Educação Básica do MEC, Katia Schweickardt, destacou a importância de ouvir as perspectivas dos adolescentes para compreender que cada aluno aprende de forma distinta, apoiado em suas experiências particulares.
Ela reforçou a necessidade de adaptar o ambiente escolar a essa diversidade, incluindo salas de aula com estudantes de diferentes perfis, o que exige preparação adequada para os professores, recursos pedagógicos e envolvimento da comunidade. Segundo Schweickardt, o currículo deve refletir uma vivência significativa, não sendo apenas uma lista de conteúdos, mas sim uma ferramenta que promove a cultura de aprendizagem.
A especialista acrescenta que a formação docente deve incluir a compreensão dessas diferenças, enfatizando que a escolaridade precisa estar preparada para responder às necessidades diversas dos estudantes, especialmente na fase final do ensino fundamental. Ela afirmou que o currículo deve ser uma experiência de vida, promovendo a inclusão e o sentido de pertencimento na escola.
Na opinião de Tereza Perez, pedagoga da organização civil Roda Educativa, é fundamental reconhecer as diferentes composições das turmas, sob o risco de aumentar a evasão escolar e o abandono. Ela critica a tentativa de homogeneizar as aprendizagens por meio de métodos únicos, o que muitas vezes culpa os alunos pela falta de progresso, usando a reprovação como única estratégia para estimular o aprendizado, sem sucesso duradouro.
A pesquisa revela que a percepção dos estudantes sobre suas experiências na escola varia de acordo com a faixa etária. Os jovens do 6º e 7º anos tendem a manter uma visão mais positiva, enquanto os do 8º e 9º anos apresentam uma avaliação mais crítica em relação às condições de acolhimento e convivência.
Patrícia Mota Guedes, superintendente do Itaú Social, recorda que o Brasil tem décadas sem uma política específica para a educação na adolescência. Desde 2023, o MEC vem promovendo o projeto Escola das Adolescências, que busca incluir estudantes, gestores, sociedade civil, academia e organismos internacionais em um esforço conjunto para fortalecer essa fase escolar. Segundo ela, o Brasil se destaca por escutar seus adolescentes de maneira inédita em âmbito de políticas públicas, o que favorece o alinhamento das ações de acordo com as demandas presentes nesse grupo.
Quanto ao sentimento de acolhimento, 66% dos estudantes do 6º e 7º anos afirmaram que se sentem acolhidos na escola, enquanto 27% consideram a experiência parcial e 7% discordam. Já entre os alunos do 8º e 9º ano, esses números caem para 54% de sensação de acolhimento, com 33% avaliando como intermediária e 13% discordando.
Em relação à confiança nos adultos dentro do ambiente escolar, 75% dos estudantes do 6º e 7º anos confiam em pelo menos um responsável, porém apenas 58% sentem-se verdadeiramente acolhidos por eles. Para os estudantes do 8º e 9º anos, o índice de acolhimento diminui para 45%.
As escolas com maior presença de alunos em situação de vulnerabilidade apresentam uma percepção mais positiva de acolhimento, com 69% dos estudantes nessas instituições sentindo-se apoiados, contra 56% em ambientes menos vulneráveis.
Ao avaliar sua experiência social na escola, 65% dos estudantes do 6º e 7º anos concordam que o ambiente favorece amizades e interações, contra 55% dos do 8º e 9º anos. Ainda assim, a maioria mantém amizades próximas na escola, com 84% desses jovens do ciclo mais cedo e 83% no ciclo mais avançado indicando que possuem amigos com quem gostam de conviver.
No entanto, a pesquisa evidencia o desafio na relação aluno-professor, onde apenas 39% dos mais novos e 26% dos mais velhos afirmam que respeitam e valorizam seus docentes.
Um exemplo é Dandara Vieira Melo, de 13 anos, estudante da rede pública de Rio Branco, que participou do Programa Travessia, uma iniciativa do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e do governo do Acre. Após atrasos nos estudos devido às mudanças de município e questões familiares, ela expressa uma nova perspectiva sobre a escola, considerando-a um espaço de aprendizado, descoberta de novas culturas, amizades e crescimento pessoal.
Quando questionados sobre os temas mais relevantes para seu desenvolvimento, os estudantes mais jovens destacaram, em primeiro lugar, as disciplinas tradicionais (48%), seguidas por atividades relacionadas ao bem-estar emocional e ao corpo (31%), incluindo esportes e saúde mental. Ainda, 21% valorizam habilidades futuras, como educação financeira e tecnologia, e 13% destacam temas como direitos humanos e sustentabilidade.
Entre os alunos do 8º e 9º anos, as disciplinas tradicionais continuam sendo consideradas importantes por 38%, seguidas por atividades de desenvolvimento socioemocional (29%), habilidades para o futuro (24%) e questões ambientais e de direitos (13%).