Fonte: Agência Senado
Especialistas em educação e psicologia consideram a lei federal que proíbe o uso de celulares por estudantes nas escolas um passo importante, mas alertam que é apenas o início no combate ao vício digital, um problema que afeta a sociedade de forma mais ampla.
O pedagogo Paulo Fochi, professor e pesquisador da Unisinos, acredita que essa proibição nas escolas é uma medida de "redução de danos". Contudo, ele destaca a necessidade de leis que regulem as big techs, responsáveis pelo design viciante das redes sociais:
— As redes sociais são deliberadamente projetadas para prender nossa atenção, induzindo à produção de dopamina e criando uma falsa sensação de afeto e conexão. No entanto, essas plataformas não oferecem nada disso, na realidade.
Fochi ainda aponta que as empresas se beneficiam da desinformação, do ódio e da intolerância:
— As big techs lucram com o nosso tempo online e com fake news. Prova disso é a recente flexibilização das regras de checagem de fatos pela Meta, que aumenta o risco de desinformação. O poder público precisa agir com normas que combatam os prejuízos causados pela falta de regulação digital.
O pedagogo ressalta que ensinar educação digital nas escolas é importante, mas insuficiente para enfrentar o problema:
— A escola pode ensinar sobre o funcionamento da internet e como identificar informações falsas, mas não pode evitar que o design viciante das redes sociais afete os alunos, causando fissura e transtornos.
Ele compara as redes sociais a drogas, argumentando que a solução passa por regular as empresas que distribuem esse "vício digital".
O psicólogo Elton Hiroshi Matsushima, da UFF, também defende a regulação urgente das big techs e sugere campanhas educativas, como as realizadas contra o cigarro e o álcool:
— É necessário conscientizar sobre os malefícios do uso exagerado dos celulares, especialmente devido à competição desleal entre redes sociais e professores, prejudicando o aprendizado.
A lei que restringe o uso de celulares foi aprovada pelo Senado em dezembro e sancionada pelo presidente Lula em janeiro. A medida, válida para escolas públicas e privadas, prevê que os dispositivos permaneçam desligados e guardados, exceto em casos específicos, como uso pedagógico ou por questões de saúde.
A restrição visa, entre outros benefícios, estimular a criatividade, o pensamento crítico, a interação social e a participação em atividades culturais e esportivas. A experiência de outros países como França, Espanha e Finlândia, que já adotaram medidas semelhantes, também serviu de base para a decisão.
Matsushima explica que aplicativos e redes sociais utilizam algoritmos para capturar atenção, oferecendo recompensas imediatas para manter os usuários conectados. Ele alerta que esse mecanismo prejudica o desenvolvimento cognitivo, emocional e social, especialmente em crianças e adolescentes, além de promover comportamentos automatizados, imediatismo e dificuldade em lidar com frustrações.
Entre os sinais de dependência digital estão baixa concentração, irritabilidade, dificuldades acadêmicas e sintomas como ansiedade e depressão. Para evitar o problema, os pais devem dar o exemplo e supervisionar o uso das tecnologias, respeitando limites recomendados pela Sociedade Brasileira de Pediatria.
Matsushima conclui destacando a necessidade de mudanças estruturais na sociedade para que as famílias tenham mais tempo para acompanhar o desenvolvimento das crianças, evitando a terceirização da educação para a escola.
— Reduzir a jornada de trabalho, sem reduzir salários, seria essencial para que os pais desempenhem seu papel na formação de cidadãos críticos e conscientes, capazes de lidar com os desafios do futuro.