Enquanto as autoridades tentam restaurar a energia em Cuba, após um apagão que mergulhou 10 milhões de cubanos na escuridão desde quinta-feira (17), a população expressa crescente frustração com as ações do governo.
“Sinto muita frustração, decepção e desesperança”, diz a cubana Tania Ramírez, 39 anos, enquanto caminha sozinha pelo Malecón, o calçadão de oito quilômetros ao norte de Havana. Na noite de sexta-feira, ele decidiu sair de casa para aliviar o estresse gerado pela gigantesca queda de energia que deixou toda a ilha às escuras.
“Não é só a falta de electricidade, mas também de gás e de água”, afirma esta dona de casa, 11 horas depois de a central Antonio Guiteras ter parado de funcionar e provocado o colapso do sistema eléctrico do país. Sombrio, Ramírez afirma que “a sua geração quer continuar a acreditar” na revolução lançada por Fidel Castro (1926-2016), mas que “a sua resistência tem limites”.
O Diretor Geral de Energia Elétrica do Ministério de Energia e Minas, Lázaro Guerra, disse que o governo está trabalhando para restabelecer o serviço o mais rápido possível. Ao anoitecer, as únicas luzes que iluminavam a capital, com dois milhões de habitantes, eram as dos hotéis, dos hospitais e de algumas empresas privadas com os seus geradores. As ruas estavam praticamente vazias, sem transporte público e semáforos fora de serviço.
O presidente cubano Miguel Díaz-Canel disse em sua história sobre esta eventualidade energética muito sensível.
Na quinta-feira, Díaz-Canel utilizou a mesma rede social para sublinhar que a ilha enfrenta uma “emergência energética” devido a problemas com o fornecimento de combustível para alimentar o seu sistema energético, devido ao reforço do embargo que Washington impõe à ilha desde 1962. "Dói muito".
Em algumas ruas da cidade, pequenos grupos de pessoas podem ser vistos ligando seus celulares e conversando com familiares e amigos. Alguns saíram de casa para se refrescarem no calor da noite, com temperaturas oscilando em torno de 30°C.
“Temos um filho pequeno e moramos num prédio que não oferece as melhores condições. Temos que descer e sentar aqui”, disse Betsabé Valdés, 40 anos, com expressão preocupada, no Paseo del Prado. A maior preocupação de Valdés era perder a comida que tinha na geladeira se a energia não fosse restaurada logo.
“Tudo desmoronou”, diz o trabalhador autônomo. “Tudo isso me dói muito”, enfatizou Valdés.
“O que nos interessa é ter eletricidade e não a explicação que nos podem dar”, disse o professor Pablo Reve, 61 anos. Ele enfrentou o apagão numa situação menos desagradável que outros cubanos. “Quando faltou energia, começamos a jogar dominó e até rimos da nossa sorte”, disse Reve. “Seguir em frente é o que resta”, acrescentou, resignado.
Na quinta-feira, Cuba tinha um défice de produção de eletricidade de quase 50%. Perante esta situação, o Primeiro-Ministro Manuel Marrero suspendeu todas as atividades profissionais não essenciais nas empresas públicas, para dar prioridade ao sustento das famílias.
Na ilha, a eletricidade é produzida por oito centrais antigas, que em alguns casos estão avariadas ou em manutenção, além de sete centrais flutuantes – que o governo aluga a empresas turcas – e geradores (geradores).
Mas todas estas infra-estruturas, na sua maior parte, necessitam de combustível para funcionar. Os cortes são frequentes.
O país atravessa actualmente a sua pior crise em três décadas, com escassez de alimentos, medicamentos e cortes crónicos de energia, que limitam o desenvolvimento da atividade produtiva.
“Uma estratégia bem definida”
As autoridades da União Elétrica indicaram que a restauração da energia na ilha será um processo gradual. O primeiro passo será atingir um nível mínimo de produção de energia, que era zero no momento do colapso. Essa geração básica será então utilizada para abastecer usinas e usinas flutuantes em diversas regiões do país, mas que inicialmente beneficiará apenas 19 mil pessoas. “Temos uma estratégia bem definida” e “respeitamos todos os protocolos para fazê-lo com segurança”, afirmou o ministro de Energia e Minas Vicente de la O Levy.
A dona de casa Tania Ramírez é mais pessimista. “A solução parece distante” e “não há melhorias imediatas no horizonte, pelo contrário”, afirma.