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Religião
09/06/2025 20:00:00

"Excesso de política nas igrejas tem gerado desgaste entre evangélicos", avalia cientista política após dados do Censo 2022

A desaceleração no crescimento do número de evangélicos no Brasil, apontada pelos dados do Censo 2022 divulgados nesta semana, reacendeu o debate sobre as transformações no campo religioso nacional. Segundo a cientista política Ana Carolina Evangelista, diretora-executiva do Instituto de Estudos da Religião (ISER), esse movimento não representa um recuo definitivo, mas indica um desgaste em certos segmentos evangélicos, especialmente diante do aumento da politização dentro das igrejas.

De acordo com Evangelista, pesquisas qualitativas e observações empíricas apontam para um incômodo crescente entre fiéis, que afirmam não se reconhecer mais em lideranças religiosas altamente politizadas. “Há um excesso de política nos púlpitos que tem afastado parte dos evangélicos. As pessoas não se sentem representadas, tanto pelo perfil dessas lideranças quanto pelas pautas que defendem publicamente”, destacou.

A cientista também aponta que a desaceleração — embora pequena — pode ser atribuída a outros fatores, como a insatisfação de jovens de famílias evangélicas, que acabam se declarando sem religião, e à reação da Igreja Católica, que tem buscado se renovar para reconquistar fiéis. Ao mesmo tempo, o Censo revela um forte crescimento das religiões de matriz africana e do número de brasileiros que se declaram sem religião, além da continuidade na pluralização do campo religioso.

Evangelista observa que, apesar do crescimento evangélico ter sido menor do que o esperado, o grupo continua expandindo sua presença, inclusive na política, cultura e debate público. Porém, o novo retrato apresentado pelo IBGE pode ajudar a calibrar a forma como a influência religiosa é abordada na análise política e midiática.

Sobre projeções de que o Brasil se tornaria majoritariamente evangélico, a diretora do ISER mostra ceticismo, afirmando que previsões matemáticas não conseguem captar as complexidades sociais e políticas que influenciam a escolha religiosa. Ela também destaca que o Censo confirma um avanço significativo das religiões afro-brasileiras, o que reflete uma maior valorização da identidade racial e da ancestralidade, impulsionada pelo fortalecimento do debate antirracista e pelas políticas de inclusão.

A pesquisadora ressalta ainda a importância de considerar a crescente proporção de brasileiros sem religião como parte de um movimento de maior liberdade individual. “Não ter religião também é uma escolha dentro desse novo cenário de diversidade”, afirmou.

Ao comentar os dados do Censo, Evangelista celebrou o fato de o Brasil ser um dos poucos países que ainda mensuram a religião em levantamentos censitários. Contudo, demonstrou preocupação com a dificuldade do IBGE em divulgar dados desagregados sobre grupos religiosos específicos, apontando a necessidade de mais investimentos em pesquisas complementares que possam aprofundar a compreensão sobre o cenário religioso no país.