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Cotidiano
29/04/2025 18:00:00

Envelhecimento da população brasileira traz novos desafios

Envelhecimento da população brasileira traz novos desafios

A funcionária pública aposentada Maria Aparecida Mendonça Leite, de 88 anos, afirma que só passou a se considerar idosa depois dos 70. "Minha vida é ocupada. Não tenho tempo de ficar muito à toa, não", diz ela, que mora sozinha em seu apartamento em Belo Horizonte. Divorciada, mãe de três filhos, avó de seis netos e bisavó de três bisnetos, Leite afirma: "Gosto assim. Sou muito independente, sempre fui".

O exemplo de Leite reflete a transformação do perfil da população idosa no Brasil. Com o envelhecimento crescente e a melhora na qualidade de vida, mais pessoas com mais de 60 anos — classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para idosos — mantêm uma rotina ativa e saudável. Entretanto, especialistas apontam que, além da saúde física e disposição, é essencial desenvolver a autoaceitação para viver bem essa etapa. "É preciso que o próprio velho ou velha se liberte do preconceito antes de todos os demais membros da sociedade", observa a historiadora Mary Del Priore, autora do livro Uma história da velhice no Brasil.

Segundo ela, a chave é assumir a idade e viver de forma plena dentro dos limites físicos, emocionais e mentais, além de se organizar para o fim da vida de modo a não se tornar um peso para a família.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2024, mostram que a proporção de idosos no país quase dobrou em vinte anos, saltando de 8,7% para 15,6%. A expectativa é que, em 2070, cerca de 38% da população brasileira terá mais de 60 anos, o que, assim como em nações desenvolvidas, leva à inversão da pirâmide etária.

Entretanto, conforme alertou o sociólogo José Pastore, professor da Universidade de São Paulo (USP), "o Brasil ficou velho antes de ficar rico". Priore ressalta que os governos precisarão encontrar maneiras de continuar financiando as aposentadorias, fortalecer o SUS e formar especialistas em gerontologia, área que estuda o envelhecimento e as condições associadas.

Atualmente, a qualidade de vida na terceira idade ainda depende muito da condição socioeconômica. Para a maioria da população pobre, o acesso a uma velhice digna continua sendo um desafio difícil de superar.

A percepção do idoso como cidadão é recente. A aposentadoria estruturada surgiu na França de Luís 14, com as "caixas dos inválidos" para marinheiros e soldados. No Brasil, uma iniciativa similar foi introduzida por Dom João 6º para os militares que acompanharam a corte em 1808. Na segunda metade do século 19, surgiram as "caixas de seguros mútuos", embrião da aposentadoria privada no país.

A previdência pública brasileira começou oficialmente em 1888, de forma excludente, atendendo apenas setores considerados estratégicos para o Império. O marco da previdência social no país foi a Lei Eloy Chaves, de 1923, que assegurava benefícios aos ferroviários — profissionais essenciais para o escoamento da produção nacional. Segundo a socióloga Natalia Negretti, a aposentadoria brasileira "já nasceu desigual", tanto pela limitação de quem era atendido quanto pela noção de que apenas quem havia trabalhado merecia proteção.

Dois momentos importantes para o reconhecimento dos direitos dos idosos foram a Constituição de 1988, que deu força à questão da velhice, e o Estatuto do Idoso, promulgado em 2003, consolidando direitos para brasileiros com mais de 60 anos.

Enquanto isso, barreiras sociais e culturais persistem. Maria Aparecida Mendonça Leite, apesar de manter uma vida ativa com atividades como pilates, leitura, viagens e encontros espirituais, reconhece limitações que surgem com o tempo, como a decisão de parar de dirigir em estradas.

O envelhecimento da população torna mais visível o etarismo — preconceito contra pessoas mais velhas —, que contribui para o isolamento social. Segundo a psicóloga e socióloga Gisela Grangeiro da Silva Castro, da Escola Superior de Propaganda e Marketing, a sociedade ainda é "jovencêntrica", tratando o envelhecimento como algo negativo e impondo padrões de comportamento e aparência aos idosos.

Além disso, a invisibilização dos mais velhos persiste, mesmo com o crescimento de sua importância demográfica e econômica. Melhorias na inclusão, como a adaptação de caixas eletrônicos e aplicativos para idosos, são necessárias para reduzir essas barreiras.

Para Mary Del Priore, "a velhice está no olhar da juventude. Ela é que determina quem ou o que é velho ou não", resumindo o desafio cultural de transformar a percepção sobre o envelhecimento no Brasil.



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