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11/06/2024 21:00:00

PEC das Praias: com Alagoas no meio da polêmica, entenda possíveis impactos jurídicos e ambientais da mudança


PEC das Praias: com Alagoas no meio da polêmica, entenda possíveis impactos jurídicos e ambientais da mudança

Cada Minuto

A polêmica Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 3/2022, que ficou conhecida como PEC das praias ou PEC da “privatização das praias”, esteve no centro das discussões nos últimos dias, inclusive em Alagoas, que possui um extenso litoral, com construções diversas em “terrenos de marinha”. Aprovada na Câmara dos Deputados, a PEC tramita agora no Senado Federal.

Obras e imóveis construídos na costa marítima e na margem dos rios e lagos até onde sofre influência das marés, localizada na faixa de 33 metros, são considerados terreno de marinha, foco da polêmica proposta. Conforme dados do governo federal, há, no país, em torno de 500 mil imóveis assim classificados.

Mas, afinal, quais os riscos de uma possível privatização das praias, caso a proposta que rendeu até uma briga pública entre o jogador Neymar e a atriz Luana Piovani - também com direito a “participação especial” de Alagoas no contexto - seja aprovada no Congresso Nacional?

Por um lado, especialistas defendem que a mudança pode privatizar não necessariamente as praias, mas o acesso a elas, como já ocorre hoje em algumas localidades. Por outro lado, garantem a impossibilidade que tal privatização aconteça.

“Interpretação equivocada”

Ouvida pelo CadaMinuto, Camila Maria Dias, advogada especialista em direito imobiliário, defende que não existe o risco, com a aprovação da PEC, de trechos de praias serem “privatizados”.

Segunda ela, conforme a Lei 7.661/97 que dispõe sobre o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, entende-se por praia a área coberta e descoberta periodicamente pelas águas, acrescida da faixa subsequente de material detrítico, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou, em sua ausência, onde comece outro ecossistema.

“Os imóveis de marinha, ainda que a beira mar, não se confundem com as praias. Essa interpretação equivocada pode ter se originado em razão dos incisos III e IV do artigo 1º, uma vez que traz a possibilidade de transferência do domínio pleno em caráter oneroso para os atuais ocupantes e foreiros com cadastro regular perante a Secretaria do Patrimônio da União, bem como aos ocupantes irregulares que comprovem que a ocupação tenha ocorrido em pelo menos cinco anos antes da data de publicação da Emenda”, explicou.

A especialista prosseguiu esclarecendo que os imóveis ocupados por particulares possuem matrículas individualizadas registradas em cartório, com a definição das suas respectivas áreas e perímetros, a grande maioria já georreferenciado pela própria SPU, “sem jamais adentrar ao espaço da praia”.

Camila reforça ainda que as praias são bens públicos de uso comum do povo, conforme previsto no artigo 10 da Lei 7.661/97 que dispõe sobre o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro. “Este artigo não sofrerá alterações. Ninguém está autorizado a fechar a praia, que é patrimônio da União e continuará sendo, conforme disposto no artigo 1º, inciso I do projeto, até mesmo por questões de defesa nacional”.

Conforme a advogada, a PEC tem por objetivo revogar o inciso VIII do artigo 20 da Constituição Federal e §3º do artigo 49 dos ADCT, a fim de que os estados, municípios, ocupantes e aforados possam adquirir o domínio pleno dos imóveis de propriedade da União. “A principal modificação da proposta é que os ocupantes e foreiros poderão realizar a aquisição onerosa do domínio pleno, dispensando o pagamento dos tributos anuais de foro ou taxa de ocupação, bem como a necessidade de pagamento de laudêmio em situações de transferência”.

Camila Dias, advogada

Poder Público, setor turístico e meio ambiente

Perguntada pela reportagem sobre os prós e contras da PEC, principalmente em relação à população em geral, Camila explicou que a mudança beneficiaria, primeiramente, os estados e municípios, no sentido de que em seu artigo 1º, §1º, inciso I, passa o domínio pleno de forma gratuita a todos os imóveis que a administração direta ou indireta que tais entes já estejam ocupando.

“Há também a questão da incidência de IPTU nos imóveis de marinha, que é questão controversa no meio judiciário e está para ser julgada no Supremo Tribunal Federal. Um dos argumentos para a aprovação é prestigiar a arrecadação dos municípios”, completou.

