Entre os prováveis efeitos da reforma da Previdência,
estão maior dificuldade de acesso a aposentadorias e benefícios, o que reduzirá
o tempo de aposentadoria, além da redução de benefícios, diz a economista do
Dieese, Fátima Guerra, citando ainda "estímulos explícitos e
implícitos" à previdência privada. Durante seminário promovido pelo
instituto e por centrais sindicais, que continua nesta quarta-feira (8), ela
apresentou detalhes da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287, em nota técnica elaborada pelo Dieese denominada A minimização da Previdência pública.
"A PEC 287 é um passo a mais na corrosão da
confiança no sistema da Previdência pública e, portanto, coloca em risco a
Previdência Social e toda a estrutura de proteção social construída a partir da
Constituição de 1988. A fragilização da Previdência Social se articula com o
enfraquecimento das políticas públicas voltadas para a população e favorece o
aumento da vulnerabilidade social, da pobreza e das desigualdades no país,
contrariando o artigo 3º da Constituição que declara, como parte dos objetivos
fundamentais da República, a construção de uma sociedade justa, a erradicação
da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais", afirma o
Dieese no final da nota.
O instituto lançará no
próximo dia 23 uma "jornada nacional" de debates. O objetivo é levar
a discussão a todos os estados para se contrapor à propaganda do governo e
mostrar as consequências negativas da PEC da reforma da
Previdência. O analista político Antônio Augusto de Queiroz, o Toninho,
diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), alertou
para a necessidade de mobilização. "Se não houver disposição real de
enfrentamento, o risco de esses retrocessos acontecerem é real", afirmou.
A hipótese de o governo retirar a PEC está fora de cogitação, segundo ele –
assim, a alternativa é tentar "retirar os pontos mais perversos".
Fátima
citou como exemplo uma professora que entrou no serviço público de educação
básica em 1998, aos 20 anos, e que poderia se aposentar com 25 anos de magistério.
Como estará perto dos 40 anos em 2017, no caso de a PEC ser aprovada ela não
estaria incluída nas regras de transição e teria de trabalhar até os 65 anos –
ou seja, 20 anos a mais do que a regra atual. Também perderia direito ao
benefício integral.
Pela
PEC 287, a transição vale para homens com mais de 50 anos e mulheres com mais
de 45 anos. Eles teriam de pagar um "pedágio" equivalente à metade do
tempo de contribuição que resta para a aposentadoria. Se faltam cinco anos, por
exemplo, teriam de trabalhar mais dois anos e meio. E com as regras de cálculo
para a aposentadoria já alteradas. Assim, em vez da média de 80% dos maiores
valores de contribuição, esse trabalhador receberia o equivalente a 51% da
média (desde julho de 1994) mais 1% por ano de contribuição. Em um exemplo mais
repetido, teria de trabalhar durante 49 anos seguidos para conseguir a
aposentadoria integral. Em qualquer caso, perde receita.
Também cairiam os
valores dos benefícios, tanto para servidor vinculado ao RPPS (regime próprio)
como para o segurado do RGPS (regime geral). A PEC desvincula benefícios do
salário mínimo. "A regra de cálculo é tão severa, tão nociva, que (o benefício) pode ser
muito menor que o salário mínimo", observa Fátima. Segundo a nota do
Dieese, as pensões concedidas com valor de um mínimo correspondiam, em 2015, a
55% do total e por 36% do montante pago.
Toninho, do Diap,
observa que a oposição conta com apenas 100 representantes no Congresso, o que
tornará difícil, inclusive, a apresentação de emendas à PEC. A base do governo,
"que vai do centro à extrema-direita", conta com mais de 400
parlamentares, sendo 300 o que ele chama de "votos consistentes", ou
seja, de apoio incondicional. Por isso, lembra, a mobilização torna-se
mais importante, além de "massificar" as informações sobre as
"maldades" contidas na reforma. O analista observa que o presidente
da comissão especial da Previdência será o deputado Carlos Marun (PMDB-MS), que
já foi da "tropa de
choque" do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o que por si só mostra sua
resistência a pressões.
"A
troca de governante significou claramente uma mudança de paradigma",
afirma o diretor do Diap. "Essa mudança de governo significou
transferência de renda, apropriação pelo mercado de dinheiro público."
Segundo ele, após 1988 (Constituição), 1993 (revisão constitucional) e os anos
FHC, essa é a "quarta oportunidade" de os setores conservadores
acabarem com os princípios de Estado de bem-estar social contidos na legislação.
Além disso, o Supremo Tribunal Federal (STF) vem cuidando de desregulamentar
condições de trabalho. Os poderes, comenta o analista, estão agindo de forma
sincronizada. <> redebrasilatual //