Na declaração final da cúpula do Brics realizada no Rio de Janeiro, o grupo condenou os ataques contra o Irã, apontando violações ao direito internacional, mas sem citar diretamente os Estados Unidos ou Israel, numa tentativa de evitar tensões diretas com o presidente americano Donald Trump. O documento também faz críticas às políticas econômicas do novo governo republicano, como a imposição de tarifas comerciais, mas sem mencionar o país nominalmente.
O bloco reforçou a necessidade de regulação da inteligência artificial, indo contra a postura do governo Trump, que é contrário a esse tipo de medida. Além disso, reiterou o interesse em aumentar as trocas comerciais em moedas locais como alternativa ao dólar, embora a versão de 2025 tenha dado menos ênfase ao tema, após ameaças anteriores dos EUA de impor sanções aos países que seguissem por esse caminho.
Brasil garante apoio de China e Rússia à vaga no Conselho de Segurança
Durante a cúpula, o Brasil conquistou um avanço diplomático importante ao garantir a inclusão de seu nome, ao lado da Índia, como candidato a uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU. A menção, no entanto, foi limitada ao apoio de China e Rússia, sem incluir os demais integrantes do bloco. A África do Sul, que antes também era mencionada, ficou de fora do trecho, devido à resistência de novos membros africanos.
Críticas às tarifas e defesa do multilateralismo
A declaração condena o uso crescente de tarifas e barreiras comerciais, qualificando-as como disfarces para práticas protecionistas. Essa crítica ocorre em meio ao aumento das tensões comerciais desencadeadas por Trump desde abril, quando foram adotadas tarifas de até 100% sobre produtos de países como a China. O Brasil também foi alvo, com uma tarifa média de 10% sobre suas exportações para os EUA, mas ainda não retaliou.
O grupo defendeu o fortalecimento da Organização Mundial do Comércio como espaço adequado para resolver disputas comerciais e alertou que medidas unilaterais ameaçam o comércio global.
Foco em financiamento em moedas locais
O uso de moedas nacionais nas transações do bloco foi retomado com cautela. O trecho da declaração que, em 2024, incentivava esse tipo de operação foi substituído por um foco nos financiamentos feitos em moedas locais por meio do Banco dos Brics (NDB). O presidente Lula destacou que 31% dos projetos financiados pelo banco já utilizam moedas nacionais, reduzindo a dependência do dólar.
Regulação da Inteligência Artificial ganha destaque
O Brics também reforçou seu compromisso com a regulação internacional da inteligência artificial, destacando a importância de mitigar riscos e garantir benefícios equitativos, especialmente para países em desenvolvimento. O texto defende o pagamento de direitos autorais por conteúdos usados em treinamentos de IA e o respeito à propriedade intelectual digital.
Essa posição contraria a política do governo Trump, que tem se posicionado contra qualquer regulação da inteligência artificial. Uma proposta de proibição de normas estaduais sobre o tema chegou a ser apresentada pelo presidente, mas foi rejeitada pelo Congresso dos EUA.
Condenação a ataques ao Irã, sem apontar culpados
O bloco condenou os bombardeios recentes ao Irã, ocorridos em junho e atribuídos aos Estados Unidos e Israel, classificando-os como violações ao direito internacional. No entanto, evitou nomear os responsáveis, em uma clara tentativa de não alimentar um confronto direto com Trump. Também manifestou preocupação com ataques a instalações nucleares civis e pediu que o Conselho de Segurança da ONU trate do tema com urgência.
Conflito em Gaza recebe críticas mais severas
O Brics ampliou suas críticas à atuação de Israel na Faixa de Gaza, dedicando quatro parágrafos ao tema. O grupo condenou o uso da fome como arma de guerra e reiterou seu apoio à criação de um Estado palestino dentro das fronteiras de 1967, com Jerusalém Oriental como capital. O Irã se opôs à inclusão da solução de dois Estados, mas não conseguiu alterar a posição tradicional do bloco.
Ucrânia é mencionada, mas Rússia não é criticada
A guerra na Ucrânia foi mencionada brevemente, como em declarações anteriores, sem críticas à Rússia. O texto apenas registra as posições nacionais de cada membro e menciona propostas de paz apresentadas por iniciativas africanas e pelo Grupo de Amigos pela Paz, do qual Brasil e China participam.
Rejeição a sanções unilaterais
O documento também criticou o uso de sanções sem autorização do Conselho de Segurança da ONU, afirmando que medidas unilaterais violam o direito internacional. A crítica atinge indiretamente os Estados Unidos e a União Europeia, que mantêm sanções contra Rússia e Irã, ambos membros do Brics.
Com esses posicionamentos, o Brics reafirma seu apoio ao multilateralismo e ao fortalecimento do Sul Global, mantendo uma postura crítica à hegemonia ocidental, mas adotando tom moderado para evitar atritos diretos com Washington.