Clare Baumhauer, de 52 anos, começou a sentir coceira na vulva ainda na infância, mas só foi diagnosticada décadas depois com líquen escleroso vulvar, uma condição de pele que afeta a região genital feminina e é frequentemente subestimada ou confundida com outras doenças. Ela relata que passou a vida sentindo coceira constante, dor intensa, bolhas, fissuras e desconforto para urinar ou caminhar, mas ouviu de médicos que tinha infecções como cistite ou candidíase. Nenhum tratamento funcionava.
Apesar de ter passado por diversos profissionais, exames ginecológicos e partos, o diagnóstico correto só veio em 2016, aos 43 anos, após uma lesão cutânea motivar a realização de uma biópsia. O resultado indicou líquen escleroso vulvar, condição que causa manchas esbranquiçadas, cicatrizes e alterações anatômicas na vulva. A doença é mais comum em mulheres acima de 50 anos e pode, em alguns casos, aumentar o risco de câncer de vulva — como aconteceu com Clare, que desenvolveu a doença.
Ela afirma que sentia vergonha de falar sobre os sintomas e por isso escondia a dor do marido, inventando desculpas para evitar relações sexuais. Ele acreditava que se tratava de uma candidíase recorrente. Clare agora lidera um grupo de apoio com mais de 13 mil mulheres diagnosticadas, e destaca que o tabu ainda impede muitas de procurarem ajuda.
Meenakshi Choksi, de 85 anos, da Índia, enfrentou situação semelhante. Desde o ano 2000, sofria com coceira, fissuras e sangramentos, mas demorou 24 anos e passou por 13 médicos até receber o diagnóstico correto. Com o tratamento à base de pomadas esteroides, os sintomas melhoraram em poucos dias, devolvendo-lhe qualidade de vida. Ela incentiva outras mulheres a falarem abertamente sobre o problema, sem medo ou vergonha.
Lúcia, brasileira de 50 anos, descobriu que tinha líquen escleroso por acaso, quando uma dermatologista percebeu alterações anatômicas durante uma consulta. Ela nunca teve coceira, mas sentia dor após relações sexuais, sempre atribuída pelo ginecologista a uma suposta “vulva apertada”. O diagnóstico esclareceu que o desconforto era causado pela fusão dos lábios e enrijecimento da pele. O próprio ginecologista admitiu nunca ter diagnosticado o problema antes, revelando o desconhecimento da condição por parte da classe médica.
Pesquisas recentes apontam que muitos médicos não foram adequadamente treinados para reconhecer doenças da pele vulvar. Segundo a médica Louise Clarke, da Universidade de Nottingham, a ausência de critérios diagnósticos claros contribui para a dificuldade em identificar o líquen escleroso. Cerca de 38% dos médicos consultados em um estudo admitiram nunca ter recebido formação específica sobre essas doenças.
O líquen escleroso não é contagioso, não está relacionado à higiene e não é causado por infecções. Acredita-se que esteja ligado a respostas autoimunes, em que o corpo ataca por engano sua própria pele. Embora não tenha cura, o tratamento com corticosteroides costuma ser eficaz para aliviar os sintomas.
A falta de informação e o tabu em torno da anatomia genital feminina fazem com que muitas mulheres convivam com a dor por anos sem saber o que têm. Especialistas alertam para a importância de procurar ajuda e de promover mais conscientização sobre o líquen escleroso, uma condição que, apesar de comum, permanece invisível para boa parte da população e até mesmo para a comunidade médica.v