Enquanto enfrentam o front da guerra contra a Rússia, militares LGBTQ+ da Ucrânia também travam outra batalha: a busca por direitos iguais. Embora a aceitação da comunidade tenha crescido entre a população, a legislação ainda não garante proteção ou igualdade plena para esses soldados.
Roman Abrashyn, de 25 anos, é piloto de drones e assumidamente homossexual. Ele se alistou em abril de 2024 e conta que a reação dos colegas à sua orientação sexual foi majoritariamente neutra, sem hostilidade. No entanto, lamenta que seu parceiro civil não tenha direito a indenização caso algo lhe aconteça. “Lutamos como todos os outros, mas não temos os mesmos direitos”, desabafa. A ausência de leis que reconheçam uniões homoafetivas impede que parceiros LGBTQ+ sejam informados sobre a saúde do militar ou recebam benefícios legais.
O Parlamento ucraniano discute há mais de dois anos um projeto de lei sobre parcerias registradas, mas o avanço é travado pelo conservadorismo de parte dos deputados. A autora da proposta, a parlamentar Inna Sowsun, destaca que a resistência política não reflete necessariamente a opinião pública, mas o receio de reações negativas.
Dmytro, um soldado de 19 anos, viveu a hostilidade mais intensamente. Ele se identifica como assexual e busca relações românticas com pessoas de qualquer gênero. Após sua orientação sexual se tornar conhecida em sua unidade, sofreu ameaças e chegou a tentar suicídio. Mesmo após registrar queixa, não obteve resposta das autoridades. Transferido para outra brigada, afirma ter recebido apoio de um novo comandante, sinal de que há mudanças positivas ocorrendo lentamente nas Forças Armadas.
Além da busca por reconhecimento legal, a comunidade LGBTQ+ militar também exige leis mais duras contra crimes de ódio. Atualmente, agressões são frequentemente enquadradas como simples "hooliganismo" e punidas de forma branda. Uma proposta para responsabilização criminal específica por atos motivados por homofobia está parada no Parlamento desde 2021.
Viktor Pylypenko, veterano e ativista, foi um dos primeiros soldados ucranianos a se declarar abertamente homossexual. Hoje, lidera uma ONG que reúne mais de 600 militares e veteranos LGBTQ+, atuando em pelo menos 59 unidades. A estimativa é que entre 5% e 10% do efetivo militar do país seja formado por pessoas LGBTQ+, embora muitos não se assumam por medo de represálias.
Apesar da resistência institucional, a sociedade ucraniana tem mostrado sinais de maior aceitação. Pesquisa do Instituto Internacional de Sociologia de Kiev, realizada em 2024, aponta que mais de 70% da população apoia direitos iguais para a comunidade LGBTQ+, enquanto o índice de rejeição vem caindo desde 2015.
Durante a Parada do Orgulho de 2025, realizada em Kiev, soldados LGBTQ+ participaram com faixas pedindo direitos iguais. O evento foi marcado por protestos de grupos religiosos e tradicionalistas, mas também arrecadou fundos para o Exército. A Igreja Ortodoxa criticou a realização da marcha próxima à Catedral de São Miguel, chamando o ato de "provocação".
Mesmo em meio à guerra, os soldados LGBTQ+ continuam lutando, não apenas contra a invasão russa, mas também por dignidade, reconhecimento e igualdade perante a lei. “Isso é importante, mesmo que haja uma onda de ódio”, afirma Roman Abrashyn.