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Mundo
31/03/2025 16:00:00

Expansão de covas clandestinas intensifica crise de desaparecimentos no México

Expansão de covas clandestinas intensifica crise de desaparecimentos no México

A recente descoberta de sapatos, pedaços de roupas e ossos humanos carbonizados em uma área conhecida como “campo de treinamento” do narcotráfico em Teuchitlán, no México, representa mais um capítulo trágico na crescente crise dos desaparecimentos no país. O local, utilizado por um cartel como centro de extermínio, se soma a um preocupante cenário marcado por centenas de cemitérios clandestinos espalhados pelo território mexicano.

Voluntários encontraram diversos pertences e restos mortais após uma denúncia anônima recebida em meados de março. A revelação acentuou ainda mais a crise nacional. Seis meses antes, a Guarda Nacional havia iniciado buscas na região, mas as investigações foram encerradas sem grandes avanços. Diante disso, a presidente Claudia Sheinbaum determinou que se investigue uma possível omissão dos agentes envolvidos.

Fenômeno dos desaparecimentos se agrava há décadas

Segundo Aranzazú Ayala Martínez, da organização Quinto Elemento Lab, o caso de Teuchitlán “abriu os olhos do mundo” para a realidade dos desaparecimentos no México, uma tragédia que se intensifica há anos. Ela ressalta que há mais de uma década famílias buscam por desaparecidos, organizando protestos e mobilizações, mas continuam sendo ignoradas. De acordo com ela, todos os níveis do governo compartilham responsabilidade nessa crise humanitária.

Dados oficiais apontam para mais de 354 mil desaparecidos

O Registro Nacional de Pessoas Desaparecidas e Não Localizadas (RNPDNO) contabiliza mais de 354 mil desaparecimentos desde 1952, sendo que mais de 126 mil pessoas seguem sem paradeiro conhecido. Outras 228 mil foram localizadas, vivas ou mortas. Os dados são alimentados por promotorias estaduais, da Cidade do México e pela Procuradoria Geral da República.

Michael W. Chamberlin, da Consultora Solidaria SC, alerta para inconsistências entre os registros estaduais e o banco de dados nacional, com diferenças que podem chegar a até 3,5 vezes. Ele também aponta a possibilidade de subnotificação significativa, considerando que, em 2024, cerca de 92,9% dos crimes não foram denunciados ou sequer investigados, conforme levantamento do Instituto Nacional de Estatística e Geografia do México.

Crise forense atinge necrotérios e serviços médicos

Ayala Martínez também destaca outro aspecto crítico: a crise forense. Há atualmente cerca de 70 mil corpos não identificados nos necrotérios e serviços médicos do país, reflexo direto da epidemia de desaparecimentos.

Segundo Chamberlin, os desaparecimentos começaram nas décadas de 1960 a 1980 como forma de repressão a dissidentes políticos armados. Na época, cerca de 580 casos foram registrados oficialmente, mas organizações sociais estimam que o número real ultrapassava mil. Desde o início da guerra contra as drogas em 2006, o número saltou para 126 mil. Apenas nos primeiros cem dias da atual gestão de Sheinbaum, 4 mil novos casos foram registrados.

Levantamento revela milhares de valas clandestinas

Como parte do projeto “Para onde vão os desaparecidos?”, a jornalista Ayala Martínez coordenou a criação do primeiro mapa de covas clandestinas do país, em 2018. A ausência de dados públicos oficiais leva a sociedade civil a assumir essa responsabilidade. A Universidade Ibero-Americana (Ibero), por exemplo, mantém um banco de dados baseado em reportagens e informações locais.

De 2006 a maio de 2024, foram localizadas 3.298 covas clandestinas, com metade das descobertas concentradas nos estados de Guerrero, Veracruz, Sonora, Guanajuato e Jalisco. Este último, apesar de ter menos locais identificados, lidera em número de corpos encontrados: 1.128.

Segundo Andrea Horcasitas Martínez, da Ibero, os métodos de ocultação variam: corpos abandonados em florestas nos arredores da Cidade do México, nas montanhas de Chihuahua, no deserto de Sonora ou em locais de extermínio em Tamaulipas onde restos são incinerados.

Desaparecimentos forçados são crime desde 2017

A legislação mexicana criminalizou os desaparecimentos forçados por agentes do Estado ou indivíduos apenas a partir de 2017. Antes disso, casos de sequestro só eram investigados se houvesse exigência de resgate. A nova lei criou um sistema nacional com comissões estaduais e uma comissão federal de busca, mas, segundo Chamberlin, na prática esse sistema é ineficaz. As investigações são tratadas de forma isolada e há constante negação da gravidade da crise por parte das autoridades políticas.

Ayala Martínez reforça que a situação só se agrava, com corpos se acumulando e o surgimento de novos desafios, como o desaparecimento de imigrantes em rotas clandestinas pelo território mexicano. Esses casos ampliam ainda mais a complexidade de uma crise que parece longe de uma solução.



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