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Comportamento
16/05/2025 16:00:00

Janja: de Musk a Xi Jinping, o que explica as polêmicas envolvendo a primeira-dama

Janja: de Musk a Xi Jinping, o que explica as polêmicas envolvendo a primeira-dama

Em novembro de 2024, no Rio de Janeiro, durante um evento do G20, a primeira-dama Rosângela Lula da Silva, conhecida como Janja, se tornou o centro das atenções ao fazer uma declaração polêmica. Em inglês, ela proferiu um insulto direcionado ao bilionário Elon Musk, que havia sido anunciado como membro do futuro governo do presidente norte-americano Donald Trump. Diante de uma plateia majoritariamente jovem, sua fala foi aplaudida, mas também gerou críticas.

Poucos meses depois, em maio de 2025, Janja voltou aos holofotes ao interpelar o presidente chinês Xi Jinping durante uma visita a Pequim. Segundo os jornalistas Andreia Sadi e Valdo Cruz, da Rede Globo, a primeira-dama questionou Xi Jinping sobre o papel do aplicativo TikTok ao redor do mundo, um tema sensível para o governo chinês. A atitude causou constrangimento entre os presentes, que incluíam políticos brasileiros e chineses.

Esses dois episódios são apenas alguns dos momentos em que Janja chamou atenção da opinião pública, acumulando críticas de analistas políticos e membros da oposição. Diferentemente de outras primeiras-damas da história recente do Brasil, Janja adota uma postura ativa, se manifestando sobre temas polêmicos e mantendo uma presença constante ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Dentro do Palácio do Planalto, é vista como uma figura com influência política relevante.

O comportamento de Janja, no entanto, levanta questionamentos. Até que ponto ela representa o governo brasileiro, uma vez que não possui cargo público oficial? Quais são os riscos e as vantagens de o país ter uma primeira-dama tão vocal?

Para especialistas ouvidas pela BBC News Brasil, parte das críticas a Janja decorrem da ambiguidade em torno do papel da primeira-dama. No Brasil, essa posição não é formalmente prevista na Constituição, o que gera dúvidas sobre suas atribuições e limites. A Secretaria de Comunicação da Presidência da República afirmou que, como primeira-dama, Janja não ocupa cargo na administração pública, mas exerce um papel representativo simbólico.

Rosângela Lula da Silva, conhecida como Janja, é cientista social e trabalhou na coordenação de programas de desenvolvimento sustentável na Itaipu Binacional, no Paraná. Ela se tornou publicamente conhecida em 2019, quando seu relacionamento com Lula foi revelado, enquanto o ex-presidente estava preso em Curitiba. Após sua libertação, em 2022, Lula e Janja se casaram em São Paulo.

Desde o início de sua atuação como primeira-dama, Janja tem sido uma figura controversa. Em janeiro de 2023, afirmou que diversos móveis do Palácio da Alvorada haviam desaparecido durante a gestão de Jair Bolsonaro, informação que foi desmentida posteriormente, levando a uma condenação judicial para que Lula e Janja pagassem indenização à família Bolsonaro.

Além disso, durante a crise envolvendo denúncias de assédio sexual contra o ex-ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, Janja expressou apoio à ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, publicando uma foto nas redes sociais em que beija a testa de Franco.

Para especialistas, a atuação de Janja reflete uma combinação de engajamento político e militância, o que a diferencia de outras primeiras-damas, como Ruth Cardoso, que tinha uma atuação voltada para projetos sociais, e Michelle Bolsonaro, que focava em temas relacionados a pessoas com deficiência. No entanto, o protagonismo de Janja também a torna alvo de críticas, muitas vezes marcadas por misoginia e machismo.

A professora Jéssica Rivetti Melo, da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Granada, na Espanha, aponta que o escrutínio sobre Janja é reforçado pelo fato de ela romper com o estereótipo da primeira-dama "bela, recatada e do lar", conceito que se popularizou durante o governo de Michel Temer. Já a professora Luciana Santana, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), destaca que o contexto de polarização política no Brasil também contribui para as críticas dirigidas a Janja.

Mesmo diante das polêmicas, o presidente Lula tem defendido a esposa publicamente. Após o incidente com Xi Jinping, afirmou que foi ele quem iniciou a conversa sobre o TikTok e que Janja pediu a palavra por ter mais conhecimento sobre o tema. No episódio com Elon Musk, Lula também buscou amenizar a situação, pedindo que sua equipe evitasse ofensas e adotasse um tom mais conciliador.

Para as analistas ouvidas, a atuação de Janja como primeira-dama tem vantagens e desvantagens. Por um lado, ela amplia o diálogo do governo com movimentos sociais e se posiciona em questões sensíveis. Por outro, sua postura combativa pode gerar ruídos diplomáticos e políticos, tanto no cenário interno quanto externo.

A falta de uma definição clara sobre o papel da primeira-dama no Brasil é um fator que contribui para a controvérsia em torno de Janja. Segundo uma orientação da Advocacia-Geral da União (AGU), o cônjuge do presidente tem um papel simbólico e representativo, mas não pode assumir compromissos formais em nome do Estado brasileiro.

Enquanto Janja continua a se destacar por seu perfil ativo e vocal, o governo Lula lida com o desafio de equilibrar o protagonismo da primeira-dama com a necessidade de manter uma diplomacia estável e uma comunicação política coesa.