07/10/2025 19:25:39

Atualidade
03/05/2025 00:00:00

Europa enfrenta o desafio de sustentar a Ucrânia sem o apoio dos Estados Unidos

Europa enfrenta o desafio de sustentar a Ucrânia sem o apoio dos Estados Unidos

O futuro da resistência da Ucrânia contra a invasão russa pode depender cada vez mais da capacidade da Europa de agir de forma independente. Diante da ameaça do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de encerrar o apoio militar à Kiev, líderes europeus se veem obrigados a buscar alternativas para financiar e equipar o país em uma guerra de longo prazo, conforme informações da agência Associated Press (AP).

Especialistas destacam que, sem o respaldo de Washington, a permanência da Ucrânia no front dependerá da disposição política dos países europeus em mobilizar recursos financeiros, armamentos e informações estratégicas. “Se fosse simples, a Europa já estaria fazendo tudo isso sem os EUA”, disse um diplomata europeu sob anonimato.

Até o momento, os países europeus destinaram juntos aproximadamente US$ 157 bilhões (cerca de R$ 887 bilhões) em auxílio à Ucrânia — um valor US$ 26 bilhões (R$ 147 bilhões) superior ao concedido pelos Estados Unidos, segundo dados do Instituto Kiel, na Alemanha. No entanto, os EUA ainda lideram no fornecimento de ajuda militar, especialmente em tecnologias avançadas de defesa aérea e no compartilhamento de inteligência estratégica.

A substituição dos sistemas norte-americanos representa uma das maiores dificuldades. Apesar de França e Itália terem enviado equipamentos como o Aster SAMP/T, eles são insuficientes para substituir os mísseis Patriot americanos, cruciais para proteger pontos estratégicos ucranianos contra ataques com mísseis hipersônicos russos.

“Não é uma questão de qualidade, mas sim de quantidade”, observou Douglas Barrie, integrante do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos de Londres.

Outro ponto sensível é o intercâmbio de inteligência. As capacidades de satélite dos aliados europeus estão aquém das norte-americanas, e companhias privadas dos EUA, como a Maxar Technologies, chegaram a suspender temporariamente o envio de imagens para Kiev após determinações políticas.

“Há certas capacidades, como vigilância de alta precisão e reconhecimento via satélite, que apenas os Estados Unidos são capazes de fornecer”, explicou Matthew Kroenig, do centro de estudos Atlantic Council.

Apesar dos desafios, analistas acreditam que a Ucrânia ainda conseguiria resistir, embora com um custo humano muito maior. Para Thomas Gomart, diretor do IFRI, um centro francês de estudos internacionais, o problema vai além do contexto atual.

“Essa não é uma questão dos próximos dois meses ou dois anos. Trata-se dos próximos vinte anos”, destacou, ressaltando que o conflito escancarou a necessidade de uma ampla reformulação na política de defesa europeia.

O cenário se torna ainda mais delicado diante da proposta de Trump para encerrar o conflito: pressionar a Ucrânia a abrir mão de territórios tomados, como a Crimeia, em favor da Rússia. Essa sugestão confronta diretamente o princípio estabelecido no pós-Segunda Guerra Mundial, de que fronteiras não devem ser alteradas pela força.

“Foi preciso uma guerra mundial para reverter anexações de fato, e 60 milhões de vidas foram perdidas”, lembrou François Heisbourg, conselheiro especial da Fundação para Pesquisa Estratégica, com sede em Paris. “Os europeus não aceitarão isso e a Ucrânia tampouco”, completou.

As lembranças dos horrores do século passado e o receio de uma nova era de instabilidade alimentam o esforço europeu para evitar a repetição da história. Para os líderes do continente, manter a Ucrânia de pé tornou-se uma questão diretamente ligada à segurança da própria Europa. Sustentar Kiev, com ou sem a ajuda dos Estados Unidos, tornou-se uma prioridade estratégica incontornável.