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Acidente
06/03/2025 11:00:00

Jurista elenca desafios para reduzir violência contra a mulher

Jurista elenca desafios para reduzir violência contra a mulher

Embora o Brasil possua uma legislação considerada exemplar no combate à violência contra a mulher e o tema tenha ganhado maior espaço na mídia nos últimos anos, os índices de feminicídio, estupro e outras formas de agressão continuam a crescer. De acordo com o último Anuário de Segurança, divulgado em julho do ano passado, 1.467 mulheres foram assassinadas por motivos de gênero em 2023, número que representa o maior registro desde 2015. O estudo também apontou aumento nos casos de agressões em contexto de violência doméstica (9,8%), ameaças (16,5%), perseguição e stalking (34,5%), violência psicológica (33,8%) e estupro (6,5%).

Apesar de críticas que associam a violência contra a mulher à ineficácia das leis, a jurista Jacqueline Valles, mestre em Direito Penal e integrante da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim), destaca que o país enfrenta um paradoxo: possui leis avançadas, como a Lei Maria da Penha, mas falha gravemente na sua aplicação. "Temos legislações sólidas, porém o abismo entre o que está previsto e o que acontece na prática é enorme. Medidas protetivas que deveriam ser entregues com urgência acabam levando dias ou semanas, deixando as vítimas desprotegidas", afirma.

A jurista cita o assassinato da jornalista Vanessa Ricarte, que procurou ajuda em uma delegacia de Campo Grande antes de ser morta, como exemplo claro das falhas estruturais que continuam a colocar vidas em risco no país. Segundo ela, o problema vai além do Direito Penal e envolve questões estruturais profundas. "Não se trata apenas de vontade política, mas da falta de recursos humanos. Delegacias, juizados e serviços de apoio operam sobrecarregados, sem pessoal suficiente para atender à crescente demanda", alerta.

Jacqueline também destaca o impacto do machismo estrutural como fator central para o aumento da violência de gênero, reforçando que as soluções precisam ir além da punição criminal. “Estamos fadados ao fracasso se continuarmos tratando a violência doméstica somente pelo viés penal. É indispensável investir em educação para desconstruir estereótipos de gênero e incentivar relações baseadas na igualdade”, defende.

Machismo estrutural dificulta atendimento às vítimas

No dia a dia do atendimento às vítimas, Jacqueline observa como o machismo estrutural interfere no acolhimento e na condução das denúncias. “Muitas mulheres não se sentem ouvidas ou respeitadas quando procuram a polícia. Há uma dificuldade enorme, por parte de servidores públicos, em reconhecer violências que não deixam marcas visíveis, apesar de essas condutas estarem previstas em lei. Isso desestimula as vítimas a buscarem ajuda”, comenta.

Ela reforça que a notificação e a investigação são etapas essenciais para o enfrentamento desse tipo de crime e defende a necessidade de garantir segurança e confiança para que mulheres denunciem seus agressores. “Precisamos de um treinamento adequado para que as autoridades saibam identificar e acolher vítimas de violências menos visíveis, como a psicológica e a patrimonial, além de garantir um atendimento qualificado para aquelas que sofreram agressões”, completa.

Atendimento multidisciplinar como estratégia de proteção

Para a jurista, ampliar o atendimento multidisciplinar às vítimas é uma estratégia fundamental para garantir apoio completo e eficaz. Ela cita como exemplo a Casa da Mulher Brasileira, que oferece atendimento integral e reúne diversos serviços em um único espaço. “É um modelo eficiente, mas depende de equipes suficientes e preparadas para garantir proteção e suporte adequados”, explica.

Jacqueline reforça que não é possível enfrentar a violência contra a mulher sem uma abordagem ampla, que vá além das punições criminais. “Cada vida perdida em razão da violência de gênero representa uma falha coletiva da sociedade e das instituições. Precisamos de respostas integradas e efetivas para proteger essas mulheres e prevenir novas tragédias”, conclui.