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Comportamento
09/04/2025 16:00:00

Incel: o submundo misógino que se espalha pelo Brasil e preocupa especialistas

Incel: o submundo misógino que se espalha pelo Brasil e preocupa especialistas

A série Adolescência, lançada em março, expôs ao público o universo dos chamados incels — abreviação de "involuntary celibates", ou celibatários involuntários — um grupo virtual formado majoritariamente por homens heterossexuais que se consideram incapazes de atrair interesse amoroso e sexual. Com forte presença digital, especialmente entre adolescentes e jovens adultos, essas comunidades se alimentam de frustração, baixa autoestima e acabam cultivando discursos de ódio, especialmente contra as mulheres.

No Brasil, essa realidade já se faz presente. Segundo pesquisadores, os fóruns e canais incel cooptam adolescentes que enfrentam dificuldades de socialização e estão constantemente expostos a redes sociais e jogos online. O movimento, que surgiu ainda nos anos 1990 com uma iniciativa inocente de uma jovem canadense em busca de conexão, foi gradualmente dominado por homens frustrados e se transformou em um espaço de disseminação de ideologias misóginas e extremistas.

Misoginia e radicalização em ascensão

Os incels atribuem seu insucesso amoroso à aparência física, falta de dinheiro ou habilidades sociais, e culpam as mulheres por isso. Alimentando-se de teorias distorcidas, retratam as mulheres como interesseiras, frias e promíscuas, enquanto idealizam arquétipos masculinos como o “Chad” — símbolo do homem popular e desejado. As mulheres são chamadas de “Stacy”, representando, em sua visão, o estereótipo da mulher superficial e inalcançável.

Esse vocabulário próprio inclui ainda referências como “redpill” (pílula vermelha), que indica o despertar para a suposta realidade das relações sociais e de gênero segundo a lógica incel, e “blackpill” (pílula preta), que representa uma versão ainda mais radical e pessimista dessa ideologia. No Brasil, esses termos já circulam amplamente em espaços como Discord, TikTok, Instagram e YouTube, com adaptações locais que incluem linguagem ofensiva direcionada a mulheres, inclusive as que se dizem submissas.

Conexão com a extrema direita e casos extremos

Pesquisas apontam que, além da misoginia, há uma conexão direta entre as comunidades incel brasileiras e a extrema direita, com referências frequentes a figuras como Olavo de Carvalho e episódios trágicos, como o assassinato de Eloá Cristina Pimentel em 2008, citado em fóruns incel como justificativa para violência contra mulheres que rejeitam seus parceiros.

Um relatório produzido para o Ministério dos Direitos Humanos em 2023 classificou os grupos masculinistas, incluindo os incels, como uma das principais fontes de discurso de ódio e radicalização online no Brasil. Já em 2022, o Serviço Secreto dos Estados Unidos classificou o extremismo incel como uma ameaça nacional.

A origem e o impacto global

O termo incel surgiu a partir de um projeto criado por uma jovem canadense nos anos 1990, que relatava suas dificuldades amorosas em busca de conexão com outros solitários. No entanto, a proposta foi distorcida e acabou virando base de um movimento global com forte teor de ódio. A criadora, Alana, chegou a comparar a apropriação de sua ideia ao uso destrutivo de uma descoberta científica, como a fissão nuclear sendo transformada em arma.

Relatórios da União Europeia apontam que os sentimentos de inferioridade entre os incels variam de país para país, com comunidades na Alemanha, Suécia e França relatando insatisfação com padrões de beleza ou avanços feministas. O crescimento dessas comunidades foi acompanhado pela construção de uma ideologia própria, com heróis e vilões imaginários.

Desafios e alternativas diante do extremismo

Embora nem todos os incels sejam violentos, os especialistas alertam para o potencial de radicalização e atos extremistas. A abordagem mais eficaz, segundo estudiosos, não está apenas em medidas de segurança, mas também em ações voltadas à saúde mental. Pesquisas indicam que muitos incels sofrem de depressão, ansiedade, isolamento e traços de autismo, o que os torna ainda mais suscetíveis à influência desses grupos.

Estudos sugerem a criação de programas que ofereçam apoio psicológico personalizado e espaços alternativos de acolhimento para homens e jovens discutirem temas como rejeição, vergonha e relacionamentos de maneira saudável e construtiva.

Apesar da crescente preocupação, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania ainda não se pronunciou sobre ações específicas para lidar com o avanço desse fenômeno no Brasil.



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