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Geral
21/05/2025 04:00:00

Gavetas mortuárias e campo de refugiados": relatório aponta violações em presídios de Pernambuco

Gavetas mortuárias e campo de refugiados

Um relatório elaborado pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, revelou graves violações de direitos humanos e problemas estruturais em unidades prisionais do estado de Pernambuco. O documento foi produzido com base em inspeções realizadas em abril de 2024 no Presídio de Igarassu, na Penitenciária Juiz Plácido de Souza, em Caruaru, e na Colônia Penal Feminina de Buíque. Os resultados foram apresentados no dia 19 de maio, em audiência pública na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe).

Durante as visitas, foram identificadas situações críticas como celas comparadas a “gavetas mortuárias”, por estarem localizadas em pavilhões estreitos, semelhantes a estantes, além da falta de ventilação, presença de mofo, ausência de água potável e superlotação. Também foi denunciada a presença de “chaveiros”, presos que, com autorização de agentes estatais, controlavam a disciplina nas unidades, inclusive aplicando punições em outros detentos.

O relatório ainda relatou a existência de mercados paralelos dentro das prisões, com comercialização de produtos por valores acima da média, além da venda de celas reformadas por valores que variavam entre R$ 5 mil e R$ 100 mil. Pequenos espaços conhecidos como “barracos” eram alugados por até R$ 500 por mês.

Presídio de Igarassu

O presídio masculino de Igarassu apresentava um índice alarmante de superlotação, com 5.424 presos ocupando 1.226 vagas, o que equivale a 442% de lotação. Segundo o MNPCT, a área externa do Pavilhão “individual”, usada para banho de sol, lembrava um “campo de refugiados”. No dia da inspeção, 41 detentos foram retirados do pavilhão “RDD e castigo”, possivelmente para ocultar irregularidades.

O relatório também denunciou a violência física, psicológica e sexual contra detentos, falta de acesso a serviços básicos e a segregação de pessoas LGBTQI+, mantidas em condições precárias e isoladas dos demais. Em fevereiro, uma operação da Polícia Federal revelou um esquema de corrupção no presídio, com o ex-secretário de administração penal de Pernambuco, André de Araújo Albuquerque, sendo filmado recebendo dinheiro do diretor da unidade.

Penitenciária Juiz Plácido de Souza

Inspecionada no dia 16 de abril de 2024, a unidade em Caruaru apresentava uma taxa de ocupação 145% acima da capacidade. Para acomodar o excedente, foram construídos pavilhões estreitos, comparados às mesmas “gavetas mortuárias” encontradas em Igarassu. As instalações apresentavam péssima ventilação, iluminação precária, forte odor de esgoto e infraestrutura deteriorada.

Presos relataram estar feridos, sem roupas adequadas e itens de higiene, passando fome e sede. Denunciaram ainda agressões por parte dos policiais penais, incluindo uso de spray de pimenta e balas de borracha. A atuação dos “chaveiros” também foi confirmada na unidade.

Colônia Penal Feminina de Buíque

Originalmente projetada para homens, a colônia foi adaptada de forma improvisada para mulheres, mas com uma ocupação 216% acima do limite. A administração da unidade, segundo o relatório, utilizava transferências para o local como forma de castigo sem decisão judicial, dificultando a visita de familiares.

O relatório aponta violações aos direitos das mulheres e da população LGBTQI+, com estrutura precária, paredes mofadas e rachadas, fios expostos, ventilação e iluminação insuficientes, e falhas graves no sistema de abastecimento de água. As presas relataram fornecimento insuficiente e de má qualidade de absorventes, causando desconforto e irritações.

Relatos de violência por parte de agentes penitenciários do sexo masculino incluíram o uso excessivo de armamentos não letais, revistas vexatórias, operações violentas com desnudamentos e castigos coletivos e abusivos em celas de isolamento.

Resposta da SEAP/PE

A Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização (SEAP/PE) informou que as recomendações feitas pelo MNPCT estão em consonância com as ações de melhoria que já estão sendo adotadas no sistema prisional. No âmbito do Plano Juntos pela Segurança, a pasta prevê a criação de 7.787 novas vagas até 2026, sendo que 1.854 já foram entregues e outras 5.933 estão em execução. Muitas dessas obras, segundo a secretaria, foram retomadas após mais de uma década de interrupção.

A SEAP também destacou o aumento das unidades fabris no sistema prisional, de 11 para 18, com expectativa de alcançar 22 até o fim de 2025. Além disso, o número de convênios para empregabilidade de detentos passou de 31 para 60. A secretaria afirmou que todas essas medidas estão alinhadas ao Plano Pena Justa, coordenado pelo Conselho Nacional de Justiça, com foco na redução das violações de direitos em estabelecimentos penais.