BBC Brasil - A partir deste mês, o governo brasileiro irá
disponibilizar no Sistema Único de Saúde (SUS) a terapia PrEP, que, por meio de
um comprimido por dia, previne a infecção pelo HIV. O remédio, que tem efeitos
colaterais, será reservado para casos específicos dentro de grupos de
vulnerabilidade, como profissionais do sexo, pessoas transexuais, casais
sorodiferentes - quando apenas um deles possui o vírus - e homens que fazem
sexo com homens.
PrEP é a sigla para profilaxia
pré-exposição, que impede a multiplicação do vírus nas células de defesa do
organismo caso haja a contaminação. A medida é mais uma tentativa de frear a
alta de infecções, que voltaram a crescer no país entre diferentes grupos, de
jovens a idosos.
O medicamento não tem qualquer
efeito sobre outras infecções sexualmente transmissíveis, como sífilis,
gonorréia, HPV, hepatite B, além de também não prevenir a gravidez. Por isso,
não substitui a camisinha. "O preservativo continua sendo a principal
estratégia de prevenção", afirma Maria Clara Gianna, coordenadora-adjunta
do Programa Estadual de DST/Aids da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo.
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no SUS
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"Estamos iniciando uma
nova política, e a PrEP é mais uma ferramenta à disposição. Estamos somando a
terapia a um rol de tecnologias, todas voltadas para a prevenção, que terão uso
combinado", explica Aluisio Segurado, chefe do Departamento de Moléstias
Infecciosas da Faculdade de Medicina da USP e membro da Sociedade Brasileira de
Infectologia.
Participam da primeira fase da oferta do medicamento Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza, Recife, Manaus, Brasília, Florianópolis, Salvador e Ribeirão Preto. De acordo com o Ministério da Saúde, o programa será gradativamente expandido para todo o país. Além do SUS, o medicamento deve ser comercializado na rede privada.
De acordo com o último Boletim Epidemiológico do
Ministério da Saúde, 827 mil pessoas têm HIV no país e 40 mil casos são
registrados todos os anos. Os grupos onde as infecções mais crescem são homens
que fazem sexo com homens, de 15 a 24 anos, e idosos acima dos 60.
Para Gianna, ter a PrEP como mais uma política de
prevenção ajudará o governo a reduzir custos lá na frente. "Não tenho
dúvidas que iremos evitar várias infecções. E o custo de proteger alguém por um
tempo é muito menor do que ter pessoas infectadas depois. É muito mais
vantajoso para o SUS," afirma.
Além do Brasil, países como Estados Unidos, Canadá,
França e Reino Unido também adotaram a PrEP. O Brasil, no entanto, é um dos
poucos que oferecerá a terapia no serviço público de saúde.
Ao todo foram investidos US$ 1,9 milhão para o
primeiro ano do programa. Inicialmente, o governo espera atender cerca de 7 mil
pessoas.
Como a terapia funciona
O medicamento que o Brasil irá utilizar é o
Truvada. É necessário acompanhamento médico, já que ele pode causar problemas
renais e perda de massa óssea.
O Truvada é uma combinação em um único comprimido
de duas drogas antigas já usadas no tratamento do HIV - o tenofovir associado à
emtricitabina - e evita a infecção naqueles que ainda não foram contaminados
pelo vírus.
O medicamento não barra a entrada do vírus no
organismo, mas age no seu processo de multiplicação dentro das células de
defesa. É esse uso da máquina humana pelo HIV que, ao longo dos anos, destrói o
sistema imunológico do indivíduo.
Quando tomado ininterruptamente, o medicamento
bloqueia uma enzima chamada transcriptase reversa e, ao fazer isso, quebra o
processo de reprodução do vírus dentro das células.
O medicamento demora, em média, sete dias para
fazer efeito nos homens e 20 dias nas mulheres, segundo o Ministério da Saúde.
Portanto, sexo sem proteção nesse período com uma pessoa infectada pode gerar
contaminação.
O remédio também não pode ser abandonado de uma
hora para outra. A recomendação é que seja tomado ainda por quatro semanas após
a última relação sem preservativo, para evitar a possibilidade de infecção.
Como será feita a distribuição
A partir de dezembro, a terapia estará disponível
em serviços do SUS que já trabalham com prevenção do HIV, como Centros de
Testagem e Aconselhamento (CTA) ou Serviços de Assistência Especializada em HIV
(SAE).
O medicamento poderá ser acessado gratuitamente por
pessoas de grupos considerados vulneráveis. Mas fazer parte de um desses grupos
não é garantia de obtenção.
De acordo com o Ministério da Saúde, aqueles que
sentem a necessidade da terapia irão passar por uma análise com profissionais
da saúde, na qual serão considerados práticas sexuais, compromisso com a adesão
ao medicamento e número de parceiros sexuais, entre outros fatores.
Aqueles que aderirem à PrEP precisarão passar por
acompanhamento médico, com exames regulares de saúde, além de testagens para o
HIV a cada três meses, e orientação frequente sobre comportamento sexual
seguro.
De acordo com o governo, a terapia deverá ampliar o
acesso aos serviços de saúde de uma população que nem sempre é acompanhada por
eles.
"Ao buscar o serviço de saúde para utilização
da PrEP, a pessoa é acolhida pelo serviço de saúde de uma forma mais ampla,
recebendo todas as orientações sobre a importância de se prevenir de todas as
infecções sexualmente transmissíveis, além do HIV", disse o ministério em
nota.
O medicamento também deve ser disponibilizado para
venda privada, com a necessidade de apresentação de receita médica. Cada frasco
com 30 comprimidos - o suficiente para um mês - custará R$ 290.
Até o momento, apenas o Truvada tem cadastro na
Anvisa para ser usado na PrEP. Novas versões genéricas devem chegar no mercado em
breve. "Espera-se que no futuro próximo outros fabricantes de genéricos do
mesmo medicamento possam também comercializar no país", afirmou o
Ministério da Saúde.
Qual deve ser a rotina do paciente
De acordo com a Gilead, a companhia fabricante, o
medicamento pode ser tomado por longos períodos de tempo.
No entanto, é necessário acompanhamento médico
porque o Truvada pode causar problemas renais, além de perda de massa óssea.
Outros efeitos colaterais reportados por estudos com participantes voluntários
foram náusea, dor de cabeça e perda de peso.
Antes de iniciar o uso, é necessário passar por
consulta médica. "É necessário fazer alguns exames, incluindo teste de
HIV, teste para Hepatite B e avaliação da função renal, além de outros que o
médico julgar necessários. Mas os três acima são mandatórios", afirma
Anita Campos, diretora médica da farmacêutica para os países da América do Sul.
Também é necessário testagens regulares do HIV
durante o uso do medicamento. Se houver infecção no período, é preciso interromper
a terapia e entrar com antirretrovirais para evitar que o vírus fique
resistente às drogas para tratamento.
"Se a pessoa tomar e não souber que está
infectada, o vírus pode ficar resistente, porque o tratamento tem uma terceira
droga (além das duas que estão no Truvada)", explica Campos.