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Guerra
14/07/2024 00:00:00

Rússia passa da retórica à ação e deve ser levada a sério quando ameaça usar seu arsenal nuclear

Moscou cogita flexibilizar a doutrina nuclear, realiza manobras militares com armas táticas e convence analistas de que o perigo é real


Rússia passa da retórica à ação e deve ser levada a sério quando ameaça usar seu arsenal nuclear

A Referência

Desde o início da guerra da Ucrânia, sempre que se sente acuada a Rússia trata de lembrar ao mundo que tem o maior arsenal nuclear. As ameaças de usar as armas de destruição em massa não são direcionadas apenas a Kiev, mas também aos aliados ocidentais. E têm sido recebidas com certa condescendência, vistas como mera bravata. Nos últimos meses, entretanto, Moscou passou a adotar medidas mais práticas, ao cogitar flexibilizar sua doutrina nuclear, facilitando assim o uso do armamento, e ao realizar exercícios militares com armas táticas. Diante de tal cenário, menos abstrato e mais ameaçador que o habitual, analistas afirmam que é hora de levar a questão a sério.

“Ao contrário da perspectiva de que as ameaças nucleares russas são vazias e ineficazes, as armas nucleares desempenharam um papel essencial em permitir a guerra da Rússia contra a Ucrânia”, afirma Giles David Arceneaux, professor assistente de ciência política na Universidade do Colorado e especialista em questões de segurança internacional com foco na questão nuclear.

Em artigo para o Boletim dos Cientistas Atômicos, da Universidade de Chicago, que estuda questões científicas de segurança global, ele avaliou que as ameaças russas “dissuadiram ou desaceleraram o apoio ocidental” à Ucrânia, um “efeito reconhecido pelo Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan.” E que “a Rússia alavancou com sucesso seu arsenal nuclear para conduzir sua invasão convencional da Ucrânia.”

Na visão de Christopher S. Chivvis, que tem mais de duas décadas de experiência em questões de política externa dos EUA e em desafios de segurança nacional, a questão é ainda mais delicada, e o risco, real. Ele se manifestou em artigo para o jornal The Guardian.

“Não é difícil imaginar circunstâncias em que usar uma arma nuclear pode parecer a escolha racional do ponto de vista do Kremlin, especialmente se confrontado com uma rápida reversão dos ganhos pelos quais a Rússia pagou caro, ou se confrontando com uma escalada ocidental que somente armas nucleares podem igualar”, disse ele, que mais recentemente atuou como oficial de inteligência nacional dos EUA para a Europa.

As recentes manobras militares russas apresentaram um cenário compatível com aquele projetado por Chivvis. Tais exercícios não são raros, mas geralmente envolvem as armas nucleares estratégicas, aquelas com alto poder de destruição, como as que os EUA usaram contra Hiroshima e Nagasaki em 1945. Entretanto, nos recentes exercícios, Moscou usou armas nucleares táticas, menos poderosas e voltadas a neutralizar posições inimigas. Para os analistas, este cenário é mais preocupante porque o uso do armamento teria efeitos decisivos, embora menos devastadores.

“Ao treinar abertamente com armas nucleares táticas que são projetadas especificamente para uso nuclear em campo de batalha e incorporar Belarus aos exercícios, a Rússia se aproximou do limiar nuclear e abriu novos caminhos para a escalada nuclear”, diz Arceneaux em seu artigo.

Outra movimentação que tem sido acompanhada de perto pelo Ocidente é a possibilidade de a Rússia mudar as regras de uso de suas armas de destruição em massa.

O presidente Vladimir Putin sugeriu essa hipótese em junho, no Fórum Internacional Econômico de São Petesburgo. Na ocasião, ele chamou a doutrina de uma “ferramenta viva” que está sujeita a alterações e sugeriu que uma eventual alteração nas regras nucleares estaria atrelada à pressão que Moscou alega sofrer do Ocidente.

O vice-ministro das Relações Exteriores Sergei Ryabkov reforçou tal possibilidade ao dizer, também no mês passado, que o país não descarta mudar sua doutrina nuclear.

Atualmente, a doutrina nuclear russa prevê o uso de seu arsenal em resposta a um eventual ataque nos mesmos moldes realizado por outra nação ou para reagir a uma situação extrema que coloque a própria existência do Estado russo em risco.

Porém, sob o argumento de reagir ao que chamou de “ações de escalada” por parte dos EUA e da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), Ryabkov disse que o conjunto de regras pode ser flexibilizado, sem dar maiores detalhes sobre as mudanças que seriam implementadas.

A eventual mudança nas regras daria a Moscou o direito legal de cumprir as ameaças, algo que foi destacado por Samuel Ramani, doutor em relações internacionais e especialista em questões russas. Em seu perfil na rede social X, antigo Twitter, ele afirmou em junho que Putin não depende de uma agressão para eventualmente usar seu arsenal nuclear.

“Uma suposição popular no Ocidente é a de que o uso de armas nucleares pela Rússia é fundamentalmente reativo. Ataque a Crimeia, o risco aumenta; ataque o território russo propriamente dito, o risco cresce ainda mais”, disse ele, discordando de tal argumento. “A próxima vez que a Rússia considerar seriamente o uso de armas nucleares pode não ocorrer em um momento de crise. Em vez disso, pode ocorrer em um momento de estagnação prolongada nas linhas de frente.”

Ramani também fez uma projeção catastrófica: “A lógica de que a Rússia poderia usar armas nucleares para vencer a guerra como os EUA fizeram em 1945 está ganhando força.”

 



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