Segundo a advogada, a proposta beneficia diretamente todos os ocupantes e foreiros de imóveis da União, pois com a aquisição do domínio pleno, ainda que onerosa, passam a ter plenos poderes sobre o bem imóvel, sendo dispensados do pagamento anual de taxa de ocupação ou foro, bem como de laudêmio nos casos de transferência, além da ampliação de crédito para financiamento bancário nas operações de reforma e de compra e venda, por exemplo.

“Quem também está otimista é o setor hoteleiro e turístico, que ganha segurança jurídica para realização de investimentos e implantação de empreendimentos em toda Costa litorânea. Para além dos benefícios para os setores específicos, é interessante observar que a proposta retira uma grande quantidade de imóveis do monopólio estatal que é o maior concentrador de propriedades no país para particulares, atendendo de forma objetiva a função social da propriedade. Desde a Lei de Terras, o Brasil possui uma desigualdade social discrepante na distribuição de terras. A PEC não resolve a problemática, mas é bastante significativa no sentido de desestatizar as propriedades que a União não faz uso”, analisou Camila.

Em relação aos pontos negativos, ela entende que a ampliação do crédito pode favorecer a implantação de empreendimentos turísticos que, sem a realização de um prévio Estudo de Impacto Ambiental e da elaboração da Elaboração de um Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos, podem vir a afetar o ecossistema e a biodiversidade de algumas regiões.

“Mas é importante frisar que isto não é algo imposto pela PEC e que não deve ser fator impeditivo para a expansão do turismo, setor que emprega milhares de pessoas no nordeste. A sustentabilidade é composta por um tripé que engloba as questões ambientais, sociais e econômicas, de modo que o progresso urbanístico pode sim estar alinhado à proteção do meio ambiente, desde que os órgãos ambientais sejam fiscalizadores e diligentes”, concluiu.

Especulação imobiliária e impactos “severos”

Em Alagoas, a vereadora Teca Nelma se manifestou publicamente contrária à PEC, levando o assunto à discussão na Câmara Municipal de Maceió (CMM). “Essa PEC apresenta uma grande ameaça pro Brasil, sobretudo para uma cidade como Maceió, conhecida mundialmente por suas belas praias, que é um patrimônio natural de todo o maceioense”, afirmou.

Para a vereadora, a mudança pode agravar “a ação predatória da especulação imobiliária na capital, com destaque para os bairros do Litoral Norte, como Guaxuma, Garça Torta, Riacho Doce, Pescaria e Ipioca, historicamente ocupados por comunidades tradicionais e de baixa renda”.

“A privatização da praia, objetivando a construção de prédios e empreendimentos de luxo, só traz como consequência a expulsão dessas comunidades locais de seus territórios ou o impedimento do acesso devido à privatização das terras”, ressaltou em discurso na CMM.

 

 

Já em entrevista à imprensa nacional, a plataforma Painel Mar, citou exemplos já existentes do que entendem que pode ocorrer em várias partes do país, caso a mudança seja aprovada.

“Em Balneário Camboriú (SC), a supressão das dunas e praias por calçadões e avenida beira-mar causou severos impactos, como a diminuição da área de lazer da praia central. A privatização de lucros e a socialização de prejuízos acarretou custos milionários para o alargamento da praia, custeados por empresários locais, mas que a grande maioria dos municípios brasileiros não possuem condições financeiras sequer de realizar um projeto desta natureza. Outro exemplo é o que vem ocorrendo na cidade de Atafona, litoral norte do Estado do Rio de Janeiro, onde o mar avança em média 2,7 metros por ano, mas já chegou a aumentar até oito metros em alguns anos, como entre 2008 e 2009, causando diversos prejuízos e transformando a cidade em uma cidade fantasma", explicou a entidade.

Briga de famosos

A PEC 3/2022 rendeu também um “barraco” público entre Luana Piovani e Neymar. A atriz acusou o jogador de se beneficiar caso a proposta seja aprovada, já que existe um projeto bilionário dele, em conjunto com uma incorporadora, para construção de um condomínio de luxo à beira-mar, entre os litorais norte de Alagoas e Sul de Pernambuco.

A atriz chamou Neymar de “péssimo cidadão” e foi chamada de “louca” por ele. Nas redes sociais, o jogador emitiu uma nota oficial negando qualquer relação entre o empreendimento e a PEC.



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