O consumo de carnes contaminadas e fora do prazo
de validade pode causar infecções gastrointestinais graves, mas dificilmente
levará ao desenvolvimento de câncer, segundo especialistas ouvidos nesta sexta
(17) pelo Estado.
Mesmo que os alimentos tenham recebido
aditivos e conservantes em níveis acima do permitido e que essas substâncias
favoreçam o aparecimento de tumores, é necessário um período de exposição
prolongado a esses agentes para que eles causem danos significativos ao
organismo. Segundo a investigação da Polícia Federal, algumas carnes estragadas
recebiam ácido ascórbico (vitamina C) para maquiar o aspecto físico
deteriorado.
"Todas as substâncias que são
usadas para conservar o alimento são lesivos paras as nossas células, mas para
que elas causem problemas sérios, como câncer, seriam necessários anos ou até
décadas de consumo desses produtos", explica o infectologista Marcos
Boulos, coordenador de controle de doenças da Secretaria Estadual da Saúde de
São Paulo e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(FMUSP).
Mesmo a relação entre alto consumo de
ácido ascórbico e o aparecimento de tumores não está bem embasada na literatura
científica. "Esses ácidos e vitaminas podem ser prejudiciais se usados em
grande quantidade e por muito tempo, mas não há um vínculo forte na ciência que
comprove que o uso de vitamina C cause câncer", diz o oncologista Fernando
Cotait Maluf, membro do Comitê Gestor de Oncologia do Hospital Israelita Albert
Einstein e chefe do Departamento de Oncologia Clínica do Hospital Beneficência
Portuguesa.
Segundo os especialistas, o principal
risco associado ao consumo dos alimentos deteriorados é o desenvolvimento de
infecções gastrointestinais graves causadas por bactérias resistentes. "A
maioria das infecções gastrointestinais que vemos no dia a dia são consideradas
autolimitadas, ou seja, a pessoa tem um quadro de diarreia, põe as toxinas para
fora e fica boa depois de alguns dias. Já as bactérias geralmente presentes em
carnes putrefatas podem entrar no intestino e levar a quadros mais graves, com
muita diarreia e febre. Há casos em que as bactérias causam lesão no tecido
intestinal e é necessário que o paciente passe por cirurgia", diz Boulos.
Salmonella. Bactéria encontrada em alguns
frigoríficos investigados pela Polícia Federal, a salmonella é um dos
microrganismos que levam a problemas gastrointestinais graves. "Ela é
muito resistente, podendo resistir a temperaturas muito baixas, até mesmo
dentro de um freezer", afirma o médico Jean Gorinchteyn, infectologista do
Instituto Emílio Ribas.
O especialista afirma ainda que
crianças e idosos são os pacientes mais vulneráveis a desenvolver formas graves
de infecções causadas pelo consumo de carne estragada. "A gravidade do
caso vai depender do tipo de bactéria, da quantidade de agentes contaminantes e
do sistema imunológico da pessoa afetada. As crianças ainda têm o sistema de
defesa imaturo, então respondem pior a essas infecções. Os idosos têm
imunodeficiência. Nos dois casos, os quadros de diarreia podem ser mais graves,
levando à desidratação e, em algumas situações, até a morte", diz o
médico. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo e Estadão.